Em Moçambique decorrem, desde o passado dia 21 de Outubro, ainda que com períodos de intervalo, manifestações que, à primeira vista, foram despoletadas por uma alegada fraude nas eleições de 9 de Outubro. No entanto, um olhar profundo mostra que são sobretudo o resultado da degeneração social a que se vem assistindo, principalmente nos últimos 10 anos de governação. Esta análise é feita ao Dossiers & Factos por um destacado quadro do partido FRELIMO, a quem, por preferir não ser identificado, atribuiremos o nome de César Pascoal. Para fundamentar o seu raciocínio, a fonte lança um olhar crítico sobre alguns dos sectores com maior impacto na vida dos moçambicanos e que, na sua opinião, estiveram aquém do expectável.
Texto: Dossiers & Factos
Vandalismo, roubos, assassinatos e outros crimes actualmente em curso são consequências da degeneração acentuada do tecido social, provocada pela fraca governação, caracterizada por nepotismo na área da defesa e segurança, amiguismo e outros compromissos, culminando em teimosia e ódio.
Estas podem não ser todas as causas, e é possível que existam outras que poderiam ser elencadas. César Pascoal sublinha também que, fora do Governo, a nível do partido, como é sabido, foi-se criando um ambiente de ódio, perseguição, marginalização e descrédito a figuras que outrora serviram como pilares estruturantes das ideologias internas partidárias e também para a persecução de um Governo seguro em Moçambique.
Por estes e outros motivos, as lamentações frelimistas crescem, lembrando que, ao longo dos últimos anos, vários foram os conselhos: alguns feitos como críticas, outros em murmúrios e em outros momentos como opiniões. Todos estes resumiam-se em assessoria gratuita ao Estado, pelo que Moçambique atravessa esta fase, em resumo, por culpa da actual governação.
Defesa e Segurança e Ministério do Interior
Nesta área, ao contrário do que acontece em ambientes sérios de governação, houve muitas mudanças ao longo dos últimos 10 anos nos dirigentes de topo do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), o que por si só demonstra inúmeros problemas ou, ainda, o próprio Chefe de Estado estar inseguro com o tipo de serviço que lhe era prestado.
Ainda neste capítulo da defesa e segurança, o actual Governo conseguiu criar descontentamento enorme a todos os níveis, criando uma fragilidade que acaba por ter uma ligação directa com o actual momento, com o País a beira do precipício devido à violência nas principais cidades e vilas, ao mesmo tempo que Cabo Delgado continua a ser dilacerado pelo terrorismo, embora seja consensual que a situação melhorou graças ao apoio das forças internacionais.
Com a segurança das fronteiras fragilizada, fartaram- -se de entrar estrangeiros ilegais que pululam pelas grandes cidades e não só do País. Cresceu bastante o tráfico e o consumo de drogas no solo pátrio, e o sector também foi responsável pela fuga massiva de empresários estrangeiros, devido à crescente onda de raptos envolvendo agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM).
Sector da Justiça
Considera a nossa fonte que, na justiça, pouco ou quase nada se fez para o cidadão. Neste ministério, o que se sabe ter havido é uma oratória aproximada a muitas mentiras e destruição das estratégias e do papel deste sector. Como resultado, ficou apagado, tal como se pode depreender nos últimos acontecimentos.
Negócios Estrangeiros e Cooperação
A única bandeira que se pode erguer como orgulho deste sector no último quinquénio é a eleição de Moçambique para o Conselho de Segurança das Nações Unidas. Em termos de cooperação com outros Estados, a diplomacia moçambicana registou fracassos notórios, com a titular da pasta, Verónica Macamo, a mostrar-se incapaz, de tal sorte que, no entender da nossa fonte, não merecia ter permanecido até ao fim.
Agricultura
A fonte resume este sector como de bastante importância para a vida dos moçambicanos, sendo um dos maiores ministérios existentes. Da análise que a nossa fonte faz, prefere resumir o sector dirigido por Celso Ismael Correia como sendo “de barulho” e não arrisca afirmar se houve de facto o cumprimento dos planos e perspectivas.
Economia e Finanças
Este ministério, considerado o pulmão do Governo, é descrito pelas nossas fontes como um dos mais sofridos do mandato, tanto pela falta de dinheiro nos cofres do Estado, motivada pelo corte de financiamento dos parceiros de cooperação, como pela desestruturação existente na própria política de governação do País, com especial impacto neste sector, sem ignorar a corrupção.
Foi o ministério responsável pela Tabela Salarial Única, um instrumento que prometia aumentar o poder de compra dos funcionários públicos, mas que acabou piorando a sua situação, gerando um nível de descontentamento inédito.
Educação e Desenvolvimento Humano
Tal como noutros sectores, o Chefe do Estado e do Governo optou pelo camaradismo partidário em vez da meritocracia. As fontes entendem que, neste último quinquénio, Nyusi teve de tudo para tomar decisões e exonerar a titular da pasta, Carmelita Namashulua, mas não o fez, mesmo consciente de que este também era um sector nevrálgico.
A par das já tradicionais turmas ao relento, problemas na produção e distribuição do livro escolar constituíram a principal marca do sector.
Saúde: O ninho dos negócios dos camaradas
O sector da saúde é avaliado como um dos piores neste último quinquénio de Filipe Nyusi. Acrescenta-se que foi o “ninho” dos negócios milionários dos membros seniores do partido FRELIMO, o que, certamente, foi também um dos factores para o fracasso da área, que, diga-se, remou em contramão com o seu bonito slogan: “O nosso maior valor é a vida.”
Sem medicamentos e com défice de equipamentos para exame e tratamento de diferentes patologias, o Ministério da Saúde é capaz de ter brilhado apenas na época da Covid-19, quando, de forma estóica, conseguiu manter o País estável.
Juventude e Desporto
Nyusi tentou “inventar a roda”, mas a estratégia, tal como noutras áreas, não resultou. As taxas de desemprego aumentaram significativamente no País, afectando sobretudo os jovens, que são dois terços da população moçambicana. Na cidade de Maputo, por exemplo, e segundo dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística em 2023, 36% dos jovens são desempregados.
Doutro lado – Juventude e Desporto – Gilberto Mendes tentou fazer homoletes sem ovos (dinheiro), acabando muitas vezes por meter-se em barulhos e produzir momentos cómicos.
Segundo nossa fonte, o reflexo do insucesso deste sector é particularmente visível no momento actual, visto que a maioria das pessoas que ocupa as ruas e pratica actos de vandalismo e pilhagem são jovens.
Texto extraído na edição 588 do Jornal Dossiers & Factos