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MANIFESTAÇÕES: Crise pós-eleitoral paralisa economia

O clima de tensão em Moçambique atingiu novos patamares esta semana, com duas paralisações gerais (segunda e quinta-feira; há uma terceira esta sexta-feira), deixando o País literalmente parado e amplificando o quadro de incertezas políticas e económicas. A Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) estima que, só com a paralisação de segunda-feira, Moçambique sofreu um prejuízo de 1,4 mil milhões de meticais, afectando a frágil economia nacional. O panorama é sombrio e os sinais de deterioração económica emergem com força. A instabilidade ameaça, inevitavelmente, a confiança dos investidores estrangeiros, factor crucial para o País, que há anos luta para captar Investimento Directo Estrangeiro (IDE) e manter uma balança de pagamentos minimamente equilibrada.

Texto: Amad Canda

Quinta-feira, 22 de Outubro. Uma imagem desoladora dominava as cidades principais. Maputo, Matola, Beira, Nampula e Nacala-Porto amanheceram vazias, num silêncio inquietante. Estabelecimentos comerciais e centros comerciais fecharam suas portas, tal como escolas e instituições públicas, e a economia informal — que sustenta uma fatia expressiva da população — foi praticamente suspensa. Nas ruas, onde o tráfego intenso é habitual, apenas alguns carros e motos circulavam, enquanto barricadas e pneus queimados bloqueavam o trânsito em diversas avenidas.

Chimoio, no centro do País, viu comerciantes que tentaram abrir as portas serem rapidamente forçados a fechá-las, quando manifestantes alertaram para possíveis consequências. A insegurança pairava no ar, e as actividades comerciais e económicas foram interrompidas, reforçando o impacto financeiro negativo sobre o quotidiano da população.

Manifestações e confrontos com a polícia

O rastilho para a violência foi a divulgação oficial dos resultados das eleições gerais, realizadas a 09 de Outubro, que apontam Daniel Chapo como o vencedor com 70,67% dos votos. Venâncio Mondlane, principal candidato da oposição, contesta o resultado, afirmando ser vítima de uma fraude. A reacção dos seus apoiantes foi imediata. Enquanto a Comissão Nacional de Eleições (CNE) anunciava os resultados no Centro de Conferências Joaquim Chissano, manifestantes tomaram a Avenida Joaquim Chissano, onde montaram barricadas e enfrentaram a polícia.

O cenário era caótico. No Bairro de Maxaquene, pneus e contentores de lixo foram empilhados para bloquear ruas, enquanto a polícia, mesmo munida de gás lacrimogéneo, parecia incapaz de conter a multidão. Confrontos similares ocorreram em Chimoio, onde as forças de segurança recorreram a balas verdadeiras para dispersar os manifestantes, e na vila de Boane, onde a violência resultou na morte de dois jovens.

Além dos confrontos com a polícia, houve registos de saques em algumas lojas e estabelecimentos comerciais. Os prejuízos recaem sobre os comerciantes, muitos dos quais distantes das questões políticas, mas que agora enfrentam perdas materiais significativas, num momento em que a economia nacional já está fragilizada.

Consequências económicas e o impacto na divisa

Moçambique enfrenta uma crise de divisas sem precedentes. A actual situação política e os constantes protestos abrem um novo capítulo de incerteza para a economia, afectando a confiança dos investidores estrangeiros e tornando o IDE cada vez mais distante. Sem a entrada de capital estrangeiro, a economia moçambicana perde uma das suas principais fontes de divisas, o que compromete não apenas o fluxo de importações mas também a capacidade de sustentar as reservas cambiais, que já estão a níveis críticos. O próprio Banco de Moçambique, que tenta manter uma política rígida de controlo cambial, vê-se numa situação complicada, pois as reservas vão-se esgotando à medida que as exportações não conseguem equilibrar a balança comercial.

A falta de divisas reflecte-se no aumento dos preços, afectando directamente o custo de vida. A inflação ameaça disparar, e bens de primeira necessidade começam a escassear em alguns pontos do país. A moeda nacional, o metical, enfrenta uma pressão de desvalorização, que poderá agravar-se com a fuga de capitais. Bancos comerciais enfrentam dificuldades em manter transacções em moeda estrangeira, e o crédito fica mais caro, afectando empresas e famílias.

Instabilidade como factor de desemprego e pobreza

A CTA, num comunicado, alertou que a situação actual poderá causar graves repercussões no mercado de trabalho. A diminuição do IDE traduz-se directamente em menos investimentos no sector produtivo e, consequentemente, menos empregos. As empresas estrangeiras, temendo o cenário de insegurança, deverão rever seus planos e algumas podem mesmo optar pela retirada de activos do país, um processo que não só corta empregos, mas também priva o Estado de receitas fiscais essenciais.

Para além do impacto no emprego formal, os trabalhadores da economia informal, responsáveis pelo sustento de grande parte da população, também são gravemente afectados. Com a paralisação dos centros comerciais e do comércio ambulante, famílias inteiras ficam sem fontes de rendimento diário, mergulhando ainda mais pessoas na pobreza.

Incerteza no horizonte: a continuidade das greves

Na noite de quinta-feira, Venâncio Mondlane reafirmou, de “parte incerta”, que a greve continuaria hoje, sexta- -feira, numa tentativa de mobilizar ainda mais cidadãos contra o que considera ser um processo eleitoral fraudulento. A repetição das paralisações aumenta o clima de incerteza e projecta um futuro incerto para a economia moçambicana, já abalada e incapaz de suportar choques adicionais.

Os sectores produtivos estão em compasso de espera, e o país corre o risco de perder qualquer avanço que tenha sido alcançado nos últimos anos. A confiança dos investidores está abalada, e a recuperação, se houver, será lenta e árdua. Em momentos como este, o apelo à calma e ao diálogo parece ser a única via para evitar uma crise ainda maior, cujas consequências poderão ser catastróficas para Moçambique e para o seu povo.

Moçambique está no limite, e o futuro permanece uma incógnita.

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