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RENAMO E MDM ACOMODADOS NA DERROTA: “Não aspiram o poder, são apenas clientelistas”, Amaral

Seis meses depois, sequer se reuniram para fazer balanço das eleições

As eleições gerais de 2024 alteraram profundamente o xadrez político moçambicano, com o Podemos a assaltar o posto de maior partido da oposição, empurrando a Renamo para a terceira posição. Foi a maior derrota eleitoral da história do antigo movimento de guerrilha, mas, ao que tudo indica, parece não ter sido suficiente para tirar a actual liderança do comodismo. É que, transcorridos sete meses depois das eleições, o partido ainda não se dignou a fazer sequer uma reunião de balanço, agravando o clima de insatisfação interna, de que os antigos guerrilheiros têm sido o principal rosto. No MDM, a situação não é muito diferente.

Texto: Amad Canda

Após conduzir o Partido Socialista aos piores resultados desde 1987 – os socialistas foram ultrapassados pelo Chega e são agora a terceira força política em Portugal –, Pedro Nuno Santos não quis esperar que a fatídica noite eleitoral de 18 de Maio do presente ano se dissipasse para anunciar a sua demissão do cargo de secretário-geral. Menos de duas semanas depois, concretamente a 31 de Maio, Rui Rocha, da Iniciativa Liberal, também se afastava da liderança do seu partido, por entender que “não alcançou a preponderância desejada”, apesar de ter eleito mais um deputado nas legislativas antecipadas deste ano, em comparação com as de Março de 2024.

Pese embora sejam de um contexto político diferente, os factos acima mencionados tornam ainda mais surreal a circunstância de Ossufo Momade continuar na liderança da Renamo depois de ter capitaneado aquela formação política na mais humilhante derrota da sua história. De 60 deputados na anterior legislatura (IX), a perdiz passou para 28 – menos da metade, tendo sido largamente ultrapassada pelo Podemos, com 48 parlamentares. Esta derrocada veio somar-se ao insucesso nas autárquicas do ano anterior, cujos resultados oficiais, por sinal bastante contestados, confirmaram a perda de quatro municípios, o que reduz para igual número os Conselhos Municipais sob gestão da Renamo, nomeadamente Quelimane (Zambézia), Vilankulo (Inhambane), Alto Molócuè (Zambézia) e Chiúre (Cabo Delgado).

Um partido “partido” e letárgico

A voar cada vez mais baixo ano após ano, a “perdiz” de Ossufo Momade parece incapaz de “pousar” e repensar estratégias para voltar aos seus tempos áureos. Pelo contrário, mostra sinais de conformismo e apatia, entre eles a continuidade da actual direcção e a não realização dos grandes encontros partidários. Desde o anúncio dos resultados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), a 24 de Outubro, já lá vão seis meses sem que o partido se tenha reunido para reflectir em torno das possíveis razões da catástrofe eleitoral. No início do ano, chegou a ser convocado o Conselho Nacional para os dias 7 e 8 de Março, em Vilankulo, mas o evento acabaria por ser adiado por “razões ponderosas”, segundo deu conta o porta-voz do partido, Marcial Macome.

Aparentemente, as referidas razões, que nunca foram explicadas em detalhes, persistem, à semelhança das invasões e encerramento das sedes e delegações políticas do partido por parte dos ex-guerrilheiros, que prometem não cessar enquanto Ossufo Momade não deixar a presidência. Desaparecido em combate – já nem nas sessões de diálogo político interpartidário dá a cara – Momade, que segundo Marcial Macome tem condições para continuar no leme, responde com um silêncio mais ensurdecedor que noites em discotecas.

MDM segue o mesmo rumo

Descendente da Renamo, o MDM de Lutero Simango parece estar a seguir o mesmo trilho – da apatia e do conformismo. O “galo” até viu subir para oito o seu número de deputados na Assembleia da República, depois de ter cumprido a anterior legislatura com seis. No entanto, a generalidade da análise aponta-o como um dos principais derrotados do escrutínio de 9 de Maio de 2024.

Esta análise é, aliás, corroborada por suspeitas exteriorizadas pelos próprios membros do partido, com destaque para Elias Impuire, de que este número de parlamentares poderá ser fruto de “negociações secretas” entre Lutero Simango e o regime. Recorde-se que os resultados iniciais divulgados pela CNE atribuíam àquele partido apenas quatro assentos, número duplicado em sede do Conselho Constitucional.

Assim como a Renamo, o MDM, cujo presidente é igualmente alvo de contestação, também não reuniu os quadros para analisar o desempenho eleitoral e desenhar estratégias para o futuro – um cenário que contrasta frontalmente com o que se vê ao nível dos partidos que venceram as eleições, nomeadamente a Frelimo e o Podemos, que, por sinal, partilham do mesmo ADN, visto que o segundo foi fundado por dissidentes do primeiro.

A Frelimo, lembre-se, já realizou duas sessões do Comité Central, nas quais não só analisou o processo eleitoral, como elegeu Daniel Chapo como novo presidente do partido e ainda o novo Secretariado do Comité Central, liderado por Chakil Aboobakar. O Podemos, por sua vez, realizou recentemente uma sessão do Conselho Central com o objectivo de eleger o novo secretário-geral, um dossier entretanto ainda não fechado.  

“São máquinas clientelistas”

Olhando para a “sonolência” que vai marcando a Renamo e o MDM depois das últimas eleições, o analista político Duarte Amaral não se surpreende, tudo porque, segundo as suas palavras, estes partidos não passam de “máquinas clientelistas”.

“A preocupação deles é com o mecanismo do seu reinado. Não interessa se estão em segundo, em terceiro ou em quarto lugar, desde que estejam numa posição que lhes permita comer. É por isso que não fazem muita diferença”, explica o analista, que vê as duas formações políticas “numa situação de extrema miséria”, não só do ponto de vista de aceitação política, como também do ponto de vista ideológico.

Prova disso, argumenta Amaral, é que as posições públicas dos partidos em análise são supostamente recebidas com indiferença pela sociedade, ao contrário do discurso da Frelimo, “que é contestado”. Nas palavras do académico, estes partidos, à semelhança dos demais, sofrem de “crise do meta-discurso”, que os poderá conduzir à “morte ideológica”.

Ossufo Momade já devia ter entregado o partido”

Instado a analisar a contestação a Ossufo Momade, que parece escalar a cada dia, Duarte Amaral entende que os ex-guerrilheiros da Renamo estão frustrados por ver o legado de Afonso Dhlakama e André Matsangaíssa a ir por água abaixo “por causa de um indivíduo que não quer aceitar que não é capaz de dar seguimento a esse legado”.

Diante disso, defende que a melhor saída é “entregar o partido voluntariamente”. De acordo com a fonte, agindo desta forma, Momade estaria a afirmar-se como “bom líder”, visto que “liderança é também reconhecer a incapacidade de continuar”, sobretudo numa altura em que se adensam dúvidas sobre o estado de saúde do presidente da Renamo, que, na opinião de Amaral, sequer devia ter disputado as últimas eleições. “Ele devia ter entregado a Renamo desde o Congresso de Alto-Molócuè.

Ele até podia continuar como presidente, mas devia ter aberto espaço para um candidato que tivesse a simpatia do povo, porque ele não tem estrutura para governar. Se não consegue liderar um movimento com dois milhões de membros, como é que vai liderar um Estado como o nosso? A governação envolve técnica de gestão, persuasão – que é uma técnica mais discursiva – e, por fim, a capacidade de tomar decisões face aos problemas. Ossufo Momade não tem essas condições”, conclui.

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