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SHAFEE SIDAT E O SEU SONHO: “Queremos fazer do município um polo industrial”

– Sidat reconhece “duas vergonhas de Marracuene”: O conflito de terra em Milhulamete e a estrada Dom Alexandre.

O presidente do município de Marracuene, Shafee Sidat, traçou ao Dossiers & Factos a ambiciosa meta de transformar a região num pólo industrial de referência nacional. O plano estratégico, já em curso, assenta em três pilares fundamentais: a reabilitação urgente das vias de acesso (incluindo Memo, 4 de Outubro e Phazimane) através de um financiamento de 1 bilião de meticais em negociação com o Ministério das Finanças; o desenvolvimento de zonas industriais em Muntanhana e Zintava para fixar emprego qualificado na região; e a valorização turística da Praia da Macaneta, que está a ser equipada com infra-estruturas de qualidade internacional. “Não estamos a falar de promessas, mas de projectos concretos em fase de implementação”, sublinhou Sidat, destacando que todas estas iniciativas convergem para o mesmo objectivo: resolver de forma estrutural as carências históricas em estradas, escolas, saúde e criação de empregos que têm limitado o desenvolvimento de Marracuene.

Texto: Milton Zunguze

Dossiers & Factos (D&F): Qual é o estado de saúde actual do Município da Vila de Marracuene?

Shafee Sidat (SS): Bem, é um município novo. Continuamos a dizer que a implementação dos municípios novos não é fácil, porque, como município, não tínhamos infra-estruturas, não temos material de trabalho, como mobiliário, computadores e outros. Também não temos ainda a cultura dos munícipes relativamente àquilo que são as responsabilidades enquanto munícipes. É verdade que fomos muito rápidos na aprovação das nossas posturas e outros instrumentos. Logo que fomos eleitos, não demorámos a submeter estes documentos à Assembleia Municipal, que os aprovou, permitindo nos trabalhar. Mas, na verdade, todo este processo é muito burocrático, o que faz com que tenhamos de nos reinventar para não parar, uma vez que as exigências são muitas e as pessoas têm a noção de que já têm município, mas não a noção das dificuldades que implica implantar um município novo.

D&F: Falou aqui das dificuldades em termos daquilo que são as infra-estruturas. O que é que temos, e o que está em falta?

SS: Bem, nós conseguimos duas infra-estruturas, mas o presidente não dispõe ainda de um gabinete próprio. O espaço que utilizamos é partilhado, como este onde estamos a realizar a entrevista. Já os vereadores dispõem de gabinetes para poderem trabalhar. Contudo, há departamentos que necessitam de infra-estruturas próprias para funcionarem de forma mais independente, como o departamento financeiro, a UGEA, as áreas de infra-estrutura para cadastros, entre muitas outras que carecem de reorganização. Porém, não dispomos de infra-estruturas suficientes para todas estas necessidades. Com os poucos espaços disponíveis, optámos por dar prioridade apenas ao essencial para arrancar com o nosso trabalho. Ainda assim, fomos ousados ao decidir que algumas das infra-estruturas existentes fossem destinadas a serviços públicos. Assim, das três infraestruturas que tínhamos, uma será utilizada para abrir a Rádio Marracuene, que servirá directamente à população, e outra para a criação de um centro de formação equipado com computadores. Em breve, abrirão também o Balcão de Atendimento Único (BAU), o serviço de migração, o INATRO e o Tribunal Fiscal. O nosso objectivo é aproximar todos estes serviços da população. Por isso, abdicámos de alguns privilégios a nível municipal para privilegiar, acima de tudo, o benefício da nossa população.

“Temos um grande défice de recursos humanos”  

D&F: Em termos da qualificação dos recursos humanos dos quadros que movimentam o município, o que é que tem a dizer?

SS: Nós iniciámos com 23 funcionários vindos da administração e, posteriormente, submetemos para aprovação a nossa folha de exigências em matéria de pessoal, processo em que ainda dependemos muito do Ministério da Administração Estatal. Neste momento, trabalhamos com funcionários em regime diversificado. Por exemplo, escrevemos ao Banco Mundial, que nos enviou três técnicos, cujos salários são pagos pela própria instituição. Solicitámos também a colaboração de alunos da Universidade, que aqui trabalham em regime de part-time: alguns desenvolvem os seus trabalhos de fim de curso e outros colaboram em diferentes áreas, permitindo nos dar resposta a certos desafios imediatos. Apesar destes esforços, continuamos a enfrentar um grande défice de recursos humanos.

D&F: É um novo município, com pouco mais de um ano e meio de existência. Tendo em conta as metas definidas para o primeiro ano e para o primeiro semestre do ano em curso, que avaliação faz? 

