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EDIL DE NAMPULA: “Encontramos o Município tecnicamente falido”

– Há seis meses que não recebemos o FIA

O presidente do Conselho Municipal da Cidade de Nampula, Luís Giquira, afirma ter herdado, em 2024, um município “tecnicamente falido”, após uma década de governação pela Renamo. Igualmente, o dirigente, que tem um ano e meio de governação, diz ter encontrado cerca de 1.400 funcionários com contractos irregulares e cujos descontos para a Segurança Social não eram canalizados pela edilidade cessante, o que o levou a instaurar uma sindicância para apurar responsabilidades. Olhando para os seus planos de governação, Giquira, que falava em entrevista conjunta ao Dossiers & Factos e Savana, assegura que, até ao final do seu mandato, em 2028, Nampula será uma cidade sem buracos nas estradas e com as finanças gradualmente recuperadas, graças à aposta no cadastro de imóveis, à informatização da máquina administrativa e à disciplina na gestão da coisa pública. Promete ainda maior inclusão da juventude, melhoria da recolha de lixo, combate à insegurança e ordenamento urbano mais rigoroso, incluindo nos bairros com reputação manchada, como o famoso Namicopo. Leia a entrevista na íntegra no formato pergunta e resposta.

Texto: Serôdio Towo

Dossiers & Factos (D&F): Há mais ou menos um ano e meio assumiu um município que, por dois mandatos, esteve sob liderança da oposição. Que município encontrou quando chegou?

Luís Giquira (LG): Quando começámos a nossa administração, encontrámos o município com muitos desafios. A primeira coisa que nós fizemos foi perceber quantos colaboradores tínhamos dentro do Conselho Municipal. E, com isso, fomos descobrir que tínhamos 2.400 e tal funcionários. Infelizmente, deste número de funcionários, 1.100, mais ou menos, estavam de uma forma irregular, porque não tinham os seus contractos visados pelo Tribunal Administrativo (TA), como manda a lei. Mandámos os processos ao TA para regularizar a situação, e recebemos um despacho dando conta de que esses contractos já deviam ter sido cancelados. Nas revistas que andámos a fazer ao nível do Conselho Municipal, percebemos que a anterior edilidade já tinha esse despacho exarado, e infelizmente não o fez cumprir. Isso foi em Dezembro de 2023, e acreditamos nós que não houve cumprimento porque depois chegou a fase de eleições e a seguir entrega de pastas. Infelizmente, em Abril e Maio, tivemos que cancelar contractos de mil e tal funcionários, uma redução para mais ou menos metade do que nós tínhamos encontrado. E, não estando satisfeitos, procurámos, junto das nossas autoridades, saber como é que poderíamos dar compensações a esses funcionários que acabaram perdendo os seus postos de trabalho. Havia um desconto irregular que estava sendo feito aos funcionários, que devia ser canalizado ao INSS, mas, infelizmente, esses descontos não chegaram ao destino. Então, o que nós fizemos, como forma de compensar, foi devolver os valores descontados aos legítimos funcionários. Isso custou-nos quase nove milhões de meticais. E vamos, junto do nosso Departamento Jurídico, abrir uma sindicância interna para ver as responsabilidades em relação a este procedimento de não canalização dos fundos. Agora estamos a tramitar os processos, para ver como é que isto pode ser materializado dentro dos órgãos de Administração Estatal.

D&F: Há espaço para responsabilização criminal no âmbito desta sindicância?

 LG: Dependendo dos resultados, penso que sim, porque normalmente

não se pode fazer descontos aos funcionários e não canalizar o dinheiro ao INSS. É um direito deles e está plasmado na lei. Então, não faz sentido que esse valor não chegue à Segurança Social.

D&F: Só para clarificar, existem casos de processos-crime relativos a isso que a instituição terá já intentado?

LG: Não estamos aí ainda. Criou-se uma sindicância e está-se a trabalhar nesse sentido.

Acreditamos que, dentro de próximos tempos, vamos ter resultados da sindicância.

D&F: Há quem viu essa mecânica do desligamento de funcionários como caça às bruxas, porque são pessoas que foram contratadas numa altura em que o Município era gerido por uma outra organização política.

