O Governo moçambicano estima arrecadar 76,8 milhões de dólares norte-americanos (equivalentes a cerca de 4.905,7 milhões de meticais) provenientes da exploração de Gás Natural Liquefeito (GNL) na província de Cabo Delgado, em 2026. De acordo com a proposta do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado (PESOE) para o próximo ano, a que Dossiers & Factos teve acesso, 46,1 milhões de dólares deverão ser canalizados para a Conta Única do Tesouro (CUT), enquanto os restantes 30,7 milhões de dólares serão depositados no Fundo Soberano de Moçambique.
Texto: Maximiano da Luz
A legislação vigente determina que o montante destinado à CUT não pode exceder a quota orçamental definida para o respectivo exercício económico. O PESOE para 2026 já foi submetido pelo Executivo à Assembleia da República (AR) e deverá ser debatido em plenário logo que as Comissões Parlamentares de Trabalho apresentem os seus pareceres.
O Fundo Soberano de Moçambique é descrito no documento como um instrumento estratégico de estabilização macroeconómica e fiscal, concebido para assegurar a gestão prudente e sustentável das receitas do gás natural. A sua criação visa mitigar os impactos da volatilidade dos preços internacionais do GNL, garantir previsibilidade orçamental e reforçar a estabilidade macroeconómica.
Segundo o PESOE, o Fundo Soberano desempenhará igualmente um papel essencial na acumulação de poupanças de longo prazo e na partilha intergeracional dos recursos naturais, fomentando a diversificação económica e aumentando a resiliência do País a choques internos e externos.
De acordo com as normas definidas, todas as receitas provenientes do GNL devem ser, num primeiro momento, depositadas numa Conta Transitória. A partir desta, procede-se à partilha dos recursos, com 60% transferidos para a CUT — para cobrir o Orçamento do Estado — e o remanescente obrigatoriamente destinado ao Fundo Soberano, independentemente do valor.
O documento sublinha que o Fundo Soberano só produzirá benefícios reais para os moçambicanos quando forem sanadas as fragilidades de gestão e transparência que, ano após ano, têm sido apontadas nos sucessivos PESOE.
Défice orçamental e estimativas macroeconómicas
O Orçamento do Estado para 2026 está avaliado em 535 mil milhões de meticais, o que representa 32,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e um aumento face aos 512,7 mil milhões registados em 2025. Ainda assim, o documento prevê um défice orçamental de 113 mil milhões de meticais, inferior ao défice de 126,8 mil milhões do exercício anterior, sinalizando, segundo o Governo, um esforço de consolidação orçamental.
Do total das despesas programadas para 2026, 370,3 mil milhões de meticais serão destinados ao funcionamento do Estado, 107,6 mil milhões ao investimento público e 57,8 mil milhões às operações financeiras — correspondendo a 69,1%, 20,1% e 10,8% da despesa total, respectivamente.
Em relação às receitas, o Governo prevê arrecadar 457.942,3 milhões de meticais em recursos internos, equivalentes a 27,7% do PIB, com um ligeiro aumento de 0,2 pontos percentuais face a 2025. Deste montante, 421.959 milhões corresponderão a receitas do Estado (25,5% do PIB) e 35.983 milhões a crédito interno (2,2% do PIB).
As receitas tributárias deverão alcançar 367.679,5 milhões de meticais, impulsionadas pelos Impostos sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRPC), estimados em 102.170,5 milhões, e pelos Impostos sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRPS), com 69.589,3 milhões. Já os impostos sobre bens e serviços deverão render 160.467,3 milhões de meticais, dos quais 114.614,7 milhões correspondem ao Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).
Produção e previsões do sector do gás
O Executivo prevê, contudo, uma redução na produção da petrolífera italiana Eni em 2026, face aos níveis actuais, estimando-se uma descida de 47,1 milhões de dólares (cerca de 3.009,7 milhões de meticais). O PESOE não apresenta projecções detalhadas da produção de GNL pela empresa, possivelmente por limitações de acesso a dados operacionais e financeiros das multinacionais que actuam no País.
O Governo sublinha que a quota orçamental das receitas do GNL deverá ser aplicada no financiamento de projectos estruturantes e sustentáveis, de elevado impacto socioeconómico, em conformidade com a Estratégia Nacional de Desenvolvimento (END). Como tem sido habitual, prevê-se que a bancada parlamentar da Frelimo, detentora da maioria na AR, venha a aprovar o PESOE para 2026.
Contudo, persistem dúvidas quanto à capacidade do Fundo Soberano e das receitas internas em promover mudanças estruturais na vida dos moçambicanos, que continuam a enfrentar os mesmos desafios sociais e económicos ano após ano.




