Por Rui Maquene
A moda já pegou: cidades moçambicanas estão a produzir viciados em álcool. Já não há descanso para os jovens que fazem desta prática um desporto, como se fosse. Bebe-se quase todos os santos dias e, por que razão, não se sabe — mas é visível que, quer nas noites, quer nas tardes, assim como nas manhãs de quase todos os dias da semana, o consumo de bebidas alcoólicas ganhou espaço. Uma luta titânica que não poupa mulher nem homem; todos usam o álcool como se fosse a última viagem.
Se antigamente o jovem assumia este game apenas para os fins-de-semana e só atingia o ponto de pico às sextas-feiras, tudo isso deixou de ser realidade. Hoje, todos os dias são de game: alguns em escala menor — principalmente de segunda a quinta-feira — e outros que nem se importam com o comportamento da semana, desde que a beer esteja disponível.
Temos acompanhado casos de jovens que perdem os seus postos de trabalho e outros que vêem os seus estudos comprometidos por não conseguirem separar actividades socialmente aceites, trocando-as simplesmente pelo consumo de álcool. Se no passado havia um olhar social crítico por parte dos mais velhos, hoje parece que, enquanto jovens, estamos mais imbuídos de uma coragem interminável — apenas para beber. Comparando com os dias de ontem, a sociedade condenava qualquer acto relacionado com esse à-vontade no consumo de álcool. Ou seja, directa ou indirectamente, quem se pusesse na rua com álcool na mão era alvo de chacota e podia ser agraciado com nomes como xidácua, xiphunta, xiconhoca e outros tantos xi daquele tempo.
Ser xidácua não dava prestígio a ninguém — nem mesmo dentro da própria família. Por exemplo, para se ter um ou uma parceira, o critério xidácua entrava na consideração e nenhuma família aceitava receber um genro xidácua. Infelizmente, as coisas, nos tempos de hoje, ganharam outros contornos. O álcool passou a coordenar todo o núcleo familiar: todos querem, no final de cada cerimónia que seja, usar o álcool como desculpa para festejar, ofender ou até mesmo para fechar contas mal resolvidas no seio da família ou da comunidade. Há, nos convívios familiares, coreografias atípicas de danças que insultam os princípios da moralidade e do respeito.
Antigamente, o foco da juventude era a escola e o trabalho. No final de cada ano, esses objectivos serviam para mostrar quão forte ou resiliente o jovem tinha sido na concretização das suas metas. Brincávamos de ostentação: queríamos dizer ao amigo que já tínhamos conseguido aquele terreno, que já estava tudo organizado para oficializar o noivado, ou que no mês seguinte aquela viatura já ia chegar. Assim era, no tempo em que alguns de nós ainda éramos jovens.
Há quem diga que essa vontade escapou aos jovens de hoje por causa do stress da vida. Relatam-se enormes dificuldades no acesso ao emprego, à educação e a outras oportunidades que, de forma saudável, poderiam ocupar a juventude. Outras análises apontam para um objectivo claramente político: uma visão estratégica de alcoolizar mais e mais jovens com a missão de os destruir em termos de capacidade de pensar e agir. Politicamente correcto ou não, uma boa governação exige confronto de ideias, capacidade analítica de distinguir o bem do mal. E, sendo o jovem a força motriz, é visto como adversário deste tipo de abordagem — pelo que, talvez, valha a pena tê-lo todos os dias grosso e incapaz de usar as suas faculdades mentais.
Apontam-se ainda outros factores, como o desgosto pela vida. No seio da família, quando não se consegue responder às necessidades básicas, a reputação e importância do jovem ficam beliscadas e, como recurso, o consumo excessivo de álcool surge para “esquecer a humilhação”.
Não queremos negar essa possível ligação de causa e efeito. Porém, há que reconhecer que o estágio actual do consumo de álcool se tornou um problema de saúde pública. Há muito jovem que sente na pele os efeitos do consumo excessivo — o que pode ser demonstrado pelo número crescente de novos casos de jovens com sinais de demência, sinais de má nutrição, falta de auto-cuidado e outros elementos que, em condições normais, não deveriam ser problema para esta camada social.
Ainda que careça de estudos científicos comprovados, há aqui também um novo fenómeno associado: os suicídios estão a ganhar espaço e, infelizmente, atingem com maior incidência os grupos de jovens.
O Governo precisa de encontrar uma estratégia segura que retire o jovem das garras do álcool. É necessário um debate franco e aberto com os “jovens alcoólatras”, para que se indiquem possíveis caminhos de mitigação deste vício que parece ter vindo para ficar. Ideias inovadoras sobre como ocupar o tempo livre dos jovens são necessárias. Haja, pois, coragem para construirmos este espaço de diálogo e explorar alternativas e soluções.
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Meus manos e manas, ao invés de acordarmos e irmos sentar no senta-baixo, que tal pegarmos numa enxadinha e semente na mão, para usarmos técnicas mais baratas de produção de alimentos? Sabiam que um bidão de 20 litros pode ser transformado num canteiro para produção de batata-reno? É só uma ideia.