LG: Eu acho que não foi por aí, porque a lei é clara e serve para todos. O que aconteceu é que todos aqueles funcionários que foram abrangidos, independentemente da cor partidária, tinham o problema de irregularidades no processo de contratação.

Tivemos anuência do TA, pelo que, nesse aspecto, estamos seguros. Nós não estamos a gerir o Conselho Municipal em função da cor partidária. Aliás, os funcionários que ficaram são os mesmos que nós viemos encontrar.

D&F: Quanto custava ao Município o pagamento mensal desses funcionários?

LG: Custava na ordem dos 10 milhões de meticais por mês.

“Encontramos o Município tecnicamente falido”

D&F: E agora, com esta redução, está na ordem de quanto? Adicionalmente, pode dizer-nos como está o Município sob o ponto de vista financeiro e como é que o encontrou há um ano e meio?

LG: Tínhamos uma folha salarial a rondar os 30 milhões, baixamos agora para 20 milhões e pouco. Em termos financeiros, diria que encontramos o Município tecnicamente falido.

Estamos a introduzir agora a questão do pagamento do IPRA por parte dos imóveis registados a nível do Conselho Municipal da Cidade de Nampula. É um imposto que não estava a ser cobrado devidamente e nós agora estamos a fazer o cadastro. Até ao momento, já temos por aí 125 mil imóveis cadastrados e acreditamos que estas iniciativas podem trazer um bolo ainda maior para o Conselho Municipal. Além deste cadastro de imóveis, estamos a informatizar o Conselho Municipal, para ver se todas as nossas receitas são informatizadas. Estamos a fazer declarações de rendimento nas nossas redes sociais, diariamente. Estamos a fazer a nossa prestação de contas e acreditamos que, gradualmente, a nossa receita está a subir.

D&F: Um dos cancros do poder local são as dívidas. Que situação encontrou e como é que a edilidade está hoje?

LG: Tenho que dizer que, em relação a esse aspecto, encontramos algumas dívidas, mas assumimos todas. Estamos a trabalhar nelas, estamos a liquidar. E a grande parte, 70% ou 80% destas dívidas, já foram liquidadas com fornecedores.

D&F: Rondavam quantos milhões, mais ou menos?

LG: 300 e tal milhões. Mas houve uma redução porque fomos verificar que algumas das obras ainda não tinham sido concluídas, mas estavam a ser reportadas como dívidas. Então, aproximámos aos empreiteiros e clarificámos que, apesar de eles terem feito as facturas, as obras ainda estavam em curso, então não poderíamos assumir como dívida. Assim, conseguimos baixar a dívida para a ordem dos 70 ou 80 milhões, por conta de algumas estradas, como a estrada de Marrere, que ainda estava a ser negociada, e a Eduardo Mondlane, que ainda estava a ser construída.

“Nós não temos planeamento físico”

D&F: Pode falar-nos da questão do planeamento físico, atendendo e considerando a densidade populacional e o aumento de residências?

LG: É um desafio, porque nós não temos planeamento físico. Nós, em termos de extensão de área, estamos com mais ou menos 404 quilómetros oficiais, mas estamos mais acima disso, porque também temos espaços e terras em que nós ainda não conseguimos ter presença por causa da extensão da nossa área municipal, que é enorme. Mas estamos a envidar esforços para lá chegar, porque a nossa população está aumentando dia após dia. Com a situação do Cabo Delgado, também temos recebido muitos deslocados que temos que acomodar e dar espaço.Então, temos ainda zonas que não estão infra-estruturadas, mas já estão lá pessoas a habitar. Esse é o nosso grande desafio.

D&F: Qual é o território que não está infra-estruturado, em termos de área?

LG: Estamos a falar de acima de 200 quilómetros.Mas lançamos recentemente um concurso para a aquisição de equipamentos para estradas, e com isso iremos lá chegar gradualmente. Estamos num projecto muito ambicioso, com o PNUD, através do Banco Mundial, para tentarmos chegar o mais rapidamente possível às zonas não infra-estruturadas.