SS: Em termos de organização, faço um balanço positivo. Contudo, no que respeita à concretização daquilo que sonho para os munícipes, considero que o balanço ainda está muito aquém do que pretendemos alcançar. Arrisco dizer que não atingimos sequer 5% das exigências da nossa população.

D&F: E em termos de receitas?

SS: Em termos de receitas, podemos dizer que as principais provêm do tratamento dos DUATs e da emissão de licenças de construção. A maior receita, porém, será o Imposto Predial Autárquico (IPRA), que começará a ser implementado agora, entre outras fontes. Não enfrentamos grandes problemas nestas duas áreas, mas deparamos com a falta de cultura de pagamento de impostos e taxas por parte dos munícipes de Marracuene, na maioria dos bairros. Como ainda não dispomos de uma polícia municipal formada – a que aqui opera é emprestada pelos municípios da Manhiça, da Matola e de Maputo – não temos condições para sermos mais rigorosos na cobrança. Estamos, por isso, ainda numa fase de implementação.

D&F: Há dificuldades, neste caso, em termos de fontes de rendimento do município?

 SS: Face às exigências deste município, que é muito grande, sim. O problema é que muitas pessoas não têm noção da sua verdadeira dimensão nem do número de habitantes que aqui vivem. O município de Marracuene conta já com mais de 200 mil habitantes e possui uma área municipal bastante extensa. Não se resume apenas à vila de Marracuene. Aliás, este nem devia ser considerado apenas um município de vila, mas sim um município mais abrangente, porque a vila é apenas uma parte dessa área. O nosso município começa no Zimpeto e estende-se até Matalane; confina com Maputo, Matola e Moamba, e termina no Oceano Índico. Portanto, podem perceber a extensão e a grandeza deste território. Em termos de dimensão, ele equipara-se a grandes cidades e até a algumas capitais provinciais. Aliás, se olharem com atenção, verão que existem capitais de província menores do que o nosso município.

D&F: O Presidente acaba de afirmar que o município é grande, mas também existe a vontade de estender o espaço da edilidade. Não é paradoxal?

SS: Não, não é a minha vontade. Trata-se de uma exigência que a própria população tem vindo a colocar. No entanto, penso que é necessário realizar primeiro um estudo sobre uma eventual extensão do município. Antes de falarmos em expandir, é preciso organizar devidamente o que já existe e, só depois, avaliar se faz sentido avançar para uma ampliação. Sinto, de facto, essa pressão, até porque mantenho uma ligação muito próxima com a população, incluindo a que ainda não pertence ao município. Percebo a preocupação dessas comunidades em quererem integrar a área municipal e em serem municipalizadas. Contudo, uma coisa é ser municipalizado, outra é cumprir com aquilo que a municipalização exige. Todos queriam que Marracuene se tornasse município, mas agora há muitos que não cumprem as suas obrigações enquanto munícipes.  

D&F: O Presidente citou dificuldades na arrecadação, mas há grandes obras (escola, máquinas, carros sociais). Qual a fonte desses investimentos?

SS: Bem, o que posso dizer é que temos uma gestão muito criteriosa. Não estou a afirmar que somos perfeitos, que não cometemos erros ou que somos os melhores — longe disso. O que digo é que gerimos com rigor, comprando apenas o essencial e o básico, sempre focados nas exigências da nossa população. Para o município de Marracuene, se conseguirmos resolver os problemas das estradas — e já estamos numa fase avançada de discussão com o Ministério das Finanças sobre as vias principais —, se avançarmos na educação e no emprego, daremos um grande passo. Água e energia não são os maiores desafios; é mais uma questão de melhor planeamento e organização nessas áreas. O foco principal de Marracuene está na educação, na saúde e nas infra-estruturas rodoviárias. Estamos concentrados nisso e acreditamos que, se o nosso plano for aprovado pelo Ministério das Finanças, em breve daremos uma resposta significativa a essas necessidades.

D&F: Estamos a falar de quanto tempo? 

SS: Não depende de mim, depende mesmo do Ministério das Finanças. Nós estamos em reuniões muito avançadas e estamos a ter o apoio do Ministério das Finanças, mas se for aprovado, praticamente a maioria das estradas de Marracuene ficarão asfaltadas.

“Nosso objectivo central é industrializar Marracuene”

D&F: Qual é o seu grande objectivo ao nível da economia e como pretende concretizá-lo?  

