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“COM ACÓRDÃO SEM SENTIDO”: Lúcia Ribeiro legitima status de partido-Estado à Frelimo

O Conselho Constitucional (CC) rejeitou o pedido de declaração de incompatibilidade entre as funções de Presidente da República e de presidente de partido, num acórdão que, segundo o analista político Duarte Amaral, consagra a definitiva captura do Estado pela Frelimo. A declaração de incompatibilidade foi requerida por um grupo de 14 cidadãos, com base no artigo 148 da Constituição da República.

Texto: Amad Canda

O Conselho Constitucional (CC), através do Acórdão n.º 6/CC/2025, de 19 de Setembro, rejeitou a petição apresentada por 14 cidadãos que pediam a declaração de incompatibilidade entre as funções de Presidente da República e de presidente de partido político. Os peticionários sustentavam que esta acumulação de cargos viola o artigo 148 da Constituição da República de Moçambique (CRM), o qual determina que o Presidente da República não pode exercer quaisquer outras funções públicas ou privadas durante o seu mandato.

Na sua fundamentação, o CC abordou três aspectos principais: a natureza jurídica dos partidos políticos, as funções constitucionais do Presidente da República e a necessidade de harmonizar a leitura do artigo 148 com o sistema político vigente. Primeiro, o órgão rejeitou a tese de que os partidos políticos sejam meramente entidades de direito privado. Defendeu que possuem natureza sui generis, reunindo elementos de direito público e privado, e desempenham funções essenciais para a democracia. Entre estas funções destacam-se a formação da vontade política, a participação no processo eleitoral e a própria estruturação do poder político. Deste modo, lê-se no acórdão, a presidência de um partido não poderia ser equiparada a uma função privada, proibida pelo artigo 148.

Segundo, o CC recordou que o Presidente da República acumula três funções constitucionais: Chefe de Estado e garante da Constituição, Comandante-Chefe das Forças de Defesa e Segurança e Chefe do Governo. Reconheceu que, nas funções de Chefe de Estado e de Comandante Chefe, existe a exigência de imparcialidade e apartidarismo. Porém, considerou que, como Chefe do Governo, a ligação a um partido político é indispensável para aprovar políticas públicas no Parlamento e garantir a implementação de programas eleitorais.

Por fim, o Conselho entendeu que a interpretação do artigo 148 deve ser harmonizada com a Constituição como um todo. Recordou que Moçambique adoptou um sistema presidencialista com forte concentração de poderes na figura do Presidente, e que este modelo exige suporte partidário para assegurar a governação. Concluiu, assim, que uma leitura demasiado restritiva do artigo 148 poderia inviabilizar o funcionamento do sistema político.

“Estamos diante da captura do Estado”

Com base nos argumentos acima arrolados, o CC negou o pedido de incompatibilidade. Declarou que a presidência de um partido não constitui função privada e que, no quadro constitucional moçambicano, é compatível com o cargo de Chefe de Governo. Sublinhou, no entanto, que devem ser salvaguardados os princípios de imparcialidade nas funções de Estado e de neutralidade das forças armadas.

Em entrevista ao Dossiers & Factos, o analista político Duarte Amaral considerou o acórdão “a consagração jurídica de uma captura do Estado já há muito consumada”. Para o especialista, a decisão representa a rendição final das instituições à lógica do partido único, agora disfarçada de democracia multipartidária.

Para Amaral, que é docente na Faculdade de Filosofia da Universidade Eduardo Mondlane, não estamos perante uma mera acumulação de cargos, mas sim perante uma fusão orgânica entre partido e Estado. “Quando o Presidente vai a uma província em visita oficial e, no mesmo contexto, orienta reuniões da Frelimo, está a usar recursos do Estado para fins partidários”, aponta o autor do livro Eleições: para a Paz ou para a Guerra?, para quem não há, em Moçambique, fronteiras entre o interesse público e o projecto partidário.

Conflito de interesses e captura institucional

O analista político vai mais longe e questiona a idoneidade do próprio Conselho Constitucional enquanto órgão de soberania, lembrando que a presidente da instituição, que por sinal é nomeada pelo Presidente da República, é membro do partido Frelimo. Faz ainda referência ao caso de Mateus Saíze como exemplo eloquente de uma instituição capturada.

“O actual ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, foi membro do Conselho Constitucional e hoje participa em reuniões da Frelimo.

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