Um estudo assinado por Stélio Amaral Menete e Michael Godet Sambo, integrado no livro Desafios para Moçambique 2023-2024, do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), avalia o impacto dos Tratados Bilaterais de Investimento (TBIs) na atracção de Investimento Directo Estrangeiro (IDE) em Moçambique entre 1998 e 2024. A análise conclui que, embora os TBIs sejam mecanismos desenhados para incentivar o fluxo de capital estrangeiro, em Moçambique não houve uma relação directa entre a assinatura desses tratados e o aumento dos influxos de IDE.
Texto: Amad Canda
Os autores explicam que os TBIs visam garantir segurança e previsibilidade aos investidores estrangeiros, estabelecendo padrões de tratamento e mecanismos de resolução de disputas. Estes tratados incluem cláusulas como tratamento nacional, nação mais favorecida, livre transferência de divisas e compensações em caso de expropriação. Em Moçambique, a maioria dos TBIs assinados seguiu o modelo padrão internacional, com vigências que variam entre 10 e 20 anos, e alguns com cláusulas de duração residual, que estendem a protecção aos investimentos mesmo após o término do acordo.
A investigação, que se baseia em dados do Banco de Moçambique e da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Investimento (UNCTAD), revela que, apesar do número considerável de TBIs assinados – 28 entre 1990 e 2017, dos quais 20 entraram em vigor – o IDE dos países com TBIs não apresentou um aumento significativo até à descoberta de recursos naturais no início da década de 2010. Nesse período, registou-se um aumento notável do IDE, mas os dados sugerem que essa subida se deveu essencialmente ao valor comercial do carvão e do gás natural, e não aos TBIs em si.
Segundo o estudo, os influxos de IDE mostram padrões diferenciados conforme o tipo de países signatários. Entre os Países Desenvolvidos (PDs), todos os que possuem TBIs com Moçambique registaram algum nível de IDE após a vigência dos tratados, embora o volume e a continuidade dos investimentos variem. Por exemplo, os EUA e a França, que já investiam em Moçambique antes dos respectivos TBIs entrarem em vigor, mantiveram os investimentos, mas sem aumentos significativos atribuíveis ao tratado. Em contrapartida, alguns Países Menos Desenvolvidos (PMDs), como as Maurícias, começaram a investir em Moçambique após a assinatura dos TBIs, apresentando fluxos de IDE mais consistentes.
A análise do impacto dos TBIs foi feita com base nas abordagens diádica e monádica. A abordagem diádica analisa o efeito dos TBIs entre países específicos, enquanto a monádica avalia o impacto mais amplo sobre o clima de investimento no país receptor. Através da análise diádica, observou-se que os TBIs não têm gerado influxos de IDE imediatos dos países signatários, havendo, na maioria dos casos, uma desfasagem entre a assinatura dos tratados e o início do investimento. Já na análise monádica, os dados indicam que os TBIs não alteram significativamente o volume total de IDE em Moçambique, sendo que o aumento de investimentos no país está mais ligado à exploração de recursos naturais.
O estudo também descreve os TBIs como instrumentos que garantem aos investidores estrangeiros o recurso à arbitragem internacional, sobretudo pelo Centro Internacional de Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (CIADI), em caso de litígios com o Estado moçambicano. Observou-se que, de todos os casos arbitrados pelo CIADI até 2017, a maioria foi julgada a favor dos investidores, o que tem levado muitos Países Menos Desenvolvidos a reconsiderarem a assinatura de TBIs. Entre os países que rescindiram tratados estão Bolívia, Equador e Venezuela, que visam recuperar a soberania nas decisões políticas sobre investimentos.
A composição dos TBIs assinados por Moçambique mostra uma predominância de tratados com PDs, evidenciando a expectativa de atracção de capital de países tradicionalmente exportadores de capital. Entre 1990 e 2017, Moçambique assinou 28 TBIs, sendo 20 com PDs e 8 com PMDs. Contudo, o IDE de PDs e PMDs com TBIs em vigor apresentou padrões de investimento variados, não havendo garantias de que a assinatura dos tratados por si só fosse um factor determinante na decisão de investimento.
Por fim, o estudo sugere que, para o período em análise, os TBIs em Moçambique não tiveram impacto imediato na entrada de IDE, uma vez que o aumento de influxos só foi registado após a descoberta de recursos naturais de elevado valor comercial. Este estudo contribui para o debate sobre a relevância dos TBIs e o papel que estes tratados podem desempenhar na política de atracção de investimento directo estrangeiro em Moçambique.
Texto extraído na edição 141 do Jornal Dossier económico