Um grupo de mais de 300 trabalhadores da antiga empresa de construção Soares da Costa Moçambique, localizada na Matola, denuncia que vive há mais de dois anos sem receber salários nem indemnizações devidas. A situação arrasta-se sem solução, apesar das várias denúncias apresentadas às autoridades competentes. Os trabalhadores apontam ainda para alegadas interferências políticas que estariam a travar a resolução do problema.
Texto: Clara Mulima
Segundo contou ao Dossier Económico Ilídio Nguenha, um dos representantes do grupo, a situação tornou-se insustentável devido à ausência de respostas. “Fomos à empresa, ao sindicato, ao Ministério do Trabalho e até ao Sindicato Nacional de Madeira, Mina e Construção Civil. Em todas estas instituições não obtivemos respostas credíveis. O sindicato chegou a afirmar que não tem nada a ver com os trabalhadores, o que nos leva a questionar para que serve, afinal, se todos os meses somos descontados das nossas quotas”, afirmou, acrescentando que a empresa, em vez de honrar os compromissos com os seus trabalhadores, tem vindo a alienar bens, como máquinas e outros equipamentos, para financiar obras particulares ligadas ao patronato.
Os trabalhadores relatam que, mesmo sem rendimentos, continuam a comparecer diariamente ao estaleiro da Matola, como forma de pressionar e manter visível a sua reivindicação, apesar do cenário de abandono e da legalidade das suas demandas.
“A empresa chegou a ter mais de mil trabalhadores a nível nacional, todos sindicalizados e com descontos regulares nos salários. Mas hoje estamos completamente esquecidos. Já ganhámos o caso em tribunal, mas até agora nada avança. Não sabemos o que está por detrás desta demora e tememos que haja interferência política, porque os advogados da empresa e o patronato fazem parte de círculos ligados à política. Não é normal uma empresa dizer aos trabalhadores que podem queixar-se onde quiserem, porque o problema nunca será resolvido”, afirmou Guambe.
Os trabalhadores lembram que a Lei do Trabalho, no artigo 62, determina que, em caso de conflito laboral, os sindicatos devem apoiar os trabalhadores. Contudo, segundo eles, essa função nunca se materializou. A sensação predominante é de abandono por parte de todas as entidades que deveriam zelar pelos seus direitos.
“Não podemos substituir a entidade empregadora” – CONSILMO
Por sua vez, a Confederação Nacional dos Sindicatos Independentes e Livres de Moçambique (Consilmo) confirma ter conhecimento do caso. Em declarações, representantes daquela organização sindical explicaram que o proprietário da empresa abandonou o País após a falência, deixando os trabalhadores sem salários e indemnizações.
“Na altura, o dono da empresa justificava-se dizendo que o Estado não estava a pagar as obras públicas adjudicadas e, por isso, não havia fundos. Como sindicato, quando os trabalhadores nos apresentaram o caso, orientámo-los para o Ministério do Trabalho, Género e Acção Social, que é a entidade competente para intervir legalmente. Representamos os trabalhadores, mas não podemos substituir a entidade empregadora. A resposta final está nas mãos do Ministério do Trabalho”, afirmou a Consilmo, sublinhando que a situação se encontra há muito tempo encaminhada para aquela instituição.
A história da Soares da Costa Moçambique é marcada por contrastes. Durante anos, a empresa, parte do grupo português Soares da Costa, foi uma das mais relevantes no sector da construção civil em Moçambique, responsável por importantes projectos de estradas, hospitais e outras infraestruturas. Chegou a empregar mais de mil trabalhadores em todo o País, movimentando um volume significativo de obras públicas.
Porém, devido a dificuldades financeiras e ao alegado incumprimento de pagamentos por parte do Estado, a empresa entrou em processo de falência e liquidação. Como sucessora surgiu a SDCAA – Sociedade de Construções da África Austral, mas esta não assumiu os compromissos salariais e laborais deixados pela antecessora, deixando centenas de trabalhadores desamparados.