Dentre os vários regimes de Governo alguma vez testados, a democracia é aquele que mais se aproxima da perfeição. Uma das suas maiores qualidades é, sem dúvida, o facto de oferecer oportunidade de exercício de alternância de poder, nomeadamente quando, periodicamente, os eleitores são chamados às urnas.
Embora a participação política e o exercício da cidadania sejam encorajados em todos os momentos, as eleições acabam por ocupar um lugar central no campo democrático, porquanto é nas urnas que os cidadãos têm uma voz mais decisiva, mais capaz, por assim dizer, de determinar o rumo que um país deve seguir, o que pode significar continuidade ou mudança.
Em democracias mais maduras, a alternância política é frequente e é considerada um fenómeno natural. Vemo-la no Brasil, nos Estados Unidos da América, na Itália e em outras partes do mundo. Ela é, por assim dizer, a celebração da diversidade e a prova de que os caminhos para se atingir o almejado desenvolvimento são vários.
São abençoados os cidadãos que moram em Países onde se pode exercer o direito de escolher entre várias propostas. Entre tais países, certamente não está Moçambique, onde a alternância é vista como sacrilégio por aqueles que acreditam ser merecedores do poder eterno, independentemente do seu desempenho à frente dos destinos da Nação.
Prova disso são as estratégias torpes postas em marcha em cada pleito eleitoral com vista a manutenção do poder. Foi o que se viu em Outubro último, no contexto das eleições autárquicas. Fruto disso, várias autarquias um pouco por todo o País estão a ser dirigidas por edis sem qualquer legitimidade, porque não foram eleitos pelos munícipes.
Isto representa, quanto a nós, a decretação da nulidade da democracia e um desrespeito enorme pelo eleitorado. Sobre isto já se escreveu fartamente. Também nós o fizemos, aliás, em tempo útil. Para já, o que nos propomos abordar é outra forma de anular a democracia, que passa pelo subaproveitamento das potencialidades que a mesma apresenta.
Conforme referimos mais acima, a grande beleza da democracia reside precisamente na particularidade de se poder escolher entre várias propostas, o que não acontece em autocracias, que simplesmente impõem um modelo/projecto a ser seguido. Sendo assim, o desejável é que todas as nações que se consideram democráticas tenham uma ou mais alternativas ao regime do dia, o que, no caso de Moçambique, não se vê.
Haverá, naturalmente, a tendência a contrapor esta constatação com a alusão às dezenas de partidos políticos que legalmente actuam no País. Naturalmente, nossa questão vai para além disso e destina-se precisamente a mostrar a irrelevância deste conjunto de formações políticas, provado que está que as mesmas não têm qualquer projecto capaz de tirar este país da situação em que se encontra.
A Frelimo ainda clama que socialismo triunfará, mas o projecto que nos apresenta está longe do estado social, movendo-se sempre em direcção a um capitalismo selvagem que produz ricos, mas não riqueza passível de ser redistribuída aos milhões que vivem na indigência. Esta política já provou ser falha, e é sobretudo por ela que se explica a pobreza em que o país segue mergulhado.
Perante este quadro, clama-se por alternativas, que provavelmente passariam pela Renamo e pelo Movimento Democrático de Moçambique, visto serem os maiores partidos logo a seguir à Frelimo. No entanto, uma simples análise aos discursos de ambos os partidos mostra de forma nítida o vazio de ideias que há neles.
Não é conhecido o programa destes movimentos para, por exemplo, resolver o problema da habitação ou do desemprego. Sem planos, agarram-se simplesmente ao anti-frelimismo, procurando explorar a exaustão de um povo que, a bem da verdade, é facilmente manipulável. Diante deste cenário, absolutamente catastrófico, resulta claro que, ainda que um dia alcancem o almejado poder, nada serão capazes de fazer, justamente porque nunca pararam para pensar em soluções para o País.
Dito isto, estamos condenados à eterna miséria, porque, para já, não se vislumbra uma rápida transformação do quadro cinzento aqui pintado.
*Editorial extraído da edição 549 do Dossiers & Factos