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CTA exige “clareza fiscal” e FMI reitera urgência de contenção da despesa

A capital moçambicana foi palco, recentemente, de um encontro estratégico que juntou representantes da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP). No centro das discussões estiveram as recomendações do FMI para a economia moçambicana, os constrangimentos de acesso a divisas e o reforço da cooperação económica entre Moçambique e Portugal. Com a presença de Olamide Harrison, representante residente do FMI, de Eduardo Macuácua, director executivo-adjunto da CTA, de Noor Momade, presidente do Conselho Empresarial Nacional, e de Mário Ferreira, novo delegado da AICEP, o encontro serviu também para preparar a 20.ª edição da Conferência Anual do Sector Privado (CASP), agendada para 12 e 13 de Novembro, sob o lema “Reformar para competir e o relançamento económico de Moçambique”.

Texto: Milton Zunguze

Na ocasião, Olamide Harrison partilhou a leitura do FMI sobre os principais desequilíbrios da economia moçambicana: a dívida pública em expansão, o défice fiscal persistente e as fragilidades na balança de pagamentos. Segundo os dados analisados, Moçambique arrecada receitas correspondentes a cerca de 27% do PIB, nível considerado razoável face a padrões regionais. No entanto, a despesa pública ronda os 34% do PIB, criando um hiato preocupante.

“O que o FMI nos transmitiu é que, a curto e médio prazo, reduzir impostos não é viável porque o Estado tem obrigações fixas, incluindo o serviço da dívida. A recomendação é olhar com maior detalhe para a despesa, identificar gastos que possam ser eliminados ou reestruturados e, dessa forma, aliviar o défice”, explicou Eduardo Macuácua, da CTA.

A posição do FMI não inviabiliza o debate sobre a carga fiscal. Para a CTA, uma reforma tributária é urgente, mas deve ser calibrada para expandir a base de contribuintes e formalizar parte da economia informal, que representa mais de 60% da actividade económica mas contribui muito pouco para o erário público.

Empresários pedem clareza e justiça fiscal

A CTA reforçou que a política tributária actual carece de clareza. Para além dos impostos nacionais, várias taxas locais impostas por governos provinciais e municipais têm gerado sobrecarga.

“Se eu produzo, por exemplo, um milhão de meticais, vou pagar no máximo 40% ao Estado, e que o Estado, com esses 40% que recebe, seja capaz de distribuir por várias necessidades, sem termos múltiplas cobranças que depois não ficam claras”, apontou Macuácua.

Outra proposta passa por rever isenções fiscais prolongadas atribuídas a grandes investidores estrangeiros, garantindo maior equidade no esforço contributivo.

Crise de divisas sufoca empresas e expõe fragilidade externa

Um dos temas mais sensíveis debatidos foi a escassez de divisas. Empresas nacionais reportam crescentes dificuldades em importar matérias-primas, equipamentos e até em processar transferências internacionais. Para Noor Momade, presidente do Conselho Empresarial Nacional da CTA, a situação já é “catastrófica”.

“Na qualidade de presidente, tenho sido contactado por muitas empresas a queixarem-se de que não conseguem fazer importações nem pagamentos e transferências. Portanto, é um problema que nos aflige”, sublinhou.

O Banco de Moçambique tem atribuído parte do problema ao mercado negro de câmbio, mas Noor Momade questiona essa tese: “Será que um país como o nosso, com a envergadura que tem, a população que tem, o movimento e negócios que tem, será que o mercado paralelo de divisas terá assim um peso tão forte? Não acredito, sinceramente, não acredito.”

Para muitos, a escassez de divisas está intimamente ligada ao défice na balança comercial. Moçambique continua a importar muito mais do que exporta, o que esgota rapidamente as reservas cambiais. A CTA defende a aposta em sectores exportadores estratégicos e em incentivos à produção interna como via para gerar divisas sustentáveis.

FMI pede aceleração das reformas e diversificação da economia

As recomendações do FMI não se limitam ao corte de despesas. A instituição defende que Moçambique deve acelerar reformas estruturais para diversificar a sua economia e reduzir dependências externas. Entre as prioridades estão a revisão da política fiscal e tributária, com ampliação da base de contribuintes, a melhoria do ambiente de negócios – facilitando a abertura de empresas e o acesso ao financiamento –, entre outras medidas.

Cooperação com Portugal ganha novo fôlego

O encontro contou também com a intervenção de Mário Ferreira, novo delegado da AICEP em Moçambique, que destacou a disponibilidade de Portugal em reforçar a cooperação bilateral:

“Estou aqui para dar-me a conhecer e reiterar a total disponibilidade da minha entidade e do meu governo em continuar a construir pontes entre Moçambique e Portugal”, afirmou.

Ferreira salientou que empresas portuguesas têm presença consolidada em sectores como banca, energia e seguros, e estão dispostas a investir mais em áreas estratégicas como infra-estruturas e turismo.

“Temos experiência acumulada e acreditamos que podemos somar esforços, transformando dificuldades em oportunidades”, acrescentou.

Portugal prepara-se para acolher, em Dezembro, uma Cimeira bilateral com a presença do Presidente moçambicano, Daniel Chapo, e do Primeiro-Ministro português. O encontro será uma nova plataforma para dinamizar parcerias e atrair investimento europeu para Moçambique.

Turismo e energia como sectores de aposta conjunta

Para Noor Momade, há grande interesse em aproveitar a experiência portuguesa no sector do turismo, considerado um dos mais promissores em Moçambique: “Portugal conseguiu transformar-se num destino turístico de referência mundial em poucos anos. Esse knowhow pode ser extremamente útil para o nosso país, que tem enorme potencial ainda pouco explorado”, referiu.

Outro sector em destaque foi o energético, numa altura em que Moçambique procura consolidar o seu papel como fornecedor regional de electricidade e explorar com maior valor acrescentado os seus recursos naturais. A cooperação luso-moçambicana poderá criar sinergias relevantes neste campo.

Empresários pedem estabilidade cambial e juros mais baixos

Apesar das perspectivas de reforço da cooperação, os empresários moçambicanos reiteraram as suas preocupações com o ambiente doméstico. As altas taxas de juro continuam a estrangular a capacidade de financiamento das empresas, e a instabilidade cambial agrava custos e riscos de planeamento.

“É sempre muito bom e importante quando coisas destas acontecem. Isso vai ajudar o empresariado nacional, porque, de facto, as taxas de juro no nosso país são elevadas e, em algum momento, o negócio não compensa. Mas, com estas aberturas e com os passos que o banco central tem dado, queremos acreditar que será um impulsionador para as empresas e para o mercado moçambicano”, afirmou Noor Momade.

CASP 2025: espaço de debate e soluções

A 20.ª Conferência Anual do Sector Privado (CASP), marcada para Novembro, será um espaço privilegiado para aprofundar estas questões. A CTA anunciou ter convidado formalmente o FMI a participar, de modo a enriquecer o debate com a experiência internacional da instituição.

Com o lema “Reformar para competir e o relançamento económico de Moçambique”, o evento pretende mobilizar empresários, governo e parceiros internacionais em torno de medidas concretas para dinamizar a economia, gerar emprego e criar condições de investimento mais competitivas.

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