SS: Uma das nossas prioridades é atrair mais indústrias e comércio para Marracuene, especialmente indústrias, para gerar emprego e privilegiar a contratação de jovens locais. Assim, reduziremos a migração para Maputo e Matola em busca de oportunidades. Já estamos a agir: convidamos diversos investidores, e na zona da circular, vários empreendimentos industriais estão em construção — mas queremos avançar ainda mais. Com esses novos projectos e empregos, resolveremos um dos maiores desafios: o desemprego. Porém, o nosso objectivo central é industrializar Marracuene e transformá-la num verdadeiro pólo de desenvolvimento industrial.

D&F: Existem áreas identificadas para o efeito?

SS: Sim, existem, principalmente as zonas de Muntanhana e Zintava.

D&F: No plano social, quais são as suas prioridades?  

SS: Como já referi, educação, saúde e infra-estruturas rodoviárias são as nossas prioridades. Com estas áreas organizadas, todo o desenvolvimento virá naturalmente. É esta batalha que estamos determinados a vencer. 

D&F: Poderemos ter réplicas da Escola Secundária de Zintava? 

SS: Nós já estamos a fazer a segunda escola no bairro Agostinho Neto. Daqui a três meses, quando terminarmos, venha ver. E quando acabarmos a segunda, vamos para a terceira. Quando acabar a terceira, vamos para a quarta e assim sucessivamente, para ver se acabamos com o problema de turmas ao ar livre e alunos sentados no chão.

D&F: Com a mesma capacidade?  

SS: Com a mesma capacidade e modelo, contudo, com campo multiuso. Não terá diferença nenhuma.

“Não criem expectativas falsas e não manchem o nosso nome”

D&F: Temos observado nas redes sociais relatos de conflitos de terras. Gostaríamos que o presidente nos esclarecesse: em que circunstâncias ocorrem estes conflitos e se já houve algum caso resolvido?

SS: Em Marracuene, enfrentamos duas grandes vergonhas que precisam de solução urgente: O caso Milhulamete – um processo judicial que se arrasta sem fim, saltando entre tribunais sem decisão definitiva. Como município, precisamos de saber com quem trabalhar: se com os detentores do DUAT ou com as comunidades locais. Não podemos ter investimentos em infra-estruturas sem garantias legais. Apelamos por uma resolução célere deste impasse, que é nosso maior problema fundiário. Os demais casos são menores e estão sob monitoramento. A Estrada Dom Alexandre – Um projecto do Banco Africano de Desenvolvimento que começou e parou em três dias, com constantes desculpas e entraves. Já disponibilizamos fiscais, mas sempre surgem novos pretextos. Digo claramente: se vão executar a obra, que o façam com seriedade; se não vão, que não criem falsas expectativas na população nem manchem o nome do nosso município.  

D&F: Que medidas estão a ser tomadas pelo município para resolver estas situações?

SS: O município está empenhadíssimo nisto. Diariamente, trabalhamos com todas as entidades envolvidas – já contactei ministros, já debatemos ao mais alto nível. Queremos uma solução definitiva para a Estrada Dom Alexandre. Não aceitamos promessas vazias – isso é inaceitável e desrespeitoso para com a nossa população.

D&F: E quanto às obras do troço Mali-Santa?

SS: Não se trata de promessa, mas sim de realização concreta. O processo está no tribunal administrativo – assim que obtivermos a aprovação, a obra avança. Já temos os recursos financeiros garantidos. Esta questão está praticamente resolvida; deixou de ser um problema para nós.

D&F: Mas havia promessa de que até meados do presente ano seria entregue essa estrada.  

SS: Sim, mas os trâmites administrativos não dependem da nossa vontade, mas estamos a fazer tudo ao nosso alcance. Inicialmente, propusemos a extensão do contrato com a empresa – afinal, a população aprovou o trabalho feito nos primeiros 500 metros, e nós próprios encaminhámos o pedido ao Tribunal Administrativo. No entanto, as regras exigiram um novo concurso público. Cumpriremos todas as etapas: o concurso já foi lançado, concluído e o relatório enviado. Agora, aguardamos a aprovação final. Se a empresa mantiver o mesmo padrão de qualidade demonstrado no início da obra, acredito que ainda este ano veremos a estrada.

D&F: Presidente, pode actualizar-nos sobre a proposta de reabilitação das vias de acesso em Memo, 4 de Outubro, Phazimane, Massinga, FAU e FACIM? Qual é o estado actual deste processo?

SS: Esta é exactamente a proposta que mencionei anteriormente, actualmente em discussão com o Ministério das Finanças. Trata-se de um financiamento municipal a médio prazo – já concluímos o estudo de viabilidade, que comprova nossa capacidade de pagamento ao longo dos anos. Como o projecto ultrapassa o âmbito do nosso mandato, necessitamos da aprovação ministerial. Uma vez aprovado, resolverá definitivamente a questão das vias em Marracuene. Os empreiteiros envolvidos, inclusive, já manifestaram disposição para aguardar o pagamento escalonado. Estamos confiantes na conclusão positiva deste processo.

