Com o objectivo de discutir o futuro energético de Moçambique e os desafios climáticos que afectam o País, especialmente a província de Inhambane, a cidade da Maxixe acolheu a primeira edição do Fórum de Geociências e Mudanças Climáticas. O evento reuniu líderes da indústria extractiva, representantes do Governo, académicos, activistas sociais e profissionais do sector, e foi orientado pelo Ministro dos Recursos Minerais e Energia.
Texto: Anastácio Chirrute, Inhambane
Organizado pela Associação Geológica Mineira de Moçambique (AGMM), em parceria com o Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres (INGD), o evento abordou por dois dias o futuro da indústria extractiva em Moçambique, com foco particular na província de Inhambane. O fórum foi estruturado em 10 sessões intensivas, cada uma discutindo aspectos cruciais para o desenvolvimento sustentável e a adaptação climática.
Na primeira sessão, o tema abordado foi “Mudanças Climáticas: Tecnologias para Antecipar Fenómenos e Monitorar Recursos Hídricos na Indústria Extractiva”. Entre os oradores estavam Paulo Tomás, director geral do INGD, Odete Semião, directora geral da Agência de Desenvolvimento Espacial, e César Tique, do Banco Africano de Desenvolvimento.
Representando a presidente do INGD, Paulo Tomás enfatizou que Moçambique tem sido frequentemente afectado por fenómenos naturais como ciclones, enchentes e secas. Ele destacou a importância das empresas da indústria extractiva em contribuir para a prevenção e mitigação desses desastres naturais.
Tomás também defendeu a necessidade de domínio das ferramentas de mapeamento de risco pelas empresas, visando evitar situações que possam comprometer o desenvolvimento do país. “A reflexão que gostaríamos de fazer é a seguinte: até que ponto o sector está ciente da importância de alguns instrumentos que chamamos de mapeamento de risco? É fundamental que essas empresas participem desses estudos. Muitas vezes, temos estudos locais, mas é crucial potencializarmos as pesquisas sobre as tendências das mudanças climáticas e o risco de exposição das comunidades e infra-estruturas a médio e longo prazo”, afirmou ele.
No que diz respeito à antecipação de fenómenos naturais, o INGD ressaltou a importância da modernização dos sistemas de alerta em áreas identificadas como vulneráveis no mapeamento de reassentamento. “Como o sector privado pode colaborar na modernização dos sistemas de aviso prévio para monitorar as mudanças climáticas?”, questionou Tomás. Ele acrescentou que “a indústria extractiva tem um papel crucial na gestão de desastres, e esperamos que este fórum sirva como uma plataforma para o sector privado colaborar neste ciclo e minimizar futuros impactos”.
Desafios e soluções para as mudanças climáticas
O filósofo moçambicano Severino Ngoenha destacou que, apesar dos esforços governamentais para prevenir e mitigar os efeitos das mudanças climáticas, muitos desafios persistem. “Passamos de sétimo país mais vulnerável às mudanças climáticas para o primeiro. Dada a nossa localização no Canal de Moçambique, a intensidade das mudanças climáticas afectará nosso país fortemente nos próximos anos. Precisamos de pensar em resiliência e encontrar soluções”, alertou Ngoenha.
Para reverter este cenário, Ngoenha sugeriu algumas soluções: “Primeiro, é essencial realizar um estudo abrangente e mapeamento ao longo da costa, que é extensa e abriga muitas comunidades. As mudanças climáticas afectam severamente as pessoas que vivem nessas áreas. Em segundo lugar, o próximo presidente, independentemente de seu partido, deve priorizar energias renováveis em vez de combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, reconhecendo seu impacto ecológico. Precisamos de receitas para desenvolver o país, mas não cobramos o suficiente.”
Além disso, Ngoenha destacou a necessidade de renegociar contratos com multinacionais para garantir que as comunidades locais se beneficiem mais dos recursos explorados. “As empresas ganham muito mais do que contribuem, e é crucial que novos contratos sejam negociados de maneira a beneficiar as comunidades”, afirmou.
Auditoria e investimento no capital humano
A jornalista e activista social Fátima Mimbire enfatizou que, além de renegociar contratos, é essencial auditar profundamente as empresas do sector extractivo para identificar possíveis evasões fiscais. “Cometemos um erro grave ao esquecer o capital humano. O desenvolvimento de Moçambique deve considerar não apenas a agricultura e as energias renováveis, mas também as pessoas que trabalham nesses sectores. Somos uma população vulnerável, frequentemente incapaz de trabalhar devido a problemas de saúde, e isso impacta nossos trabalhadores. Ignoramos completamente o capital humano”, argumentou Mimbire.
Ela defendeu que as empresas devem destinar pelo menos 20% de seus orçamentos ao desenvolvimento do capital humano, o que ajudaria a melhorar as condições de vida das comunidades em áreas como educação, saúde e abastecimento de água. “Antes de avançarmos com novas negociações de contratos, precisamos auditar o sector extractivo e garantir que as empresas cumpram suas obrigações fiscais”, afirmou.
Os organizadores do fórum consideraram o evento um sucesso. José Mendes, presidente da Associação Geológica Mineira de Moçambique, destacou que os debates foram produtivos e envolveram diversos atores da indústria extractiva, resultando em um balanço positivo. “Durante os dois dias, discutimos temas fundamentais para o futuro da indústria extractiva, e alcançamos todas as expectativas”, concluiu Mendes.
O Fórum de Geociências e Mudanças Climáticas em Moçambique se mostrou uma plataforma crucial para o diálogo entre governo, sector privado e sociedade civil, promovendo estratégias integradas para enfrentar os desafios climáticos e energéticos do país.
Texto extraído na edição 125 do Jornal Dossier económico