D&F: Um dos grandes problemas dos municípios é a fraca capacidade de colecta de receitas. Quanto é que o município colecta em média diariamente, e quanto era colectado quando cá chegou?

LG: Fazendo comparação com 2023 e 2024, houve redução na ordem de 11%, mesmo resultante destas manifestações. Mas agora estamos a subir. Comparado o primeiro semestre deste ano como o do ano passado, tivemos incremento na ordem dos 32%. Então, acreditamos que gradualmente vamos subir.Isto é o resultado deste cadastro que estamos a fazer em relação ao IPRA e de termos informatizado o Conselho Municipal. Acreditamos que, dentro de um ano ou um ano e meio, poderemos ficar mais robustos nas nossas receitas.

D&F: As receitas conseguem cobrir as despesas?

LG: Neste momento, não a 100%. Ainda temos que esperar um bocadinho a contribuição do Fundo de Compensação Autárquica (FCA) e do Fundo de Investimento Autárquico (FIA), que são transferências que recebemos do Estado. Ainda não estamos no ponto, mas já conseguimos cobrir os salários.

D&F: Qual é a média mensal das receitas?

LG: Neste momento, estamos a rondar entre 30 e 35 milhões.

“Até ao fim do mandato, teremos Nampula totalmente diferente”

D&F: Senhor presidente, estamos a ver a cidade de Nampula totalmente esburacada.

Mas também, assistimos um pouco ao início das obras. Pode falar-nos do que perspectiva para mudar a imagem da cidade? Gostávamos também de saber se a edilidade está a trabalhar com algum empreiteiro que tenha prestado serviços no mandato anterior, e ainda se está a receber fundos do Estado para as estradas

LG: Quando assumimos, nossa aposta foi acabar com os buracos. E sabemos que o custo de quilómetro de estrada é muito elevado. Mas estamos num bom caminho, conseguimos fazer, até agora, mais ou menos oito quilómetros de estrada. E este ano estamos a prever conseguir mais 10 a 12 quilómetros.Estamos sempre a pedir desculpas aos nossos visitantes por terem encontrado a cidade como está. Durante os anos passados, tapava-se buracos e chegava a época chuvosa e levava todo o asfalto. Então, decidimos parar com o tapamento de buracos e resselar, vamos fazer uma estrada nova que pelo menos vai nos dar garantia de, nos próximos 20-25 anos, termos uma estrada consistente. É isso que estamos a fazer e acredito que, até ao fim do nosso mandato, teremos uma Nampula totalmente diferente.

D&F: Quanto dinheiro estão a investir e qual é a proveniência?

LG: O que estamos a investir são fundos próprios. Também temos recebido algum apoio do FIA e do FCA. É através desses fundos que estamos a pagar os empreiteiros. O que conseguimos foi, de uma forma comercial, negociar com os nossos empreiteiros.

Temos um empreiteiro que tinha contrato com o Conselho Municipal para fazer 42 km de estradas. Foi com ele que negociamos e dissemos que não temos dinheiro para pagá-lo de uma vez, mas garantimos que, durante o nosso período de mandato, iremos conseguir liquidar a dívida.

“Há seis meses que não recebemos o FIA”

D&F: Uma pergunta de insistência: outras autarquias queixam-se da não canalização regular dos fundos provenientes do Governo Central. Nampula tem recebido esses fundos com regularidade?

LG: Não estamos a receber, mas o que estamos a fazer é gerir o pouco que temos. Eu posso dizer, com toda a franqueza, que estamos há seis meses sem receber o FIA, mas não é por isso que estamos a parar. O que estamos a perspectivar é que, como município, consigamos ter receita suficiente para cobrir as nossas despesas. Ainda não estamos nesse nível, mas estamos a caminhar. Apesar desse atraso, estamos a conseguir gerir o pouco que temos. Desde que entrámos, todos os vencimentos são pagos no dia 20 de cada mês. Até ontem, não tivemos nenhum atraso em termos salariais.

D&F: Na cidade de Nampula, há muito tráfego, sobretudo de motociclos no âmbito da actividade de moto-táxi. Fica a sensação de não haver disciplina. Pensa em ordenar este negócio?

