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Da obsessão esquizofrénica pelo poder à manipulação da história de Moçambique: Que perigos?

Por Régio Conrado

A História de um país, mesmo que seja passível de discussões para a sua melhor agnição, a sua melhor compreensão e minudência, reserva, em todos os países, a prerrogativa de sacralizar o essencial que define e faz um país. Ou seja, tal como nos chama a atenção o eminente e erudito historiador francês Patrick Boucheron, na sua aula inaugural intitulada “Ce que peut l’histoire” (o que a história pode!) no Collège de France, em 2015, “nada é mais mortal do que reduzir a História a uma máquina de demonstração de desespero”.

Fazer referência a esta citação do erudito Professor Boucheron ajuda-nos a compreender um fenómeno em curso em Moçambique, encetado pelo candidato derrotado e líder das manifestações violentas: a manipulação e distorção da história da Libertação Nacional, da luta anticolonial e do processo de construção do Estado e da Nação em Moçambique e, sobretudo, a construção de uma narrativa completamente negativa do que foi o processo da conquista da nossa independência e da construção do Estado e do Espaço Nacional.

Este processo de distorção, manipulação e enviesamento da Grande História Nacional visa, por um lado, introduzir novos actores na história de Moçambique, conforme os interesses e dívidas com os seus apoiantes nacionais e estrangeiros e, por outro, colocar-se como um herói imaculado e, portanto, digno de entrar na nossa Praça dos Heróis.

Olhando para os trabalhos de Freud, mormente o livro “L’inquiétante étrangeté”, é possível constatar que indivíduos que sofrem de narcisismo doentio, vontade esquizofrénica pelo poder, ansiedade patológica, distúrbios de personalidade, instabilidade psicológica ou ainda transtorno bipolar, tendem a viver de alucinações, delírios ou em situações de personalidade desagregada. Estas são as características que definem o indivíduo que, neste momento, insiste em distorcer ou fraudar o sentido e alcance do longo e doloroso processo de libertação colonial e de luta anticolonial e anti-movimentos hostis à nossa independência.

Quando o vejo a discursar ou a sugerir a mudança dos símbolos nacionais, dos nomes dos nossos heróis nacionais, ou ainda de ruas e das nossas avenidas, aparece-me imediatamente a imagem de um revisionista e negacionista mal-amanhado, mal-ajambrado e com transtorno dissociativo de identidade, como definia Sigmund Freud. Estes transtornos de identidade ou de personalidade, associados a graves problemas de compreensão do que significa a Pátria, a Nação, o Estado, o sentido da história, criam nesse indivíduo uma perda completa da sua consciência histórica.

Em 1981, Marc Ferro publicou um famoso livro intitulado “Falsificações da História”, onde mostra que todo o processo de falsificação da história por um determinado indivíduo visa, em primeiro lugar, elevá-lo à categoria dos “grandes homens”, anulando tudo o que lhe precede ou manipulando o lugar daqueles que lhe podem justificar o lugar; em segundo, fazer da sua história individual uma epopeia que justifique a legitimidade para estar no poder; em terceiro, eliminar todos os rastos que contestam a sua pretensa grandeza ou elevação por meio da dissimulação dos factos históricos.

Olhando para essa reflexão e para os actos que são encetados inerentes à nossa história, pelo indivíduo que propõe e lidera a manipulação da nossa história e instiga manifestações violentas, fica ostensivo que o alcance de todo esse teatro, essa quimera ou fantasia, é uma consequência da impotência intelectual, no plano da consciência histórica, de muitos que aderem a essas alucinações ou distorções da realidade. Ademais, o filósofo Paul Ricoeur, no seu livro “Histoire et vérité” (História e Verdade), explica que pensar a história significa ter profundo sentido de razoabilidade, de decência epistémica e metodológica sobre a complexidade da história.

É possível constatar que o fundo de todas as encenações que são produzidas pelo indivíduo acima referenciado não são mais do que técnicas que visam manipular a consciência das massas que, vivendo no submundo da incompreensão sobre o sentido e o alcance da nossa história, vão sendo orientadas para o desastre sem terem noção de que o seu aparente timoneiro é apenas um lunático e excêntrico, tal como foram, em algum momento, pessoas como Savimbi em Angola.

Termino, como moçambicano, dizendo que se é verdade que podemos discutir, analisar e investigar, como tem sido feito nas academias, a história de Moçambique, é igualmente verdade que o teor mais profundo da nossa história nacional, da trajectória dos nossos heróis, dos fundadores da nossa Nação e do nosso Estado deve sempre ser assumido como um lugar sagrado, um elemento épico, epopeico, pois isso é o que faz de nós moçambicanos e do nosso país Moçambique.

Combater os falsificadores da história, da memória, dos produtores tresvariados da amnésia nas massas é responsabilidade de todo o patriota consciente das suas responsabilidades. É uma responsabilidade ética de todo o moçambicano cônscio defender a memória e a história de Moçambique. Ser moçambicano não é apenas um direito, é uma conquista, uma responsabilidade moral e ética.

 

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