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Mr. President, ministro da Justiça está no “mato”

Temos vindo a acompanhar, como outros cidadãos nacionais, a evolução e o desempenho de cada membro do Governo, assim como das respectivas instituições, com base nas directrizes definidas pelo Presidente da República para o funcionamento do Executivo. É neste direito — primeiro como cidadãos e depois como órgão de comunicação social — que, no exercício de escrutinar o dia-a-dia dos nossos governantes, notamos, de forma repetida, o desvio de rota por parte do ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Mateus Saíze, que mostra claramente estar menos comprometido com a gestão da coisa pública, revelando também não possuir perfil tecnocrático nem estatura política suficientes para exercer o cargo que lhe foi confiado.

Texto: Dossiers & Factos

Na semana finda, respondendo a jornalistas no âmbito da recente publicação do Relatório da Iniciativa de Medição dos Direitos Humanos (HDMI), que classifica Moçambique como um dos países menos respeitadores desses valores universais, Mateus Saíze revelou-se desastroso nas suas declarações, ao falhar no que deveria ser a definição clara do papel do Governo — e, em especial, do seu Ministério — na protecção e promoção dos direitos humanos dos cidadãos.

“O País tem sido assolado ciclicamente por tempestades violentas. Temos sempre ciclones, chuvas que não param, principalmente na época chuvosa e ciclónica. Isso também viola os direitos humanos, e a condição de vida, em termos de condição essencial criada para o desenvolvimento dos direitos humanos, nesses locais em que assistimos ao problema de cheias, seca e ciclones, não é possível falarmos do pleno gozo dos direitos humanos”, afirmou o ministro, gerando espanto generalizado.

Com estas declarações, que revelam provável desconhecimento da matéria dos direitos humanos — apesar de ser formado em Direito, ser também docente universitário e com longos anos de carreira no Conselho Constitucional — o ministro confundiu desastres naturais com violações de direitos humanos, que se traduzem em actos protagonizados por pessoas contra pessoas. Com a resposta dada, abre-se espaço para imaginar que o governante possa, no futuro, sugerir que o INGD passe a ser designado como Instituto Nacional de Gestão de Desastres e de Direitos Humanos — o que seria uma aberração vinda de um membro do Executivo.

Tentativa de fuga com seringa ao rabo

Aparentemente, o ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos tentou atirar areia para os olhos dos moçambicanos, mas a sua resposta infeliz mais parece um tiro no próprio pé, pois suscita sérias dúvidas sobre as suas qualidades enquanto servidor público.

É que até o menos instruído dos cidadãos tem a noção mínima dos direitos humanos, definidos pela Declaração Universal como “direitos e liberdades fundamentais que são devidos a todas as pessoas, em todos os lugares, simplesmente por serem seres humanos”, e classificados como inalienáveis e indivisíveis, baseados nos princípios da dignidade, liberdade, igualdade e justiça.

Na qualidade de signatário da DUDH e demais dispositivos internacionais e regionais, Moçambique, através do Governo, tem a responsabilidade de garantir o cumprimento desses direitos. Aliás, a própria Constituição da República estabelece, na alínea e) do artigo 11.º, que um dos objectivos fundamentais do Estado moçambicano é a “defesa e promoção dos direitos humanos e da igualdade dos cidadãos perante a lei”.

De resto, o Estado moçambicano foi ainda mais longe, ao criar a Comissão Nacional dos Direitos Humanos, que tem como primeira função “promover, proteger e defender os direitos humanos no País, através de programas de educação sobre os direitos humanos, e execução de acções de protecção dos mesmos direitos estabelecidos nos termos da Constituição e na lei”.

Ora, ao emitir a declaração acima mencionada, que praticamente responsabiliza a natureza pela “violação” dos direitos humanos, Mateus Saíze poderá estar a revelar-se desalinhado com os principais objectivos do Governo no sector que dirige — facto que não deixa de inquietar a sociedade.

PR prometeu Governo de tecnocratas e sem despesismo

O mesmo ministro, segundo a imprensa local — e depois confirmado pelo Dossiers & Factos — exigiu ao Cofre Geral dos Registos e Notariado a compra de uma residência no valor de 39 milhões de meticais — vide o jornal Evidências, edição n.º 202, de 01 de Abril. Esta atitude contraria, de forma flagrante, o discurso do Chefe de Estado aquando da sua investidura, em que sublinhou, entre outros pontos, a necessidade de reduzir o despesismo no Estado.

Por outro lado, a resposta dada a jornalistas relativamente à evasão de reclusos da cadeia de Máxima Segurança, em Dezembro do ano passado, também levanta dúvidas quanto à competência tecnocrática deste professor universitário e ex-juiz conselheiro do Conselho Constitucional. Numa tentativa de se eximir de responsabilidade, Saíze afirmou que o Ministério que dirige não responde pela “perseguição aos evasores”.

“O Ministério responde pelas penitenciárias, mas quando um recluso se evade das cadeias, existem outras forças que intervêm para a recuperação dos mesmos. Por isso, a investigação não está com o Governo, está com os órgãos judiciários, e acreditamos que estamos num bom ritmo, porque temos recebido todos os dias aqueles que se evadiram”.

Esta última resposta aumenta as dúvidas quanto à rota que o governante em causa segue — como político e como tecnocrata. São respostas politicamente desacertadas e tecnicamente pobres, que colocam em causa o principal compromisso assumido pelo Chefe de Estado junto dos moçambicanos: “fazer diferente, mas fazendo bem”.

Talvez por tudo isso — e mais — seja legítimo afirmar que o ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Mateus Saíze, anda pelo… ou está mesmo no mato.

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