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“FAKE NEWS” NAS ELEIÇÕES: Samuel Simango propõe “Ministério Público Eleitoral”

Samuel Simango propõe “Ministério Público Eleitoral” À medida que Moçambique se prepara para as suas sétimas eleições gerais, marcadas para 9 de Outubro de 2024, o país enfrenta um desafio crescente: a disseminação de desinformação, mais conhecida como fake news, no contexto da campanha eleitoral. Este fenómeno ameaça a integridade do processo eleitoral e pode influenciar de forma negativa a percepção dos eleitores, criando desconfiança e manipulando o debate público, o que leva o académico Samuel Simnago a propor um “Ministério Público Eleitoral”.

Texto: Milton Zunguze

Nos últimos tempos, a proliferação de fake news tem atingido níveis alarmantes, especialmente nas redes sociais. Casos de desinformação, como a falsa notícia de que Graça Machel estaria a apoiar Venâncio Mondlane ou alegações infundadas sobre o desvio de fundos supostamente doados a Venâncio Mondlane pela UNITA, são exemplos recentes que demonstram a seriedade do problema.

Com a disseminação destas informações falsas, a sociedade moçambicana começa a questionar o impacto deste fenómeno na construção de uma democracia sólida e informada. Para melhor compreender os desafios impostos pela desinformação, Dossiers & Factos conversou com especialistas e observadores, que destacaram a necessidade de reforçar o papel das instituições no combate a este problema. Entre as propostas mais contundentes está a criação de um Ministério Público Eleitoral.

Samuel Simango argumenta que a desinformação deve ser tratada como uma “teoria da conspiração” deliberadamente projectada para confundir e manipular a opinião pública, classificando-a ainda como uma forma de “violência eleitoral”. Para ele, a criação de um Ministério Público Eleitoral seria essencial para garantir uma acção rápida e eficaz contra os crimes eleitorais ligados à disseminação de informações falsas.

“A desinformação normalmente ocorre quando há uma tentativa deliberada de confundir ou manipular as pessoas por meio da transmissão de informações desonestas, muitas vezes baseadas em teorias conspiratórias e distorções de discursos convencionais”, explicou Simango.

O professor lamenta a inexistência de um órgão específico para julgar esses casos com a devida celeridade, sugerindo que um Ministério Público Eleitoral poderia aplicar multas rápidas e duras contra os infractores. “A legislação actual é permissiva, não ajuda a formatar os ilícitos eleitorais de forma clara, o que cria um ambiente propício para o abuso de poder por parte dos candidatos e seus apoiantes”, observou.

Segundo ele, o principal problema das instituições judiciais e eleitorais actuais é a sua falta de imparcialidade, o que dificulta uma intervenção eficaz no combate à desinformação. Simango enfatiza que, sem uma estrutura específica como o Ministério Público Eleitoral, a aplicação de sanções será sempre problemática, porque a imparcialidade dessas instituições é frequentemente questionada.

“Esses órgãos, como a PGR, não agem de forma isenta. Isso dificulta a sua actuação eficaz contra a desinformação, porque pode ser interpretado como um benefício ou prejuízo a um determinado candidato ou partido”, afirmou.

Desinformação como forma de “violência eleitoral”

Na visão de Samuel Simango, o uso da desinformação nas eleições deve ser tratado com a seriedade de um crime eleitoral. Ele destaca que a prática pode ser considerada uma forma de violência eleitoral, dado que visa directamente a manipulação do voto e a alteração da percepção pública de forma injusta e maliciosa.

“Quando se espalha uma informação falsa, como a que dizia que Graça Machel estava a apoiar Venâncio Mondlane, isso é um ataque directo à integridade do processo eleitoral”, argumenta Simango. “É um abuso de poder, e não se pode permitir que uma eleição seja decidida com base em mentiras e manipulação.”

Simango enfatiza que o principal perigo da desinformação é a sua velocidade de propagação, especialmente com o uso de redes sociais e plataformas digitais. Ele alerta que as instituições eleitorais não estão preparadas para lidar com a rapidez e o alcance dessas novas formas de comunicação.

“Precisamos de órgãos eleitorais e de justiça que compreendam este fenómeno de desinformação e possam desencorajar rapidamente quem pratica estas acções. Sem uma intervenção imediata, a desinformação pode comprometer a qualidade do processo democrático”, alertou.

Falta de literacia digital piora a situação

Outro ponto destacado pelos analistas ouvidos por Dossiers & Factos é a necessidade de uma educação digital mais ampla para que os cidadãos possam reconhecer e questionar as informações que recebem, especialmente no contexto eleitoral. Armando Nhantumbo, jornalista sénior e quadro do MISA-Moçambique, sublinha que a desinformação não só prejudica os partidos e candidatos, mas também afecta directamente o direito dos eleitores de fazer escolhas informadas.

“A desinformação rouba das pessoas o direito de tomar decisões conscientes com base em factos verdadeiros”, afirma Nhantumbo. “Sem uma população com as ferramentas adequadas para distinguir o que é verdadeiro do que é falso, as eleições tornam-se uma farsa.”

Nhantumbo critica a cultura de secretismo que ainda prevalece em muitos sectores da sociedade moçambicana, apontando que a falta de informação acessível e transparente facilita a propagação de fake news. Ele defende que os partidos políticos e candidatos devem adoptar uma postura mais proactiva na disponibilização de informações verdadeiras e refutação de rumores.

“Esta luta contra a desinformação não pode ser responsabilidade apenas do MISA ou de uma entidade isolada. Deve haver um esforço colectivo entre os partidos políticos, os órgãos governamentais e a sociedade civil para garantir que a verdade prevaleça”, acrescenta.

Para o escriba, a desinformação representa um ataque directo à democracia, enfraquecendo o processo eleitoral e distorcendo o debate público. Ao manipular os factos e confundir os eleitores, as fake news destroem a confiança nas instituições democráticas e nos próprios candidatos.

“Não podemos construir uma democracia baseada na manipulação e na deturpação dos factos”, alerta Nhantumbo. “Infelizmente, estamos a ver que muitos actores eleitorais, ou pessoas ligadas a eles, estão a criar e a propagar desinformação, aproveitando-se das vantagens que ela pode trazer.”

Este fenómeno é particularmente preocupante quando os próprios candidatos e partidos políticos não se pronunciam contra a desinformação, especialmente quando esta os beneficia directamente. Nhantumbo sublinha que todos os actores devem estar comprometidos com a verdade e combater activamente a propagação de informações falsas.

O caminho a seguir: um combate colectivo à desinformação

Para combater a desinformação de forma eficaz, Nhantumbo e Simango apelam ao envolvimento de todos os sectores da sociedade, desde a sociedade civil, Governo, partidos políticos até os órgãos eleitorais. O combate à desinformação deve ser uma prioridade para garantir que os eleitores possam tomar decisões informadas e que a democracia moçambicana se fortaleça.

Nhantumbo também ressalta a importância de criar um ambiente de maior transparência e acesso à informação, para que os eleitores possam distinguir melhor as narrativas enganosas das informações corretas. Ele conclui sublinhando que a desinformação não pode ser combatida com esforços isolados, sendo necessária uma abordagem integrada e coordenada para enfrentar este desafio crescente.

 

Texto extraído na edição 579 do Jornal Dossiers & Factos

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