Uma situação particularmente curiosa está a acontecer na Administração Nacional das Áreas de Conservação (ANAC). A instituição está sem director-geral já há oito meses, desde a exoneração de Celmira Silva, em Julho do ano passado. Desde então, a ANAC está a ser dirigida por um coordenador interino cujas capacidades são questionadas pelos seus pares, que não entendem como é que o Governo deixa uma instituição tão importante para a preservação da biodiversidade, que é uma das suas bandeiras, sem um timoneiro efectivo.
Texto: Dossiers & Factos
Quase que em surdina, Celmira Silva foi exonerada, em meados do ano passado, do cargo de directora-geral da ANAC, uma decisão que praticamente pegou a todos de surpresa, até considerando que ela havia sido empossada para o cargo há apenas ano e meio, pelo então primeiro-ministro, Carlos Agostinho do Rosário.
Na altura, nenhuma figura foi chamada para ocupar de imediato a “cadeira” que pertencia à antiga governadora da província de Cabo Delgado, mas acreditava-se que tal não tardaria a acontecer, como de praxe. Só que, ao contrário do que tem sido habitual, tal ainda não se verificou e já lá passam oito longos meses.
Para segurar o leme, foi nomeado uma espécie de coordenador interino. Trata-se de um quadro ligado ao sector da fiscalização que, segundo o que apurou Dossiers & Factos, não possuiu as necessárias capacidades para levar uma instituição daquela dimensão a bom porto. À título de exemplo, dizem fontes ligadas ao sector faltar traquejo ao líder interino da instituição para levar a cabo negociações que possam conduzir à implementação da enorme gama de projectos que a ANAC possui.
Negligência numa das bandeiras do Presidente Nyusi?
A sensação que reina internamente e entre os parceiros de cooperação é de que a ANAC estará a ser de alguma forma negligenciada, o que as fontes consideram incompreensível, tendo em conta que o sector da biodiversidade constitui, desde o início, uma das principais bandeiras da governação do Presidente da República, Filipe Nyusi.
De resto, o Chefe de Estado tem sido reconhecido pelo seu empenho nesta área. Recorde-se que, em Setembro de 2022, Filipe Nyusi recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Eduardo Mondlane, a maior e mais antiga instituição do ensino superior em Moçambique, em reconhecimento da sua luta pela implementação de medidas de conservação da biodiversidade e na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.
Alguns anos antes, em 2016, o Presidente da República havia sido laureado em Washington, nos Estados Unidos da América (EUA), pelo seu papel nesta área. “Não é nenhum segredo que a fauna bravia de Moçambique sofre com a caça furtiva. No entanto, o presidente Nyusi comprometeu o seu país a efectuar uma melhor protecção dos seus 13 Parques Nacionais e Reservas enquanto promove, simultaneamente, uma nova abordagem de desenvolvimento rural: utilizar os Parques e Reservas de Moçambique como motores de educação, desenvolvimento económico, e prestação de serviços para as comunidades tradicionais que compartilham ecossistemas com estes tesouros naturais”, argumentou na altura a International Conservation Caucus Foundation (ICCF).
É considerando todo este currículo, ao qual ainda se pode juntar o título de campeão africano na gestão e redução do risco de desastres, que alguns quadros e parceiros da ANAC entendem ser um contra-censo a não indicação de um líder efectivo para dinamizar a instituição.
ANAC controla 25% do território nacional
Entretanto, o espanto pela não nomeação de um director-geral para a ANAC é ainda maior pela circunstância de a instituição ter nas suas mãos o controlo de um quarto do vastíssimo território nacional. Esse território inclui Parques Nacionais, Reserva Nacional, Reserva Especial e Área Transfronteiriça. Os Parques Nacionais estão em maior número (10), podendo ser encontrados em Maputo, Banhine, Bazaruto, Chimanimani, Gilé, Gorongosa, Limpopo, Mágoè, Quirimbas e Zinave.
Em termos globais, a ANAC tem sob sua alçada cerca de 5.500 espécies de plantas, 220 espécies de mamíferos e 690 de aves, algumas das quais endémicas.