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EXPLORAÇÃO DE GÁS EM INHAMBANE: População vive em condições deploráveis e privada dos seus direitos

A comunidade de Mabime, localizada no distrito de Inhassoro, província de Inhambane, encontra-se mergulhada num estado de abandono. Apesar da presença da multinacional Sasol, que há anos explora o gás natural da região, os moradores vivem numa luta diária pela sobrevivência, privados de serviços básicos como água potável, energia eléctrica e educação. Eles clamam por justiça e melhores condições de vida, ao mesmo tempo em que denunciam o silêncio das autoridades governamentais perante suas dificuldades.

Texto: Anastácio Chirrute

Ana Matola, uma residente de 45 anos, expressa a sua frustração: “Nós vemos o gás sair daqui todos os dias, mas o que sobra para nós? Nada. Nem luz, nem água. As crianças caminham longas distâncias para ir à escola e, quando chegam lá, muitas vezes, não têm professores. O governo sabe do nosso sofrimento, mas parece que fecharam os olhos para nós.”

Além disso, a antiga ponte que liga a comunidade a outras regiões está prestes a desmoronar, ameaçando a segurança dos que a utilizam diariamente. A população exige a construção urgente de uma nova ponte, mas até agora não houve progresso nas obras. A Sasol declarou que esse projecto não faz parte das prioridades acordadas no âmbito do Acordo de Desenvolvimento Local (ADL), o que gera ainda mais revolta entre os moradores.

Amílcar, outro residente local, denuncia:  “Essa ponte é um perigo! Um dia vai cair, e será uma tragédia. Será que estão à espera disso para fazerem alguma coisa? Já não basta viver sem água e electricidade, agora temos que arriscar nossas vidas para atravessar essa ponte. É uma vergonha.”

Serviços básicos são escassos enquanto a Sasol gera milhões

Apesar da riqueza gerada pela exploração do gás natural, a população de Mabime mal sente os benefícios desse recurso. Para eles, a realidade é de seca, fome e desespero. O acesso à água potável e energia eléctrica é quase inexistente. A maioria dos moradores vive em condições deploráveis, enfrentando longas jornadas a pé para conseguir água ou atendimento médico. A vida em Mabime é caracterizada pela carência de quase tudo, e a exploração dos recursos naturais parece trazer mais frustração do que esperança para os habitantes locais.

Manuel, um jovem agricultor de 32 anos, descreve a situação: “aqui em Mabime, não temos nada. A Sasol está a tirar o gás da nossa terra, mas o que ganhamos com isso? Nossos campos estão secos, não temos água para irrigar, nem electricidade para trabalhar à noite. Como posso sustentar minha família assim? Parece que estamos a ser esquecidos.”

O líder comunitário, que prefere não ser identificado, falou com a nossa equipa de reportagem e relatou o sofrimento diário da população:

“Viver aqui em Mabime requer muita coragem. O governo diz que há projectos para melhorar nossas vidas, mas nunca vemos nada. Enquanto isso, continuamos a viver sem serviços básicos e com a pobreza a aumentar. A Sasol deveria fazer mais pela nossa comunidade, mas parece que só estão preocupados com o gás.”

O desespero é visível em cada canto da vila. Pequenos empreendedores que sonhavam em abrir negócios locais, como serralharias ou mercearias, são obrigados a desistir por falta de energia eléctrica. Maria, uma comerciante que tentava abrir uma barraca para vender refrigerantes, contou:

“Não consigo vender refrigerantes porque não tenho como manter o gelo. Sonhei com este negócio para sustentar meus filhos, mas sem electricidade, é impossível. A Sasol e o governo precisam resolver esta situação.”

“Sempre cumprimos com nossas obrigações” – Sasol

Apesar das críticas, a Sasol defende-se, afirmando que sempre cumpriu com suas obrigações fiscais e contribuiu para o desenvolvimento do país. Em 2023, a empresa pagou 120 milhões de dólares em impostos e foi reconhecida pela Autoridade Tributária como o maior contribuinte de Moçambique. A empresa garante que a responsabilidade de fornecer serviços sociais básicos, como saúde, educação e infra-estruturas, cabe ao governo, não à Sasol.

Mateus Mosse, director de relações corporativas da Sasol, explicou: 

“A Sasol cumpre rigorosamente com suas obrigações fiscais, contribuindo com milhões de dólares para os cofres do Estado. Esses fundos são canalizados para o governo, que é responsável por implementá-los nas comunidades. Em Mabime, entendemos que há necessidades urgentes, mas é o governo que deve fornecer os serviços básicos.”

Quanto à construção da nova ponte, Mosse esclareceu que, embora este projecto não tenha sido incluído no Acordo de Desenvolvimento Local actual, ele será priorizado no próximo ano financeiro, que começa em Julho de 2025. No entanto, a falta de uma solução imediata continua a alimentar o descontentamento da população.

Escândalos envolvendo Trabalhadores temporários

A situação já tensa em Mabime foi agravada por acusações de que trabalhadores envolvidos na construção do projecto PSA, subcontratados pela Sasol, estariam envolvidos em escândalos sexuais com menores. Mateus Mosse negou que a empresa tenha responsabilidade directa sobre as acções desses trabalhadores temporários, mas afirmou que a Sasol está disposta a cooperar com as autoridades para resolver qualquer questão que envolva as comunidades locais.

“A Sasol não monitora a vida social dos trabalhadores temporários subcontratados. Embora a empresa tenha altos padrões éticos, esses indivíduos não são funcionários directos da Sasol. No entanto, estamos dispostos a colaborar com as autoridades para esclarecer qualquer caso relacionado a eles.”

O escândalo é mais um golpe na já fragilizada relação entre a população local e a Sasol, alimentando o sentimento de injustiça e abandono. Enquanto isso, os moradores de Mabime continuam a lutar por melhores condições de vida, esperando que tanto o governo quanto a  empresa que explora os recursos da sua terra ouçam as suas vozes e ajam em prol do seu bem-estar.

Texto extraído na edição 579 do Jornal Dossiers & Factos

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