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PERDÃO DA CHINA: Vasco José aponta para riscos de dependência a longo prazo

A recente decisão da China em perdoar os juros da dívida de Moçambique até 2024 e conceder um donativo adicional de 13 milhões de dólares proporciona um alívio imediato às finanças públicas moçambicanas. No entanto, esta aparente generosidade consolida um padrão de dependência e prejudica a competitividade do sector privado nacional a longo prazo. A análise é do economista Vasco José, da Standard and Research.

Texto: Amad Canda

A medida anunciada pela China afecta uma carteira de crédito estimada em 1,38 mil milhões de dólares, o que representa cerca de 14% da dívida externa total de Moçambique, solidificando a posição do gigante asiático como o principal credor bilateral do país.

Segundo Vasco José, os benefícios a curto prazo são inegáveis. “No imediato, o perdão dos juros e o donativo constituem um alívio significativo para o serviço da dívida e para a tesouraria do Estado moçambicano, liberando recursos financeiros em um contexto orçamental apertado”, explicou o economista.

Contudo, o alívio fiscal momentâneo ofusca uma estratégia económica mais ampla e com consequências profundas. O mecanismo principal da penetração chinesa em Moçambique tem sido o financiamento de infraestruturas públicas por meio dos seus bancos estatais – como o China Exim Bank e o Banco de Desenvolvimento da China –, combinado com a execução das obras por construtoras também chinesas.

Projectos emblemáticos, como a Estrada Circular de Maputo (um investimento de 315 milhões de dólares) e a Ponte Maputo-Katembe (cerca de 1,3 mil milhões de dólares), foram financiados e construídos por este modelo, criando uma cadeia de valor fechada que marginaliza as empresas locais.

“A estratégia empresarial do Estado chinês em Moçambique, assente no negócio de construção de infraestruturas públicas, está a culminar numa integração vertical preocupante”, alerta Vasco José. Esta integração vai desde o financiamento e construção até ao fornecimento de materiais, como demonstram a entrada da Dugongo Cimentos na cadeia de valor e a aquisição do controlo da Cimentos de Moçambique pelo grupo chinês Huaxin Cement em Setembro de 2023.

O resultado, sustenta a análise, é a erosão da competitividade do sector privado doméstico. “A China tem vindo a consolidar a sua presença no mercado nacional, caracterizada pelo número crescente de concursos adjudicados às suas empresas, mesmo em obras de pequena escala, em detrimento das pequenas e médias empresas de construção nacionais”, sublinhou o economista.

Além da perda de competitividade, o modelo levanta questões sobre a transferência real de competências e a qualidade do emprego para os moçambicanos. Relatos na comunicação social dão conta de que trabalhadores chineses frequentemente substituem mãode-obra local em funções não especializadas, com relações laborais descritas como frágeis e com violações regulares da lei do trabalho.

Para o analista, o padrão satisfatório para a China no segmento das infraestruturas públicas corre o risco de se replicar noutros sectores para onde os seus interesses económicos se estão a diversificar, como o carvão, os transportes e a mineração.

Em suma, enquanto as contas públicas moçambicanas respiram de alívio no curto prazo, a estratégia subjacente pode estar a moldar uma economia onde a capacidade produtiva local struggle para competir, colocando em risco a sustentabilidade e a autonomia económica do país a longo prazo.

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