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Manifestações: Seis mil reservas turísticas canceladas e 1.500 empregos afectados em Gaza

– Operadores turísticos em Bilene apelam ao apoio governamental para sobreviver a nova crise

As recentes manifestações ocorridas na vila municipal de Bilene, província de Gaza, tiveram consequências devastadoras para o sector turístico local. Segundo dados das autoridades, mais de seis mil reservas turísticas foram canceladas e 1.500 postos de trabalho ficaram em risco, entre empregos efectivos e sazonais. Num cenário que revive o trauma económico da pandemia de COVID-19, operadores turísticos dizem estar agora a “fazer das tripas coração” para manterem-se activos. Muitos apelam a apoios do Governo sob forma de financiamento bonificado, isenções fiscais e campanhas públicas para atrair novamente turistas nacionais e estrangeiros.

Texto: Maidone Capanpa em Gaza

Imagine ter um negócio que factura 700 mil meticais por semana e, de um momento para o outro, cair para 10 mil. Este é o caso de Felismina Ngoenha, proprietária do restaurante Estrela do Mar, na praia de Bilene — uma das casas de referência no circuito gastronómico da zona sul do país.

“Esta prateleira estava completamente abastecida. Em cima havia uma fila de vinhos, em baixo outra de uísques. As geleiras estavam sempre cheias”, conta. Hoje, tudo isso é memória. “É triste”, suspira. “Queremos voltar, queremos voltar”, insiste, com a voz embargada.

Crise começou após eleições de 2024

A situação, explica, agravou-se a partir de Novembro de 2024, após a divulgação dos resultados das eleições gerais, que deram vitória ao candidato da FRELIMO, Daniel Chapo. O seu principal oponente, Venâncio Mondlane, apoiado pelo partido PODEMOS, rejeitou os resultados, o que despoletou uma vaga de manifestações, algumas das quais violentas, acompanhadas por episódios de desobediência civil sem precedentes desde a independência nacional.

O restaurante Estrela do Mar, que desde 2018 vinha a recuperar com sucesso das perdas da pandemia, viu as suas receitas caírem abruptamente. “Nem 20 mil meticais por semana conseguíamos fazer”, lamenta a empresária, que acabou por encerrar o estabelecimento.

Colaboradores despedidos e rendimentos incertos

O encerramento forçado do restaurante levou ao despedimento de oito dos dez trabalhadores que compunham a equipa. “Só restámos eu e um colega. Os outros estão em casa à espera que tudo melhore. Ainda não consegui indemnizar ninguém. Dei apenas algum valor para se orientarem durante dois ou três meses”, admite.

Actualmente, Ngoenha opera uma pequena barraca no mercado central da praia de Bilene, onde vende bebidas e refeições com o apoio de dois antigos colaboradores. “Saí do mercado informal, formalizei-me e criei o restaurante porque via que tinha muitos clientes. Agora regressei ao ninho, um espaço pequeno demais para o volume de trabalho que tenho”, afirma. O rendimento semanal ronda os 10 mil meticais — uma sombra do que já foi.

“Estamos a viver uma miséria. A cozinha é ali, o balcão de atendimento é aqui, tudo muito apertado”, descreve. Apesar disso, não perde a esperança: “Temos de voltar a namorar o turismo… e namorar bem.

“Ngoenha apela ao diálogo político e responsabiliza directamente o clima de instabilidade: “Apelo ao mano Venâncio Mondlane para parar com as manifestações. Nós, mulheres, queremos trabalhar e deixar de depender dos filhos ou dos maridos.”

“Estamos a rastejar”, dizem operadores hoteleiros

Também o sector da hotelaria está a braços com prejuízos pesados. Jerónimo, gestor do Bilene Club Lodge, afirma: “Estamos a rastejar”. Até Outubro do ano passado, segundo conta, as actividades turísticas e de restauração decorriam a um ritmo promissor.

“Bilene tem uma época alta sazonal: Outubro, Novembro, Dezembro e Janeiro. Com receitas nesses meses, costumávamos garantir a operação para todo o ano seguinte. Mas em vez de trabalhar, passámos a gerir custos para não encerrar”.

Cancelamentos em massa e dívidas acumuladas

Devido às manifestações e à insegurança nas estradas, muitos turistas — especialmente sul-africanos, que constituem a principal clientela da zona — optaram por cancelar as suas reservas. “Quando vêem uma reportagem de dois minutos a mostrar distúrbios, pensam que é o país inteiro em guerra”, explica Jerónimo.

Com isso, houve um cancelamento em massa de reservas. Mesmo durante feriados prolongados, os hotéis não conseguem encher. A isso junta-se o problema dos combustíveis. “As pessoas não saem de Maputo sem a certeza de que vão chegar a Bilene sem percalços. O medo afecta tudo.”

Actualmente, a empresa acumula dívidas com o pessoal, com o fisco, com fornecedores e com a empresa de electricidade. “Estamos endividados até ao pescoço. Há despesas que existem com ou sem clientes”, lamenta.

Nos meses de Outubro de 2024 a Fevereiro de 2025, o lodge operou no vermelho. “Depois da COVID-19, aprendemos a não depender apenas de turistas estrangeiros e apostámos no turismo doméstico. Mas agora caímos ainda mais fundo do que na pandemia”, confessa o gestor.

Operadores pedem financiamento e isenção de multas

Jerónimo defende a criação de canais especiais de financiamento para operadores turísticos em zonas afectadas por instabilidade social, como Bilene. “Além disso, o Governo devia aliviar as multas e penalizações fiscais, ou então corremos o risco de ver o turismo afundar-se de vez.”

Governo local admite perdas graves

Segundo dados do Município de Bilene, a crise provocada pelas manifestações resultou no cancelamento de seis mil reservas e na afectação directa de 1.500 postos de trabalho. Antes da crise, o município arrecadava cerca de 30 mil meticais por dia em taxas de actividade económica (TAE). Actualmente, nos melhores dias, mal se atingem cinco mil. Em muitos dias, o valor é nulo.

Apesar dos esforços do Governo local para sensibilizar os operadores e a população a retomar o ritmo anterior, a recuperação está longe de ser alcançada.

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