LG: Infelizmente, isso é um grande desafio. Já antes não estávamos numa situação regular, mas, depois das manifestações, começou a haver uma desordem total. Tentámos, há três meses, reunir com os taxistas para os disciplinar. Houve uma confusão autêntica, mas conseguimos depois acalmar a situação e estamos a negociar com eles. O que queremos é propor aos moto-taxistas que se identifiquem. Temos recebido muitas queixas dos munícipes, que, às vezes, são agredidos durante a noite; pensam que estão a subir para táxis, mas, na verdade, são malfeitores que depois fazem das suas. O que estamos agora a tentar é identificar os taxistas: vamos distribuir coletes, capacetes, e já conseguimos que todos os moto-táxis tenham seguro. Esse seguro também facilita o pagamento de despesas em caso de acidente, tanto para o passageiro como para o motorista. Portanto, todos os novos licenciamentos que estamos a fazer já vêm com esse seguro incluído. Temos ainda o problema de encurtamento de rotas. O que estamos agora a fazer é negociar com algumas empresas, porque queremos colocar chips nas viaturas. Não queremos fazer o controlo no terreno, mas sim de forma remota. Queremos que os chapeiros com autorização para operar estejam todos devidamente identificados e com rotas bem definidas. Quando alguém se atrever a sair da rota, haverá um sinal e serão aplicadas multas. Assim poderemos reduzir significativamente este problema.

D&F: Esses motoristas estão registados? Quantos é que operam actualmente no município?

LG: A maioria dos táxis está registada. O que está a acontecer, e este é um assunto que ainda estamos a discutir com o Governo Provincial, é o seguinte: os nossos empresários, quando importam as motas com cilindrada abaixo do limite da tabela aduaneira, conseguem retirá-las dos portos sem matrícula. Ou seja, todas as motas saem sem matrícula, vão ao armazém e ficam lá armazenadas. Depois, quando são vendidas, é o comprador que vai ao Conselho Municipal fazer o registo da matrícula. Isto não é funcional. Queremos ver, com o Governo Provincial e Central, como poderemos controlar este fenómeno. Com esse modelo, já não conseguimos ter um registo efectivo. Muitos não fazem o registo porque não querem pagar a taxa anual de 2.000 meticais. Então, começam a circular sem matrícula. Acreditamos que isto também tem contribuído para a proliferação de moto-táxis-fantasma, que não estão a desempenhar a actividade como devem, mas sim a extorquir a população.

D&F: Qual é, mais ou menos, o número de taxistas que operam actualmente na cidade?

LG: Neste momento, temos cerca de 3.500 oficialmente cadastrados. Mas acreditamos que há muitos mais a exercer essa actividade de forma informal.

D&F: Uma das bandeiras da sua campanha eleitoral foi trabalhar para a melhoria das condições de vida da juventude, em especial. Que acções já foram levadas a cabo nesse sentido e como é que avalia o progresso?

LG: Quando chegámos ao Município, começámos a actuar nos postos administrativos com diversas formações, em parceria com empresas como a Coca-Cola e a CDM, para empoderar os nossos jovens para o primeiro negócio. Já, através dos nossos parceiros, criámos diversos cursos de primeiro emprego. Realizámos várias feiras económicas para o empoderamento da juventude, incentivando-os a iniciar actividades económicas. Temos um gabinete, a nível do Conselho Municipal, que trata exclusivamente da criação de oportunidades para os jovens se inserirem no mercado de trabalho.

D&F: Há quem diga que a acção municipal não é visível na periferia…

LG: Eu digo que é visível porque, no passado, tínhamos lixeiras por toda a área do nosso município. Hoje, mesmo nos bairros, já não temos lixeiras. Se tivermos, são pequenos focos que estamos a atacar. Só para dar um exemplo, tínhamos no bairro do Matadouro uma lixeira que não era movimentada há mais de 10 anos. E, quando entrámos, decidimos que aquilo também devia ser erradicado. Conseguimos erradicar essa lixeira. Está-se a fazer um trabalho de vulto. E agora, como disse há pouco, lançamos um concurso para aquisição de equipamentos para as estradas. Acreditamos que nos próximos dias, nas próximas semanas, o equipamento esteja disponível. E essas máquinas são exactamente para podermos fazer as estradas ao nível dos nossos bairros suburbanos. Lançou-se um concurso do Governo Central para aquisição de autocarros, e Nampula está a concorrer. Nós estamos apostados a alargar a nossa rede viária exactamente para que esses autocarros cheguem às zonas mais recônditas e façam o transporte dos munícipes em segurança.

