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Moçambicanos pedem fim da “guerra silenciosa” entre Conde e Dominguês

– “Puto maravilha” é o segundo capitão a sair pela porta pequena na era Conde

A exclusão de Dominguês da recente convocatória dos Mambas desencadeou um clamor popular inédito, ecoando das “bancadas” aos corredores da própria Federação Moçambicana de Futebol (FMF), onde já se levantam vozes a exigir que Chiquinho Conde abra mão da sua rigidez e perdoe o eterno número 7. Por outro lado, este impasse traz à tona, uma vez mais, o perfil alegadamente conflituoso do seleccionador, que já protagonizou choques com jogadores e dirigentes, mas que continua “blindado” pelos bons resultados e pelo peso de uma carreira lendária como futebolista. Prova disso é que, dos capitães que em 2021 o escolheram para ser sucessor de Horácio Gonçalves, só Mexer permanece de pé: os outros – Zainadine Júnior e Dominguês – tombaram em plena era do homem que ajudaram a contratar.

Texto: Seródio Towo e Amad Canda

Chiquinho Conde, o seleccionador nacional de futebol, decidiu deixar de fora Dominguês da convocatória para os desafios contra Uganda e Botswana, referentes às jornadas 7 e 8 do Grupo G da campanha de qualificação para o Mundial de 2026, a ter lugar nos EUA, México e Canadá.

Em conferência de imprensa na última semana, Conde não escondeu as razões que o levaram a excluir o veterano e capitão, actualmente ao serviço da União Desportiva do Songo, tendo afirmado que este não demonstrou vontade de regressar à selecção, depois de ter gazetado ao último compromisso do combinado nacional, devido ao atraso na entrega do passaporte para a obtenção do visto de entrada no Egipto, onde os Mambas defrontaram o Uganda, em Março do presente ano.

“Não me telefonou, não telefonou a nenhum dos meus colaboradores, à estrutura da Federação, não falou com o núcleo dos capitães relativamente à sua ausência e, como tal, existe uma incógnita se quer continuar na selecção ou não. Então, parto do princípio de que esta falta de respeito, como capitão e líder, não contribui para o bem-estar da equipa. É com muita pena minha, não gostaria de ser ligado ao afastamento do Dominguês, mas nós temos um princípio e temos de ser coerentes. Além do jogador que é, temos de ver primeiro o homem, e como tal ninguém está acima da instituição. Não vejo hipótese de ele poder regressar a este núcleo da selecção nacional”, disse Chiquinho Conde, depois de anunciar os 25 eleitos para o duplo compromisso com Uganda e Botswana.

Ora, esta situação está a provocar um verdadeiro alvoroço no “mundo da bola”, com uma avalanche de adeptos dos Mambas, nas redes sociais e não só, a manifestarem-se contra a exclusão do “menino maravilha”, independentemente das razões apresentadas pelo seleccionador. Já nos corredores da Federação Moçambicana de Futebol (FMF), fontes ouvidas pelo Dossiers & Factos sobre esta matéria, e que solicitaram anonimato, entendem que, efectivamente, Dominguês teve uma postura indigna de um líder ao não contactar nem o seleccionador nem a estrutura da FMF para se explicar e, eventualmente, retractar-se até publicamente, visto tratar-se de uma referência nacional e fonte de inspiração para muitos jovens e adolescentes. Para estas fontes, Dominguês tem responsabilidades acrescidas, na qualidade de capitão, e deve esclarecer os moçambicanos sobre o que aconteceu.

Ainda assim, o entendimento reinante entre figuras próximas à estrutura da selecção, asseguram as fontes, é de que, não obstante a indisciplina, Chiquinho Conde tem quase uma obrigação moral de ouvir o clamor popular e trazer de volta o mítico número 7 da selecção nacional. As fontes vão mais longe, recordando que o próprio Chiquinho Conde só renovou com a FMF, em 2024, graças à forte pressão popular, dado que o presidente da Federação, Feizal Sidat, estava inclinado a dispensar o técnico, não propriamente por causa do seu desempenho – Conde devolveu os Mambas ao CAN – mas por não se sentir respeitado por este. Curiosamente, é justamente a mesma queixa que o treinador faz agora em relação a Dominguês.

