Os sindicatos dos trabalhadores são entidades responsáveis pela defesa da massa laboral; por sua vez, estes questionam a instituição responsável pela fiscalização do cumprimento da lei de trabalho e dos passos subsequentes em caso de incumprimento. O questionamento foi feito durante a Segunda Conferência Nacional de Diálogo Social e Negociação Colectiva, que decorreu sob o lema “Diálogo Social pela Paz Laboral e Aumento da Produção e Produtividade”, na cidade de Maputo.
Texto: Milton Zunguze
O fórum foi promovido pelo Ministério do Trabalho e Segurança Social (MTSS), com o objectivo de discutir o ambiente laboral do país, a concertação social e a promoção do trabalho digno, da justiça social e da paz laboral. No painel destinado a debater a promoção do diálogo social e da negociação colectiva, o representante do Sindicato de Segurança Privada e membro da Confederação Nacional dos Sindicatos Independentes e Livres de Moçambique (CONSILMO), Boaventura Paulo, denunciou a violação “grosseira” da lei do trabalho em seu sector: “[…] não se paga o salário mínimo, há más condições de trabalho, as empresas não têm localização”. Levantando, nesta senda, o questionamento: “A minha primeira questão é, o que nós negociamos? Negociamos o que está previsto na lei ou outras condições não previstas?”
“Como já disse, sou da segurança privada e quero colocar a preocupação sindical e dos trabalhadores desse sector. Discute-se muito com o Estado sobre a violação grosseira da lei do trabalho na área da segurança privada. A negociação entre o empregador e o empregado já não tem espaço. Se o empregador não paga os salários mínimos, por que é preciso a gente negociar?”
Não vale negociar para não executar Boaventura Paulo, em outro desenvolvimento, questiona a garantia da fiscalização do cumprimento deste instrumento, reiterando que, “Não vale a pena negociar enquanto o resultado da negociação não for executado.”
“Não vale a pena negociar enquanto o resultado da negociação não for executado. Nesse contexto, surge a questão: quem fiscaliza o cumprimento das negociações feitas entre as partes e o que este fiscalizador faz diante do incumprimento na execução do acordado?”
Governo deve incentivar a criação de sindicais
A CONSILMO na província de Manica, representada por Júlio Fonseca, destacou o não pagamento de salários como uma violação grave que acontece em algumas empresas daquela parcela do país. Ele denunciou ainda a recusa por parte das empresas em permitir a instalação de comités sindicais para a defesa dos direitos dos trabalhadores, dizendo: “[…] se essa empresa não tem estrutura sindical, vai conversar o quê?”. Fonseca apelou ao Governo para que seja um parceiro forte no fortalecimento dos sindicatos.
“Outra questão é, para a implementação de estrutura sindical, as empresas negam que os trabalhadores tenham uma estrutura sindical. O que vamos fazer? Três, estamos a enfrentar isso há quase três anos. Quando chegamos lá, os advogados dizem: ‘esta empresa é de gente que está no governo”.
Apadrinhamento das empresas afecta trabalho sindical
Sualé Ali, representante da CONSILMO em Nampula, denunciou que um dos factores que contribuem para a falta de adesão ao processo sindical naquela província nortenha é a questão do “apa drinhamento” ou “lobismo” das empresas por “dirigentes do país”. Segundo a fonte, isso resulta na vulnerabilidade do trabalhador, “contribuindo para situações de pobreza absoluta”. “Em algum momento, as empresas em Moçambique são isentas do cumprimento da lei e a nossa inspecção está numa mata e não se sabe o caminho que devemos tomar”.
Ali questionou ainda: “O que fazer aos empregadores que negam a criação de comités sindicais dentro dos centros de trabalho? Qual é o perfil das empresas onde devem ser criados os comités sindicais?”.
“Todos nós podemos fiscalizar o cumprimento da lei”
Diante do questionamento apresentado pelos sindicatos, a Presidente da Comissão de Mediação e Arbitragem Laboral (COMAL), Olga Manjate, reagiu esclarecendo que questões ligadas às remunerações dos trabalhadores e sua negociação no sector privado estão abertas entre “trabalhador e empregador”, para que “possam dialogar e chegar a um entendimento que não ponha em causa as suas vidas”. “A fiscalização do MTSS tem um órgão, que é a inspecção de actividades, mas todos nós somos chamados a fiscalizar e perceber que algo não está bom, e submeter ao órgão competente para seguir com os passos subsequentes”.
Talapa quer inspectores corruptos denunciados
Por sua vez, a Ministra do Trabalho e Segurança Social, Margarida Talapa, manifestou a necessidade de fortalecimento de metodologias de denúncias, com vista a responsabilizar os infractores do instrumento em causa.
“Então, se há um inspector que vocês conhecem e que visitou uma empresa e não agiu com base na lei, por favor, denunciem. Dizer que é um inspector é vago, precisamos de dizer quem é, para podermos prosseguir e encontrar a verdade”, alertou. Segundo Talapa, apesar de serem preocupações de muitos, ainda não se chegou a um consenso, apelando a uma discussão e propostas concretas.
Vale recordar que, há 30 anos, o Governo moçambicano criou a Comissão Consultiva do Trabalho (CCT), uma plataforma de diálogo que visa assegurar consensos entre os trabalhadores e empregadores rumo à melhoria das condições de empregabilidade e estabilidade social para a massa laboral moçambicana.
Texto extraído na edição 124 do Jornal Dossier económico