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NO SECTOR EXTRACTIVO: Empresas prestam mais “assistência social” do que contas

— Os moçambicanos desconfiam do Governo e das empresas! —

As empresas do sector extractivo estão mais dispostas a falar sobre as suas iniciativas sociais e ambientais, mas continuam a esconder quanto pagam em impostos, que contractos assinam e quem são os seus verdadeiros donos. De acordo com o mais recente Relatório sobre o Índice de Transparência do Sector Extractivo (ITSE), elaborado pelo Centro de Integridade Pública (CIP), o sector determinante para o futuro do País permanece cronicamente opaco e resistente à prestação de contas.

Texto: Dossier Económico

Num relatório intitulado “Opacidade Selectiva – O sector extractivo fala do social e cala-se sobre o fiscal”, o CIP revela que, com uma pontuação média geral de apenas 17,98%, a indústria extractiva moçambicana opera num estado de opacidade que mina a confiança pública e impede que a riqueza do subsolo se traduza em progresso para os cidadãos.

De acordo com o documento, a componente fiscal — com uma média de apenas 13,18% — é a mais opaca, o que, segundo a organização, constitui um sinal alarmante num País que depende fortemente destas receitas. Neste domínio, as poucas empresas que prestam contas são a Kenmare Resources (88,14%), a Sasol Petroleum Temane (73,68%) e a Montepuez Ruby Mining (73,24%). Em contrapartida, 18 das 32 empresas avaliadas, o equivalente a 56%, obtiveram uma pontuação de 0%, operando num estado de secretismo absoluto.

A mesma fonte sublinha que a conclusão mais crítica é revelada pela falha das empresas públicas em liderar pelo exemplo. A Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH) ficou com 0% no que respeita à prestação de contas, o que “representa uma abdicação da sua responsabilidade de ser o padrão de excelência em transparência, arrastando a média geral do sector para baixo”. Por outro lado, a sua subsidiária, a Companhia Moçambicana de Hidrocarbonetos (CMH), com 41,63%, é a empresa moçambicana mais transparente do sector. Tal contraste leva o CIP a questionar: “A ENH não sabe o que a sua subsidiária faz, ou sabe, mas opta deliberadamente por não seguir o seu exemplo?”

Avaliando os sectores de hidrocarbonetos e mineiro, o CIP aponta que o primeiro apresenta uma média ligeiramente superior (20,3%) em comparação com o segundo (11,1%), embora ambos se mantenham em níveis considerados baixos. O sector mineiro, apesar de albergar as três empresas mais transparentes do País, é descrito como um verdadeiro “deserto de transparência”, pois 85% das empresas avaliadas obtiveram zero pontos.

A análise evolutiva demonstra que, apesar de pequenas melhorias pontuais, a pontuação geral do ITSE caiu de 29% em 2020 para 17,9% em 2025. O relatório explica que o declínio não significa necessariamente um aumento da opacidade, mas antes resulta da nova metodologia baseada na média geométrica, que penaliza desequilíbrios entre as componentes. A metodologia anterior permitia que um bom desempenho em responsabilidade social compensasse a falta de dados fiscais — o que já não sucede na actual.

Entre as empresas avaliadas desde a primeira edição, destacam-se as trajectórias de melhoria contínua da Kenmare, Sasol e MRM, que consolidaram a sua posição entre as mais transparentes. No extremo oposto, a ENH e a ExxonMobil caíram para níveis de opacidade total, enquanto a Vulcan Resources protagonizou a regressão mais acentuada. A Eni, embora com resultados modestos, registou uma ligeira subida. O relatório classifica estas tendências em cinco perfis de comportamento: PadrãoOuro (Kenmare);

Melhoria Contínua (Sasol, MRM, Twigg); Opacidade Selectiva (TotalEnergies, Eni, CMH); Gigantes Adormecidos (ExxonMobil); Buracos Negros Informacionais (Vulcan, ENH, Minas Moatize e outras quinze empresas com 0%).

O estudo procurou igualmente perceber como o público avalia a transparência do sector. Os resultados revelam um “fosso profundo” entre percepções e expectativas: a maioria dos inquiridos considera que o sector extractivo contribui pouco ou nada para o desenvolvimento nacional, e denuncia a falta de acesso à informação. “Há desconfiança tanto em relação ao Governo como às empresas”, frisa o relatório.

As organizações da sociedade civil e os órgãos de comunicação social reforçam esta percepção negativa, apontando a ausência de dados públicos actualizados e a falta de resposta institucional como principais barreiras à transparência.

O CIP recomenda que as empresas criem secções específicas de transparência nos seus websites, publicando contractos, beneficiários efectivos, relatórios de pagamentos ao Estado e planos ambientais. Insta ainda o Governo e os reguladores a aplicarem de forma rigorosa as leis do direito à informação, impondo sanções administrativas em casos de incumprimento, e propõe a criação de um portal único da transparência extractiva, que concentre dados sobre contractos, licenças, pagamentos e relatórios ambientais de todas as empresas.

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