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EM CABO DELGADO: Fome e desemprego persistem entre os retornados

Cabo Delgado enfrenta uma situação económica delicada, especialmente para os mais de 600 mil deslocados que retornaram às suas zonas de origem, de onde tinham saído por conta da acção dos terroristas que actuam na região. De acordo com uma análise do Centro de Integridade Pública (CIP), esses retornados encontram-se numa situação crítica, marcada por alto custo de vida, desemprego generalizado e falta de meios de subsistência, agravados pela destruição de infra-estruturas e pela escassez de ajuda humanitária.

Texto: Amad Canda

Para muitos retornados, voltar às suas aldeias foi uma escolha forçada pelas difíceis condições nos centros de reassentamento. Entretanto, o regresso às suas terras trouxe novos desafios. O acesso ao transporte para as áreas mais remotas é limitado e dispendioso, com alguns relatos de famílias que pagaram até cinco mil meticais para retornar, mais do que o triplo do custo normal em tempos de paz. Esse custo elevado deve-se à insegurança, que afecta a disponibilidade de transporte e os preços praticados.

Uma vez de volta às suas casas, muitos encontram apenas escombros. Em Mocímboa da Praia e Palma, por exemplo, dois dos distritos mais visados pelos terroristas, a destruição das infraestruturas de saúde e educação é generalizada, e a reconstrução é lenta, prejudicada pela falta de fundos e pelo ritmo burocrático. As famílias enfrentam dificuldades para recomeçar as suas actividades económicas, como a agricultura e a pesca, devido à falta de ferramentas e materiais necessários.

Por outro lado, a escassez de produtos essenciais nas lojas e o aumento dos preços dos alimentos tornam a vida ainda mais difícil para os retornados, muitos dos quais dependem de ajuda humanitária que tem sido cada vez mais limitada, aponta o estudo. ´

Dependência da ajuda e fragilidade do sistema

As organizações humanitárias, como a Cruz Vermelha de Moçambique, têm fornecido kits básicos de ajuda, mas os relatos indicam que essa ajuda não é suficiente para cobrir as necessidades de todas as famílias retornadas. Além disso, há denúncias de corrupção e desvios na distribuição da ajuda, com certas famílias, geralmente ligadas a chefes locais, sendo privilegiadas. Segundo o CIP, este problema de exclusão aumenta a vulnerabilidade das populações mais pobres e fomenta tensões sociais.

Com a economia local em frangalhos, a maioria dos retornados enfrenta um cenário de desemprego crónico. Sem emprego ou fontes de renda, muitos jovens estão em risco de serem aliciados por grupos extremistas violentos, especialmente nas áreas onde a insegurança persiste, alerta o estudo que temos vindo a citar, intitulado “Análise da situação de segurança e socioeconómica dos retornados em Cabo Delgado”.

Embora o Governo tenha prometido melhorias na segurança e infraestruturas através do Plano de Reconstrução de Cabo Delgado, os resultados ainda são limitados. As promessas de serviços básicos, como água potável e energia, ainda não se concretizaram na maioria das aldeias afectadas, e a economia continua estagnada.

De acordo com esta análise, para que Cabo Delgado possa realmente se reerguer, será essencial não apenas focar na segurança, mas também em soluções económicas duradouras. Programas de desenvolvimento de habilidades e geração de renda são cruciais para garantir que os retornados possam sustentar-se e reconstruir suas vidas, reduzindo a dependência de ajuda humanitária.

O terrorismo em Cabo Delgado começou em 2017 e, após ano de ineficácia das Forças de Defesa e Segurança no seu combate, o Governo moçambicano solicitou apoio militar estrangeiro do Ruanda, cujas forças permanecem no terreno, com cerca de cinco mil homens. Também esteve na província a Missão da SADC em Moçambique (composta por tropas de vários países da região), mas saiu há poucos meses, alegando falta de recursos. Sabe-se, no entanto, que a verdadeira razão é o incómodo decorrente do facto de o Ruanda financiar grupos separatistas na República Democrática de Congo, outro país-membro da região.

O País também tem tentado combater a insurgência através de outros meios, como o empoderamento económico das populações locais. Daí a criação da Agência de Desenvolvimento Integrado do Norte (ADIN), responsável pela coordenação do Plano de Reconstrução de Cabo Delgado das Zonas Afectadas pelo Terrorismo – PRCD (2021-2024) e do Programa de Resiliência e Desenvolvimento Integrado do Norte de Moçambique (PREDIN).

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