Por fim, sublinham que uma figura histórica como Dominguês, apontado por muitos como o melhor jogador moçambicano da sua geração, não merece sair da selecção pela porta pequena. Vale lembrar que, além de vários momentos de magia, Elias Pelembe (nome de registo) é o segundo maior artilheiro da história dos Mambas, com 17 golos, ficando apenas atrás de Tico-Tico, que soma 27. Ou seja, o craque da USD está à frente de Dário Monteiro (16), Chiquinho Conde (12) e de Gil Guiamba (11).

Dos capitães que “contrataram Chiquinho” só resta um

A história de Chiquinho Conde com o núcleo duro da selecção nacional carrega requintes de ironia. É que, conforme noticiou Dossiers & Factos na altura, e ao contrário do que é norma no futebol mundial, Conde foi escolhido pelos jogadores, e não pela Federação, para substituir Horácio Gonçalves, em Outubro de 2021.

Foi numa reunião via Zoom com o presidente da FMF e o então secretário de Estado do Desporto, Carlos Gilberto Mendes, que os capitães do combinado nacional – Dominguês, Zainadine Júnior e Mexer, curiosamente todos com ADN do Desportivo de Maputo – apontaram Conde para assumir a selecção, depois de lhes ter sido apresentada uma shortlist que também incluía Artur Semedo, Akil Marcelino e Dário Monteiro.

Para muitos, esta circunstância prenunciava uma relação perfeita entre Conde e o balneário, por via dos capitães que o escolheram. Contudo, assistiu-se ao oposto: a relação com os capitães foi-se deteriorando com o tempo. Primeiro, foi com o vice-capitão, Zainadine Júnior, em 2023, com quem Chiquinho Conde terá tido uma acesa discussão no intervalo de um jogo contra o Senegal, em Dakar. Posteriormente, Zainadine desdramatizou a situação, mas o certo é que, depois desse episódio, seu nome foi riscado das convocatórias dos Mambas.

Por sua vez, e quando convidado a explicar a exclusão do então capitão do Marítimo de Portugal, Chiquinho Conde deixou tudo em pratos limpos. “É para não se esquecerem que eu sou o treinador e quem dita as decisões relacionadas com a parte técnica e táctica sou eu. Há um velho ditado alentejano que diz assim: amarra-se o burro à vontade do dono. Isto para dizer que, enquanto estiver na selecção, as regras serão estabelecidas por mim. O jogador tem espaço para opinar dentro das balizas, mas com limites. Eu decido em conformidade, o individual nunca pode sobreporse ao colectivo”, rematou.

Volvidos pouco mais de dois anos, e mesmo sem qualquer confrontação verbal, Conde vê sua relação com Dominguês deteriorar-se, resultando no afastamento do líder do balneário, o que significa que da tríade que escolheu o técnico para comandar os destinos da equipa nacional, já só resta Mexer, central que actua no campeonato turco da segunda divisão.

Desentendimento com a estrutura directiva

A lista de animosidades envolvendo Chiquinho Conde na selecção não se limita ao plantel, abrangendo também a estrutura directiva da FMF. Aliás, esta foi, alegadamente, uma das razões que levaram Feizal Sidat a renovar com o treinador apenas por conta da irresistível pressão popular e da imprensa.

Basta recordar que, numa conferência de imprensa em Julho de 2024, Sidat acusou o actual timoneiro de violar o contrato de trabalho ao fazer acusações públicas contra a presidência da FMF, bem como de ingratidão. Disse ainda que o técnico o desrespeitou perante os jogadores, quando, em tom exaltado, exigiu gelo após um jogo de qualificação para o CHAN.

Na mesma conferência de imprensa, Sidat expôs também a suposta má relação entre Chiquinho Conde e Martinho Mukana (Paíto), vice-presidente da FMF. Segundo o dirigente, Conde chegou a proibir o antigo lateral-esquerdo dos Mambas, que também jogou no Sporting, de entrar no autocarro e no balneário da selecção, classificando o episódio como uma humilhação.

Certo é que, depois da renovação contratual, a relação com a Direcção da FMF parece ter regressado aos carris, algo fundamental para o alcance dos objectivos da selecção. Agora, o “mundo da bola” pede que Chiquinho Conde e Dominguês fumem o cachimbo da paz.

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