Os moçambicanos estão em modo de suspense, à espera do anúncio dos resultados das sétimas eleições gerais – presidenciais, legislativas e das Assembleias Provinciais – que tiveram lugar na quarta-feira, 09 de Outubro. Este “gelo” poderá ser quebrado hoje, 24 de outubro, ou seja, quase 15 dias após a votação. É demasiado tempo de espera, consideram os observadores internacionais, que apontam para o risco de isso minar a credibilidade do processo, que, afinal, está “aquém dos parâmetros internacionais para eleições democráticas”.
Texto: Milton Zunguze
Moçambicanos em todo o País e na diáspora foram às urnas para eleger os seus dirigentes para os próximos cinco anos. Neste momento, está nas mãos dos órgãos eleitorais o processo de apuramento dos votos, que culminará com o anúncio dos resultados finais no dia 25 de Outubro. Quinze dias separam o momento da votação da divulgação dos resultados definitivos, o que leva a Missão de Observação Eleitoral Internacional (MOEI) do Instituto Internacional Republicano (IRI) a chamar a atenção para a necessidade de reduzir o tempo com vista a assegurar a credibilidade do processo.
A nível distrital e provincial, a MOEI defende a disponibilização dos resultados do apuramento parcial num modelo que facilite a verificação dos dados. Antes disso, porém, considera essencial garantir que a acreditação dos delegados de candidatura e dos observadores nacionais seja atempada, com vista a assegurar um acesso livre às mesas de voto e a prevenir intimidações, tal como preconizam os parâmetros constantes da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Para a MOEI, é igualmente essencial que o concurso público para a aquisição de materiais eleitorais seja levado a cabo através de um processo competitivo e transparente, fortalecendo a confiança do eleitor e evitando práticas corruptas.
“Povo com espírito forte, eleições aquém dos padrões”
A MOEI teceu rasgados elogios ao povo moçambicano pelo seu “forte espírito democrático”, evidenciado pelo facto de não ter abdicado de exercer o seu direito para “determinar o seu futuro”. Estas palavras foram proferidas por Succès Masra, antigo primeiro- -ministro da República do Chade, ressalvando que “democracias vibrantes requerem que os cidadãos elejam os seus líderes através de um processo competitivo, aberto, inclusivo e transparente”.
Apesar disso, a MOEI não deixou de manifestar a sua indignação com o rumo que este processo tomou, desde a campanha eleitoral até ao dia de votação, fazendo notar que, de alguma forma, esteve “aquém dos parâmetros internacionais para eleições democráticas”.
Na óptica dos observadores da MOEI, as alterações à lei havidas a menos de sete semanas do dia eleitoral causaram confusão sobre o contencioso eleitoral, juntando-se a isso “incidentes graves”, desde o enchimento de urnas ao bloqueio de acesso dos observadores.
“Os partidos da oposição tiveram de enfrentar casos de compra de voto, assédio e intimidação, afectando negativamente a sua campanha eleitoral”, disse a organização, lamentando a limitação da capacidade de supervisão nas mesas de votação. No entanto, o conjunto de irregularidades, que inclui o uso de meios públicos para fins partidários, começou na primeira fase, a do recenseamento eleitoral, com a MOEI a denunciar insegurança e intimidação de eleitores.
Para pôr cobro a estas situações, a organização que temos vindo a citar considera indispensável o fortalecimento das instituições, a começar pela Comissão Nacional de Eleições (CNE). Na perspectiva da MOEI, a CNE deve ter “independência orçamental”, através do acesso directo e atempado aos fundos aprovados pelo Orçamento do Estado, evitando o controlo orçamental por parte do Governo.
União Europeia fala em “distorção evidente das condições”
Por sua vez, a Missão de Observação Eleitoral da União Europeia (MOE-UE), que enviou 179 observadores de 24 Estados-Membros da UE, Canadá, Noruega e Suíça, afirmou que os órgãos eleitorais geriram o processo de forma ordeira.
“As pessoas votaram calmamente e os procedimentos foram maioritariamente seguidos durante a votação e, durante a campanha, as liberdades fundamentais foram geralmente respeitadas”, disse Laura Ballarín, chefe da MOE-UE.
O relatório preliminar da UE afirma que, de um modo geral, a campanha eleitoral foi conduzida pacificamente, mas os observadores e interlocutores da UE relataram uma “distorção evidente das condições” a favor do partido no poder no decurso da campanha, tendo a FRELIMO alegadamente beneficiado das vantagens inerentes ao poder através da utilização indevida de recursos estatais.
A liberdade de expressão foi, de um modo geral, respeitada durante todo o período da campanha, mas a cobertura noticiosa pela rádio e pela televisão nacionais foi tendenciosa a favor do partido no poder e de Daniel Chapo, considera a UE, que igualmente abordou o nível de confiança nos órgãos eleitorais.
“Verificou-se uma notável falta de confiança na fiabilidade dos cadernos eleitorais e na independência dos órgãos eleitorais. Para além disso, os nossos observadores referiram que a contagem dos votos foi lenta e que sofreu de desorganização e falta de clareza”.
Esta organização também detectou aquilo a que chamou “indícios de enchimento de urnas”, o impedimento da participação de importantes actores do processo, nomeadamente observadores, delegados de candidatura e, em alguns casos, os próprios jornalistas.
Em alguns casos, verificou-se também a substituição dos Membros das Mesas de Voto (MMVs) pelos membros do Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) por alegada falta de celebração de contractos. A este propósito, Dossiers & Factos sabe que um grande número de MMVs só rubricou os seus contractos depois do dia da votação, estando agora à espera dos seus subsídios