O Conselho Municipal da cidade da Maxixe, na província de Inhambane, procedeu, há dias, à demolição de um imóvel que havia sido construído na zona da orla marítima e embargado desde 1999, para dar lugar ao projecto de construção da marginal, orçado em cerca de 650 milhões de meticais, alegadamente porque o mesmo foi erguido sem o conhecimento da Direcção Provincial da Indústria, Comércio e Turismo e do Serviço Nacional de Administração e Fiscalização Marítima. Entretanto, algumas semanas depois da demolição da infra-estrutura, o proprietário decidiu recorrer ao Tribunal Administrativo Provincial de Inhambane, que por sua vez declarou nula a decisão do Município, por este não ter antes, e no prazo de 15 dias, notificado o dono do imóvel.
Texto: Anastácio Chirrute
É um barulho que apenas agora começa e promete, nos próximos dias, fazer jorrar muita tinta. O Conselho Municipal da cidade da Maxixe, protagonista do processo, decidiu avançar com a demolição de um imóvel construído de raiz na orla marítima e pertencente a um empresário de nacionalidade indiana, cujas obras estavam embargadas desde 1999, sem antes esperar pelo despacho do Tribunal Administrativo.
Segundo a edilidade, a demolição daquela infra-estrutura visava dar espaço ao projecto de reorganização urbana e construção da marginal na zona costeira, de modo a melhorar a infra-estrutura local, mas também foi motivada pelo facto de a mesma ter sido erguida alegadamente sem o conhecimento da Direcção Provincial da Indústria, Comércio e Turismo e do Serviço Nacional de Administração e Fiscalização Marítima.
Assim, o Município deu o prazo de 120 dias para que, de forma voluntária, o proprietário procedesse à demolição do imóvel. Caso contrário, o Conselho Municipal faria a demolição com os seus próprios meios.
De acordo com o artigo 50, n.º 5, do regime de licenciamento de obras particulares, aprovado pelo Decreto n.º 2/2004, de 31 de Março, “a ordem de demolição ou reposição a que se referem os números anteriores é antecedida de audição do interessado, que dispõe de 15 dias, a contar da data da sua notificação, para se pronunciar sobre o assunto”.
Neste caso, e de acordo com a sentença lida pelo Tribunal Administrativo Provincial de Inhambane, à qual a nossa equipa de reportagem teve acesso, em nenhum momento o Município notificou o visado para, no prazo de 15 dias, se pronunciar sobre o conteúdo.
Com esta conduta, o Município violou frontalmente o disposto no artigo 2, n.º 3, da Constituição, visto que o Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade. Por se tratar de um acto de natureza sancionatória, a lei obriga a que o mesmo seja fundamentado, de acordo com o artigo 121, n.º 2, alínea a), da Lei n.º 14/2011, de 10 de Agosto, que regula a formação da vontade da Administração Pública e estabelece as normas de defesa dos direitos e interesses dos particulares.
Ordem de demolição é de 2005
O recorrente afirma ser verdade que, após o embargo decretado pelo Conselho Municipal em 1999, foi em 2005 notificado para demolir aquela construção, o que não ocorreu. Por isso, em Maio de 2024, o actual executivo municipal, liderado por Issufo Francisco, emitiu nova notificação, concedendo 120 dias para a demolição voluntária do imóvel, tendo, findo este prazo, avançado ele próprio com a demolição.
Entretanto, o recorrente refere que o acto de demolição não foi antecedido da sua audição. Já a edilidade defende o contrário, alegando que, como consta da notificação de Maio de 2024, o mesmo vem ignorando os avisos de demolição desde 2005.
Por outro lado, o Tribunal Administrativo refere ainda que o acto de demolição careceu da fundamentação exigida por lei, tornando-o nulo e sem efeito jurídico. Contudo, o Município argumenta que a fundamentação consta da própria notificação, onde se esclarece que a obra foi erguida sem o conhecimento da Direcção Provincial da Indústria, Comércio e Turismo e do Serviço Nacional de Administração e Fiscalização Marítima, o que consubstancia a sua ilegalidade.
Na “guerra de argumentos”, o recorrente vai mais longe e afirma que, entre as várias instituições que deviam pronunciar-se sobre a matéria, não foi solicitada a intervenção da Administração Marítima de Inhambane, violando o disposto nos artigos 44 e 46, ambos do Decreto n.º 21/2021, de 24 de Maio, que aprova o regulamento sobre o regime jurídico de utilização do espaço marítimo nacional.
No final, o Tribunal Administrativo Provincial de Inhambane decidiu conceder provimento ao recurso contencioso interposto pelo proprietário do imóvel e, consequentemente, declarou nula a decisão tomada pelo Conselho Municipal da Maxixe, por estar eivada de vício de forma e falta de fundamentação, ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 129 da Lei n.º 14/2011, de 10 de Agosto.
O Tribunal Administrativo deu um prazo de 30 dias para o Conselho Municipal recorrer da sentença, a contar da data da notificação. Caso contrário, o Município deverá ressarcir o proprietário pelos danos causados com a demolição do imóvel.