D&F: Qual é o orçamento previsto?  

SS: Estradas são coisas caras. Estamos a falar de estradas com passeio e valas. São quase 1 bilhão de meticais.  

D&F: Mudemos de tópico para o turismo. Quais são os interesses municipais na área da praia de Macaneta?

SS: Estamos a transformar a Praia da Macaneta para se tornar na primeira praia de Qualidade A em Moçambique, implementando um plano abrangente que inclui nadadores-salvadores qualificados, equipamentos de patrulha costeira e marítima, zonas delimitadas para pesca e conservação, áreas de alimentação e lazer com sombrinhas, sanitários públicos e um sistema permanente de limpeza. Como área municipal, nosso compromisso é oferecer aos turistas e moçambicanos um padrão internacional de qualidade, fazendo da Macaneta um modelo de excelência balnear para todo o país.

D&F: Existe capacidade para tal?  

SS: Já estamos a fazer: os equipamentos como jetskis para salvamento aquático já estão operacionais, as infra-estruturas de apoio encontram-se em fase final de construção, e outras estão totalmente concluídas. Não se trata de capacidade potencial – temos tudo implementado no terreno. Agora, é apenas questão de oficializar o lançamento e anunciar: Macaneta está pronta para se tornar a praia de referência em Moçambique.

D&F: Quais são as áreas de interesse dos seus parceiros, falo dos internacionais?  

SS: Temos parceiros internacionais interessados em diversos sectores-chave: na área hídrica, com projectos de dessalinização e abastecimento de água usando tecnologias globais; no ambiental, com iniciativas de reciclagem e gestão de resíduos; no comércio, com planos para supermercados e shoppings; no turismo, com investidores de países desenvolvidos a planear grandes hotéis na Praia da Macaneta (como discutido numa reunião recente); e ainda no desporto, com um complexo integrado de hotéis e infra-estruturas desportivas – todos alinhados com nossa visão de desenvolvimento sustentável   Temos parceiros que querem fazer indústria, portanto, diversas áreas industriais, e isso nos interessa. Temos montagem, por exemplo, de motos eléctricas.

D&F: Presidente, o município vai acolher a sexagésima edição da Feira Internacional de Maputo (FACIM). Como é que o Município pretende obter ganhos do evento?  

SS: Para nós, sediar a FACIM é uma honra e já estamos a trabalhar em estreita colaboração com o Ministério responsável para garantir que esta será uma das maiores edições do evento. O município comprometeu-se a melhorar as estradas de acesso e a gestão de resíduos, questões prioritárias identificadas em conjunto. Estamos confiantes de que, com este trabalho articulado, superaremos todos os desafios logísticos para receber a FACIM com excelência.

D&F: O que o município vai oferecer nesta edição?  

SS: Podemos ter serviços básicos para a nossa população e expor o que Marracuene pode oferecer para os visitantes internacionais, para que possam vir juntar-se a nós. 

D&F: Qual o sonho do Presidente para Marracuene daqui a 5 anos?

SS: Meu sonho é ver Marracuene como nós sonhamos, com a bênção de Deus. Quero ver nosso trabalho, do elenco e do Governo de Moçambique – que confia em nós – se concretizar. Reafirmo: somos da confiança deste Governo, que nos tem dado apoio para fazermos bom trabalho. O sonho é justificar a confiança depositada em nós, pelo Governo e pelo nosso partido, cumprindo o que nos propusemos a fazer. É isso que estamos a tentar realizar, para não decepcionar quem acreditou em nós.

D&F: Pensa no segundo mandato? 

SS: Não penso no segundo mandato. Quem conhece minha vida e realidade sabe que não planeio o dia de amanhã. Para mim, o hoje é o que importa. O que virá em três anos só Deus sabe. E quanto ao que Deus reserva, deixarei que Ele me guie no momento exacto, indicando o ‘sim’ ou ‘não’ quando chegar a hora.

“Neste momento, ainda não fiz nada”

D&F: E se houver insistência popular para um segundo mandato, presidente?

SS: Primeiro, eu preciso acreditar. Se me perguntarem agora, direi que não. Quero fazer um bom trabalho e depois me auto-avaliar – ver se mereço ou não este lugar. Neste momento, não me considero merecedor de renovação, porque sinto que ainda não fiz nada. Há muitas reclamações, e muitas são justas. Precisamos ouvir essas críticas e reflectir sobre elas.

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