O partido Frelimo está a experimentar um momento de fragilização em Maputo e Matola. As revelações chegam de dentro da própria casa, onde alguns membros começam a “botar a boca no trombone”, manifestando desilusão com a dinâmica do partido ao nível dos comités da cidade e da província. Segundo explicaram ao Dossiers & Factos, o partido tem vindo a perder fôlego nas acções de mobilização e motivação dos seus membros, tornando-se pouco visível junto das comunidades.
Texto: Dossiers & Factos
No entender das fontes, a entrada do novo secretário do Comité da cidade da Matola, Simião Mate, bem como do Comité da Província, Carlos Zavala, não trouxe o vigor esperado. E isto numa altura que consideram decisiva, depois dos resultados renhidos e turbulentos das eleições autárquicas de 2023 e das provinciais e gerais de 2024.
As mesmas fontes lembram que a perda de ritmo não começou agora, mas em períodos anteriores ainda havia algum equilíbrio: quando a província vacilava, recebia suporte da cidade e dos distritos, e o mesmo acontecia em sentido inverso. Hoje, essa rede de apoio interno parece ter-se perdido.
Amiguismo e “troca de favores” estragam o partido
As críticas mais duras dirigem-se ao período em que o Comité Provincial era liderado por Avelino Muchine, apontado como responsável pelo aumento de práticas de exclusão e favorecimento. Segundo as fontes, durante as eleições internas em bases e distritos, membros com mérito e capacidade foram preteridos em benefício de outros escolhidos por conveniência e por chamadas “ordens superiores”.
Este vício, acrescentam, alastrou-se ao Comité da Cidade, onde ainda hoje se faz sentir. “Não é segredo para ninguém, é um sentimento partilhado. E, no caso das mulheres, há relatos de situações em que se recorre à troca de favores pessoais e íntimos”, afirmam. Outrossim, nossas fontes lembram que nas últimas eleições internas, a vários níveis, o voto não foi propriamente secreto como ditam as regras, dado que verificou-se o pagamento dos membros para que votassem em determinadas figuras.
As mesmas vozes apelam ao Comité de Verificação Central da Frelimo para que preste atenção a estes e outros factos, sob pena de o partido perder, de forma irreversível, o seu ritmo e a sua força junto das bases.
“Nem Zavala, nem Mate mostram a astúcia necessária”
“O que os membros querem não é a substituição dos primeiros-secretários, seja da cidade, seja da província, que tomaram posse há pouco tempo. O que se exige é que demonstrem qualidades de liderança, mostrem ser políticos de raiz, capazes de se entrosar com o povo dentro e fora do partido, com menos exibicionismo e menos actos impróprios para dirigentes da Frelimo”, dizem as fontes.
E prosseguem: “Não devemos esquecer que, mesmo com uma oposição a usar lamparinas, nós, com holofotes acesos, tivemos enormes dificuldades para vencer as últimas eleições. Essa é uma verdade que precisamos assumir internamente, para dela extrair a força da mudança.”
As críticas estendem-se ainda ao funcionamento dos órgãos locais. “Nos comités e na província o que impera são amizades e interesses pessoais, não o trabalho político. A OJM e a OMM são usadas apenas para encher plateias em recepções de dirigentes, depois são descartadas. O mesmo acontece com as células: houve reestruturação, mas sem efeito, porque os membros estão descontentes.”
Desvalorização dos militantes
Segundo os entrevistados, há uma percepção generalizada de que o partido não valoriza os militantes de base. “Quando surge um projecto para os jovens, escolhem os filhos deles. Os cargos são dados a amigos e familiares. A nós só nos chamam para aplaudir. Estamos a militar há anos e nada muda”, lamentam.
Respondendo a questões do Dossiers & Factos, os três membros ouvidos sob anonimato reconhecem que a maioria dos militantes conhece bem os mecanismos que determinam a escolha dos secretários da cidade e da província. Contudo, sublinham que esta discussão não é hoje a mais importante.
“O essencial”, concluem, “é que os actuais dirigentes compreendam o seu papel, dever e missão, guiando-se pelos objectivos históricos que norteiam a Frelimo. Sem isso, o partido corre o risco de continuar a fragilizar-se, mesmo sem oposição activa.”
Zavala não confirma nem nega
Confrontado com este rol de matérias, Carlos Zavala não confirmou a sua veracidade, mas também não as desmentiu. Limitou-se a afirmar que não considera ser este o momento ideal para tecer quaisquer comentários a respeito, uma vez que a província acaba de sair de momentos conturbados, citando como exemplo as manifestações pós-eleitorais que se prolongaram até aos primeiros meses do ano em curso.
Por sua vez, Simião Mate não atendeu as nossas chamadas.