“Até ao final do nosso mandato, Nampula não terá buracos”

D&F: Se um munícipe agora o interpelasse e perguntasse em quantos meses promete ter a cidade livre dos buracos, quanto tempo daria?

LG: Eu diria que é um processo contínuo. Mas eu penso que, até Dezembro deste ano, teremos uma grande parte das obras já feitas. Pelo menos nas ruas principais. Estamos a fazer de tudo para que consigamos tapar esses buracos antes da época chuvosa, porque, se chegar a época chuvosa, provavelmente o trabalho que está sendo feito será reduzido a zero. Mas, até ao final do nosso mandato, Nampula não terá buracos.

D&F: As manifestações que decorreram de Outubro a Janeiro criaram algum impacto na cidade?

LG: As consequências foram enormes. Nampula foi um dos epicentros das manifestações. Tivemos várias sedes de postos administrativos destruídas. Temos três postos completamente destruídos. Tivemos vários empresários nossos que foram saqueados os seus bens e viram propriedades vandalizadas. Neste momento, as montras todas estão ainda com as chapas. Tudo aquilo que tem chapas de ferro são montras que estão a esconder o negócio atrás, e isso também é resultado das manifestações. Mas estamos agora junto ao Governo Provincial a tentar garantir aos comerciantes que estamos a tentar controlar a situação das manifestações, que não voltarão, para ver se libertam as montras, mesmo para termos uma cidade ainda mais acolhedora.

D&F: Nas eleições internas do partido, visando a escolha do candidato, o presidente não era candidato de primeira linha, e acabou por ser “repescado” por uma outra razão. Isso não lhe desanimou?

LG: Não, porque no nosso partido todos os militantes têm que estar preparados.Eu já era membro da Assembleia Municipal no mandato anterior e estava dentro da perspectiva de trabalho.

D&F: Como é que está o ambiente entre a bancada do seu partido e as bancadas da oposição, bem como entre estas e a edilidade?

LG: Temos muita colaboração. Temos a sorte de sermos a maioria na bancada e isso também tem facilitado a aprovação dos nossos documentos, mas tentamos que sejam aprovados por consenso. Estamos a fazer as nossas prestações de contas de uma forma clara. Em relação a alguns documentos, temos conseguido consenso entre as três bancadas. Desde que tomamos posse, quase 60% dos nossos documentos são aprovados por consenso.

“Casa protocolar? Quis dar prioridade a serviços sociais”

D&F: Um ano e meio depois de tomar posse, ainda não ocupou a casa oficial. Qual será a razão?

LG: Como dissemos, estamos com exiguidade de fundos. Infelizmente, quando fomos solicitar a casa protocolar, não havia condições. Tínhamos de fazer obras para podermos ter mais ou menos condições para entrarmos. Entre fazer obras na casa protocolar e prestar serviços sociais, preferimos a segunda opção. Gradualmente, as receitas vão crescendo e vamos fazer as pequenas obras que são necessárias. Só posso garantir que não vamos acabar o mandato sem lá chegar.

D&F: O facto de o presidente ser agente económico não cria algumas conotações sobre, por exemplo, eventual tráfico de influências e conflitos de interesses? Como tem gerido o facto de ser empresário e ao mesmo tempo gestor público que, em algum momento, precisa dos serviços que presta como empresário?

