A dissolução dos Conselhos de Administração das empresas regionais detidas pelo FIPAG foi motivada por uma série de falhas operacionais e financeiras graves. Em apenas três anos de actividade, estas entidades acumularam dívidas, negligenciaram manutenções e ignoraram directrizes estratégicas, forçando o Governo a avançar com uma profunda reestruturação do subsector. Dossiers & Factos teve acesso a alguns dos fundamentos da decisão de dissolver os Conselhos de Administração das empresas regionais de abastecimento de água, criadas em Março de 2022. A avaliação revela uma gestão deficiente, marcada por pelo menos12 falhas estruturais que comprometem o futuro do sector. Neste artigo, revelamos também o perfil dos membros da Comissão de Gestão Única.
Texto: Dossiers & Factos
Falhas financeiras e dívidas acumuladas
As empresas não procederam ao pagamento das rendas (fees) ao FIPAG, comprometendo o serviço da dívida e pondo em risco a relação do Governo com financiadores e parceiros internacionais. Simultaneamente, acumulam dívidas com fornecedores estratégicos, como a Electricidade de Moçambique (EDM), agravando ainda mais a sua posição financeira.
Gestão ineficiente e custos operacionais descontrolados
Verificou-se um aumento exponencial dos custos operacionais, sem que isso se traduzisse numa melhoria dos serviços prestados. A ausência de medidas de contenção e de optimização da despesa contribuiu para a fragilização das finanças das empresas regionais.
Perdas técnicas e comerciais crescentes
As perdas de água — ou seja, a água produzida mas não facturada — aumentaram de forma preocupante, contrariando as metas definidas no início do projecto. A subfacturação continua a ser prática recorrente, levando a um número crescente de reclamações dos consumidores.
Facturação deficiente e estimativas imprecisas
A facturação por estimativa, em vez de leituras reais, tornou-se regra em muitos casos, afectando a confiança dos clientes e distorcendo os dados financeiros e operacionais das empresas.
Incumprimento das obrigações legais e institucionais
As empresas falharam sistematicamente no pagamento regular da taxa de regulação e da taxa de saneamento, prejudicando a relação institucional com os municípios e com o regulador. Além disso, ignoraram as recomendações emanadas pela Assembleia Geral de 27 de Agosto de 2024, que aprovou o Relatório e Contas do exercício de 2023.
Desrespeito aos planos estratégicos e compromissos bancários
As estratégias de melhoria de desempenho aprovadas em Novembro de 2024, durante a reunião de Nampula, não foram implementadas integralmente. Acresce a não devolução de um depósito a prazo executado pelo BCI, usado como garantia no contexto do pagamento das taxas em dívida — um acto que fragilizou ainda mais a imagem institucional do sector.
Negligência na manutenção e degradação das infra-estruturas
Por fim, registou-se a degradação progressiva das infra-estruturas de abastecimento de água, provocada pela ausência de manutenções operacionais regulares. Esta situação comprometeu a continuidade e a qualidade do serviço público essencial que as empresas deviam assegurar.
Perfis dos membros da nova Comissão de Gestão do FIPAG
Com a dissolução dos Conselhos de Administração das empresas regionais de abastecimento de água, foi criada uma Comissão de Gestão Única, liderada por Elídio Khossa, que coordenará quatro áreas estratégicas. Os membros escolhidos acumulam experiência no sector e em áreas complementares, sendo encarregues de conduzir a transição e preparar a implementação do futuro Instituto Público de Água e Saneamento.
Elídio Khossa – Presidente da Comissão de Gestão
Iniciou a sua carreira como técnico na província de Tete, passando posteriormente para a zona Norte. Mais tarde, ascendeu a director central de operações, e, depois, a director dos Serviços Centrais de Planificação e Desenvolvimento. Desempenhou ainda funções como assessor do Conselho de Administração da ADRMM (Águas da Região Metropolitana de Maputo). Mais recentemente, foi chamado para integrar a equipa de reforma do subsector de águas e saneamento. Após a aprovação da reforma em Conselho de Ministros, foi nomeado presidente da Comissão de Gestão. É apontado como potencial presidente do futuro Instituto Público que passará a gerir os sistemas de abastecimento de água a nível nacional.
Jane Langa – Vogal para Produção, Operações e Manutenção
Quadro sénior do sector, foi o primeiro Administrador Delegado da empresa Águas de Moçambique, nascida do primeiro contrato de gestão delegada dos sistemas de abastecimento de água. Foi depois nomeado director dos Serviços Centrais de Operações do FIPAG, e, posteriormente, director do Projecto Grande Maputo, financiado pelo Banco Mundial. Assumiu brevemente o cargo de PCA da Revimo. É reconhecido pela sua integridade e pela discrição nos círculos institucionais. Na comissão, supervisiona as áreas técnicas, produção, operações e manutenção, bem como a gestão dos activos operacionais e planos de investimento.
Estalino Mahoche – Vogal para Negócio e Desenvolvimento Tecnológico
Quadro sénior do sector, ficará responsável pelas áreas de comercialização, inovação, transformação digital e sistemas de informação. A sua missão inclui a promoção de soluções tecnológicas para uma gestão eficiente da relação com os clientes e para a melhoria da performance operacional das entidades sob tutela do FIPAG.
Dailton Fonseca Clay – Vogal para Administração, Finanças e Logística
Moçambicano por nacionalidade adquirida, formouse na Universidade Eduardo Mondlane. Notabilizou-se inicialmente no sector da comunicação televisiva, tendo depois enveredado pela consultoria financeira. Fundou a Janganda Consultoria Financeira e Serviços, com a qual prestou serviços à ADRMM. Foi posteriormente integrado como quadro do sector e nomeado director central de Planificação. Na comissão, assume as funções de gestor financeiro, com responsabilidade sobre orçamento, tesouraria, contabilidade, logística, compras centralizadas, planificação e reporte financeiro.
Abatu Cardoso – Vogal para Assuntos Jurídicos e Institucionais
Responsável pelos aspectos jurídicos e institucionais da comissão, coordena a gestão dos recursos humanos, a comunicação institucional e a imagem. Cabe-lhe também assegurar a conformidade legal das decisões estratégicas e operacionais no processo de reforma em curso.