O empreendedorismo tem sido apresentado, nos últimos anos, como uma das principais respostas ao desemprego juvenil em Moçambique. As autoridades e os parceiros internacionais defendem-no como motor de criação de auto-emprego, diversificação da economia e redução da dependência externa. No entanto, no terreno, verifica-se que grande parte dos jovens recorre a esta via não por vocação, mas por necessidade, numa tentativa de escapar à exclusão económica e à falta de emprego formal.
Texto: Hélio de Carlos
De acordo com dados de 2023, cerca de 20% dos jovens residentes em áreas urbanas encontram-se desempregados. Nas zonas rurais, muitos dedicam-se à agricultura de subsistência ou ao trabalho familiar não remunerado. Com mais de metade da população com menos de 25 anos, o país enfrenta o desafio de absorver anualmente dezenas de milhares de jovens no mercado de trabalho, num contexto de crescimento económico ainda insuficiente para responder à procura.
Barreiras estruturais e falta de oportunidades
A maioria dos jovens empreendedores começa sem capital inicial e enfrenta limitações no acesso a financiamento. As instituições bancárias exigem garantias, histórico de crédito e colaterais que muitos não conseguem apresentar. Esta dificuldade é agravada pela ausência de mecanismos de crédito especializados e pela burocracia associada ao registo de empresas.
A formalização continua a ser um processo longo e dispendioso. Por essa razão, muitos optam pela informalidade, o que restringe o acesso a programas de apoio, incentivos fiscais e mercados institucionais. O ambiente de negócios continua a ser considerado pouco favorável, sobretudo para quem inicia sem experiência e com fraco suporte técnico.
Apesar da existência de programas de capacitação e de formação empresarial, a transição entre a ideia e o negócio viável continua a ser um dos pontos mais frágeis. Jovens formados em programas de empreendedorismo revelam dificuldades em sustentar as suas iniciativas, muitas vezes por falta de acompanhamento técnico, ligação ao mercado e ausência de redes de mentoria.
Empreender por sobrevivência
Num contexto de desemprego crescente e de escassez de oportunidades no sector público e privado, o empreendedorismo tornouse uma alternativa de sobrevivência. Pequenos negócios familiares, actividades de revenda, iniciativas ligadas à tecnologia e ao agro-negócio têm surgido em várias cidades e vilas do país.
Contudo, segundo analistas económicos, a predominância da informalidade faz com que muitas dessas iniciativas tenham curta duração. A ausência de um ambiente regulatório estável e de políticas de apoio consistentes impede que pequenos empreendimentos se consolidem e cresçam.
Programas públicos e apoio internacional
Para tentar inverter o cenário, o Governo e os seus parceiros lançaram nos últimos anos diversos programas de apoio ao empreendedorismo juvenil. Entre eles destaca-se o Agora Emprega, que prevê beneficiar até 20 mil jovens entre os 18 e 35 anos até ao final de 2025. O programa dá prioridade à igualdade de género, sendo que 61% das vagas iniciais foram preenchidas por mulheres.
Outro instrumento é o Fundo de Desenvolvimento Local (FDEL), criado em 2025, que destina 60% dos seus recursos a jovens e mulheres. O fundo oferece microcréditos que variam entre 20 mil e 500 mil meticais, com uma taxa de juro subsidiada de 5% ao ano, destinados ao financiamento de pequenas e médias iniciativas.
Apesar dos avanços, as dificuldades persistem. Muitos beneficiários relatam falta de acompanhamento técnico e de oportunidades de reinvestimento. Sem suporte contínuo, alguns negócios não ultrapassam o primeiro ano de funcionamento.
Desigualdades regionais
As limitações no acesso a programas de apoio são mais visíveis fora do Grande Maputo. Em províncias como Nampula, Niassa e Sofala, o número de incubadoras, centros de inovação e estruturas de mentoria ainda é reduzido. Projectos promissores acabam por estagnar por falta de acompanhamento e ligação a mercados.
Autoridades locais reconhecem que a concentração de oportunidades na capital tem dificultado o desenvolvimento equilibrado do empreendedorismo no país. Várias instituições estão a planear a expansão de centros de formação e apoio a jovens empreendedores para regiões periféricas, com o objectivo de reduzir as disparidades territoriais.
Impacto social e económico
De acordo com dados de programas como o Ideialab, cerca de 75% dos jovens apoiados conseguiram criar novos empregos, com uma média de 4,9 postos de trabalho por empreendimento. As mulheres representam 55% dessas vagas, sinalizando um crescimento da participação feminina no sector.
O empreendedorismo jovem tem contribuído para o surgimento de iniciativas em sectores emergentes como os serviços, tecnologia, agro-negócio e economia verde, promovendo alguma diversificação económica. Programas de formação e apoio estão também a expandir-se para áreas rurais e centros urbanos fora do eixo Maputo-Matola.
Reformas necessárias
Especialistas defendem a simplificação dos processos de formalização e a redução de custos de registo de empresas. Apontam também a necessidade de criar linhas de microcrédito específicas para jovens empreendedores, com garantias públicas, capital semente e mecanismos de mentoria pós financiamento.
O reforço das ligações entre empresas jovens e cadeias de valor locais é considerado essencial para garantir sustentabilidade. Outro aspecto apontado é a necessidade de políticas de compras públicas que favoreçam empreendimentos de jovens, estimulando a produção e o consumo interno.
O avanço da digitalização e da economia verde é visto como uma oportunidade para reduzir barreiras de entrada e ampliar o impacto social. Para isso, são recomendadas medidas de incentivo à inovação e à formação em competências digitais, bem como à criação de incubadoras regionais com capacidade de apoio técnico e acompanhamento contínuo.
Perspectivas
O empreendedorismo jovem tornou-se um dos principais pilares das estratégias de desenvolvimento e de combate ao desemprego em Moçambique. No entanto, permanece marcado por fragilidades estruturais e desigualdades regionais.
As autoridades esperam que, com o reforço dos mecanismos de financiamento, capacitação e acompanhamento, o sector possa evoluir de uma solução de emergência para uma via sustentável de criação de emprego e rendimento. Enquanto isso não acontece, milhares de jovens continuam a procurar no empreendedorismo uma forma de garantir o sustento e de enfrentar o desafio do desemprego.