LG: Em parte, isso talvez até beneficia o município, porque conseguimos negociar com vários fornecedores de serviços e tivemos anuência para fazer o trabalho mesmo a título de crédito – por exemplo, as estradas. Como Município, não teríamos capacidade de fazer aquelas obras a pronto pagamento de uma só vez. Se não o fizéssemos, provavelmente continuaríamos com o mesmo ciclo de estradas esburacadas. Mas, usando a nossa capa de empresário, de negociadores, conseguimos chegar a acordo com o empreiteiro. Outro exemplo: encontrámos uma dívida junto ao FNB, no valor de 26 milhões de meticais, relacionada com a aquisição dos machimbombos, que estavam paralisados. O Conselho Municipal estava na lista negra do banco, porque não era credível, já que havia uma dívida malparada com mais de 10 anos. Negociamos a redução dos juros e tivemos uma diminuição de quase 50% do capital. A dívida baixou de 26 para 10 milhões de meticais. São estas nuances empresariais que estamos a aplicar e que têm trazido benefícios concretos ao próprio Município.

D&F: E continuam a gerir essas empresas?

LG: Não. Infelizmente, tivemos de deixar de gerir…

D&F: Haverá algum plano concreto para a resolução do problema da erosão na cidade?

LG: Sim. Assinámos agora um acordo com o Banco Mundial, precisamente para lidar com o problema da erosão. Ainda esta semana, os técnicos vão chegar para montar os seus escritórios e começarmos a trabalhar. Porque a erosão é um problema que, só com receitas próprias, o município não conseguiria resolver. Além disso, temos uma empresa municipalizada, com a qual já iniciámos a construção de gabiões em alguns leitos dos rios, dentro da nossa urbe, como forma de conter a erosão.

D&F: Há muitas reclamações quanto ao fornecimento de água na cidade de Nampula. O que está a edilidade a fazer? Qual é o actual estágio da situação?

LG: Todos sabemos que a questão da água é da competência do Governo Central. Mas isso não nos impede de actuar. Ainda na semana passada, enviámos uma missiva ao FIPAG, pois sabemos que a escassez de água começa, normalmente, nos meados de Outubro e Novembro. Predispusemo-nos a comprar um camião de perfuração. Aliás, durante a minha campanha, prometemos que iríamos adquirir este equipamento. O problema da cidade de Nampula, segundo os geólogos, é que está localizada sobre uma montanha. Por isso, as perfurações muitas vezes dão resultado negativo. Desde que assumimos o mandato, fizemos cerca de 25 perfurações. Dessas, apenas nove foram positivas. Por isso, estamos a adquirir um camião próprio, que será colocado à disposição dos munícipes. Teremos uma linha aberta. As pessoas poderão ligar para solicitar o serviço. O camião ficará estacionado no Conselho Municipal e, em função do número de moradores, da zona e de quem está a solicitar, o camião será enviado para fazer a perfuração. Esta é uma solução imediata enquanto aguardamos o projecto estruturante do Governo Central, que visa a captação de água a partir de barragens. Este projecto pode levar entre cinco e dez anos, pois estudos ambientais levam tempo.

D&F: Para quando é que se prevê a entrega deste camião?

LG: Ainda este ano, vamos fazer a entrega…

D&F: Outra situação recorrente aqui na cidade de Nampula é que é comum ordenar-se uma zona aparentemente virgem, mas as pessoas já lá se fixaram. Três ou quatro anos depois, a zona já não tem ruas: ou foram consumidas pela erosão, ou por outro motivo. O que está a falhar no planeamento do ordenamento territorial?

LG: O que está a falhar, a meu ver, é que antes de fazermos o planeamento, as populações já ocupam os espaços. Há uma ocupação desordenada, sem autorização do Conselho Municipal. Muitas vezes, trata-se de zonas não propícias para reassentamento, mas as pessoas constroem lá as suas casas. Depois, quando tentamos intervir, já não conseguimos abrir ruas, porque as palhotas estão todas coladas umas às outras. Temos feito vários apelos. Lançámos recentemente uma campanha de legalização de espaços. Os munícipes pagam apenas 1.500 meticais, mais 200 meticais de tramitação, para obter os seus DUATs. Com esta campanha, conseguimos identificar zonas que deveriam ter uma estrada, ou um espaço reservado para outro fim. Estamos a tentar organizar isso em conjunto com a população. Como encontrámos o problema instalado, em vez de destruirmos as casas, estamos a dar a oportunidade às pessoas de registarem os seus terrenos. Com base nesses pedidos de registo, aconselhamos como aquela zona deveria ser infra-estruturada. Mas também temos o problema do lixo que é também um desafio enorme. Temos ainda o problema da época chuvosa, que tem trazido muitos dissabores às nossas zonas suburbanas. Queremos um município melhor, onde as zonas verdes continuam a florir, porque já não temos praticamente as zonas verdes, estamos a recriar. Nós, quando chegamos ao município, encontramos a cidade cheia de barracas e take aways. O ar que se respirava dentro da urbe era um ar diferente. E nós queremos trazer esta ciência, fazer um município melhor, porque acreditamos que os nossos munícipes merecem viver condignamente.

