EnglishPortuguese

ALERTA DO BANCO CENTRAL: Moeda electrónica é o maior risco de branqueamento em Moçambique

O Banco de Moçambique concluiu que o sistema financeiro nacional continua fortemente exposto a riscos de branqueamento de capitais, apesar da aprovação, entre 2022 e 2024, de um pacote legislativo considerado robusto e alinhado às recomendações internacionais do Grupo de Acção Financeira (GAFI). O sector da moeda electrónica surge como o mais vulnerável, classificado com risco “alto”. A conclusão consta do Relatório de Avaliação Sectorial de Riscos de Branqueamento de Capitais – 2025, o primeiro exercício do género conduzido pelo banco central em coordenação com o Gabinete de Informação Financeira de Moçambique (GIFiM).

Texto: Dossier económico

A análise abrangeu quatro grupos de instituições: crédito (bancos, microbancos e cooperativas) moeda electrónica, casas de câmbio e operadores de microcrédito. Foram avaliados factores como a natureza dos produtos e serviços, o perfil dos clientes, os canais de distribuição, a localização geográfica e, sobretudo a eficácia dos mecanismos de controlo interno. O resultado foi claro: a moeda electrónica representa actualmente o maior risco, enquanto as instituições de crédito foram classificadas com risco “médio-alto” e as casas de câmbio e operadores de microcrédito com risco “médio”.

O subsector da moeda electrónica, composto por apenas três entidades — Vodafone M-Pesa, M-Mola e Carteira Móvel —, cresce rapidamente e tem forte penetração em zonas rurais. No entanto, a dependência dos agentes no contacto directo com os clientes fragiliza os mecanismos de prevenção. O Banco de Moçambique nota que muitos desses agentes carecem de formação adequada e de integridade suficiente para identificar transacções suspeitas, aumentando a exposição a esquemas ilícitos.

No caso das instituições de crédito, que representam a espinha dorsal do sistema financeiro com activos avaliados em 918,4 mil milhões de meticais, depósitos de 624,7 mil milhões e crédito de 281,3 mil milhões, a ameaça de branqueamento é considerada “alta”. A robustez relativa dos controlos internos permitiu, contudo, que o risco final fosse classificado como “médio-alto”. Entre os principais pontos críticos destacamse a escassez de recursos humanos dedicados ao compliance, conflitos de interesse em funções de reporte de operações suspeitas e a falta de formação prática dos oficiais de comunicação de operações suspeitas (OCOS).

As casas de câmbio e os operadores de microcrédito, embora de menor dimensão, também não estão livres de riscos. As primeiras apresentam risco médio devido ao volume reduzido de operações, mas a utilização intensiva de numerário levanta preocupações adicionais. Já os operadores de microcrédito, que ultrapassavam 2.200 até Dezembro de 2023, enfrentam falhas de regulação e ausência de limites claros na concessão de crédito, factores que pesaram na avaliação.

Reformas legais e entraves persistentes

O relatório dedica atenção especial às reformas legais recentes. A aprovação da Lei n.º 14/2023, sobre prevenção e combate ao branqueamento de capitais, financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa, é considerada um avanço decisivo, complementado por decretos e circulares do Banco de Moçambique. Este quadro normativo responde às recomendações do GAFI e reforça a supervisão baseada no risco.

Todavia, a aplicação prática ainda enfrenta limitações. O Banco de Moçambique dispõe apenas de oito técnicos para supervisionar centenas de instituições, e o número de inspecções anuais é reduzido. Além disso, persiste uma discrepância entre as sanções administrativas e penais. Foram já aplicadas multas superiores a 124 milhões de meticais a diversas instituições, levando à adopção de melhores práticas internas. Porém, continuam a ser praticamente inexistentes as condenações penais por branqueamento de capitais ou financiamento do terrorismo, apesar de a lei prever penas até 12 e 24 anos de prisão, respectivamente.

Outro entrave estrutural prende-se com a dificuldade de acesso à informação sobre beneficiários efectivos, a ausência de uma base de dados fiável sobre pessoas politicamente expostas e a fragilidade do sistema de identificação civil, que não permite verificar automaticamente a autenticidade dos documentos. Estas lacunas limitam a capacidade das instituições financeiras de aplicar medidas eficazes de diligência junto de clientes de risco elevado.

Prioridades para o futuro

Apesar dos avanços legislativos, o Banco de Moçambique conclui que persistem lacunas significativas. Entre as prioridades destacam-se o reforço das inspecções anuais, o aumento de recursos humanos afectos à supervisão, a melhoria do compliance, o fortalecimento da monitoria e reporte de operações suspeitas e a capacitação de colaboradores.

Num contexto em que Moçambique procura consolidar a saída da lista cinzenta do GAFI, o relatório sublinha a urgência de transformar reformas em práticas concretas e eficazes, capazes de reduzir a exposição do sistema financeiro às redes de branqueamento e de financiamento ilícito

Gostou? Partihe!

Facebook
Twitter
Linkdin
Pinterest
Search

Sobre nós

O Jornal Dossiers & Factos é um semanário que aborda, com rigor e responsabilidade, temáticas ligadas à Política, Economia, Sociedade, Desporto, Cultura, entre outras. Com 10 anos de existência, Dossiers & Factos conquistou o seu lugar no topo das melhores publicações do país, o que é atestado pela sua crescente legião de leitores.

Notícias Recentes

Edital

Siga-nos

Fale Connosco