D&F: Por falar nisso, há quem diga que o presidente eliminou um jardim para construir um complexo comercial.

LG: Não eliminamos o jardim. Nós deixamos a parte do jardim. Isto já foi há anos. E posso orgulhar-me, porque é uma referência a nível da cidade de Nampula. Todos os visitantes vão para lá. E ainda fazemos casamentos, festas, etc.

D&F: Quantas toneladas de lixo o município produz por dia?

LG: Produzimos em média acima de 400 toneladas de lixo e recolhemos quase 70-80%. Nós lançámos recentemente um concurso para aquisição de mais meios. Acreditamos que até ao final do ano teremos os meios cá em Nampula e a partir do próximo ano estaremos a 100%.

D&F: A taxa de lixo está a resolver alguma coisa?

LG: Está muito baixa. Inclusive, a taxa que tinha sido aprovada a nível do Conselho Municipal não é a mesma taxa que a EDM está a cobrar aos munícipes. Já fizemos uma carta à EDM para ver se há um incremento dessa taxa.Já tinha sido aprovada em 2020, mas até hoje ela não está sendo implementada. Então, estamos a negociar com a EDM para ver se conseguimos implementar pelo menos a taxa aprovada em 2020.

“EDM quer rescindir contracto com os municípios”

D&F: Qual é a alegação da EDM para não implementar essa taxa?

LG: Nós soubemos que a EDM fez uma carta à Associação Nacional dos Municípios (ANAM) a dizer que queria rescindir o contrato com os municípios. Então, isto é uma guerra. Estamos ainda a ver como é que poderemos juntos ultrapassar isso. Nós, como Município de Nampula, queremos continuar com este processo. Penso que se nós fôssemos nós a fazer directamente esta colecta da taxa de lixo, provavelmente poderíamos não ser tão eficazes como tem sido a EDM. Então, ainda continuamos a lutar, a discutir com a ANAM, que era bom que nós continuássemos com isto.

D&F: Últimas considerações, sem se esquecer da segurança – o fenómeno das águias.

LG: Infelizmente, há que reconhecer que é um fenómeno que está na nossa cidade. Mas temos conversado bastante com o Governo Provincial para ver como é que poderia nos apoiar para podermos combater este fenómeno. Sabemos que ao nível do Conselho Municipal, a nossa tropa não é armada, só usa chamboco, e isto não é suficiente para afugenta-las. Já tivemos vários planos submetidos à polícia, inclusive, eu pedi-lhes que nos emprestassem armas por algum período para a gente poder reforçar a nossa tropa para estar no terreno em peso. Mas, infelizmente, disseram que isto não era a missão do Município. Então, estamos a trabalhar em conjunto para solucionar este problema de insegurança na nossa cidade.

D&F: Há um bairro chamado Namicopo que é famoso a nível nacional e não pelas melhores razões. Há algum plano específico para este bairro?

LG: Muitas acções estão sendo feitas também viradas ao bairro Namicopo. Há pouco fizemos o lançamento da primeira pedra para a asfaltagem da estrada do Bispo. Também entregámos o centro de saúde que tinha sido destruído nestas vandalizações. Junto com o Governo Provincial, estamos a apoiar na reconstrução da esquadra destruída. Estamos, também com o Governo Provincial, a procurar parceiros para ver se a gente constrói lá um centro cultural. Há muitas acções desenvolvidas em Namicopo e nós queremos explorar a cultura para pôr os jovens a entreterem-se e acabar com esta má fama.

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