O Centro de Integridade Pública (CIP) instou, na segundafeira, o Presidente da República a demonstrar determinação no combate à corrupção, no seguimento das suspeitas que recaem sobre o ministro da Agricultura, Ambiente e Pescas, Roberto Mito Albino, relativamente a um concurso público de 130 milhões de meticais lançado pelo Instituto do Algodão e Oleaginosas de Moçambique.
Texto: Clara Mulima
O director executivo do CIP, Édson Cortez, foi peremptório: “Não é possível falarmos de independência económica quando temos nhonguistas no Governo”. Para o responsável, este caso reforça a necessidade de obrigatoriedade da declaração de bens, já que o ministro em causa tem alegadas ligações a empresas beneficiadas pelo concurso.
Cortez lembrou que o Chefe de Estado prometeu, aquando da tomada de posse, uma governação diferente. “Esta é a oportunidade de mostrar que realmente quer combater a corrupção”, afirmou. O dirigente destacou ainda que a sociedade civil desempenha um papel de “assessoria gratuita” ao governo, identificando casos que podem manchar a credibilidade presidencial.
O responsável recordou igualmente declarações recentes do ministro dos Transportes e Logística, Mateus Magala, que admitiu a existência de cartéis a controlar sectores estratégicos do Estado. “Na agricultura, parece estar em curso uma mudança de cartel. Não podemos ter independência económica com dirigentes a usarem cargos públicos para obter ganhos privados”, reforçou.
Críticas à PGR e à comissão interna
O CIP acusou a ProcuradoriaGeral da República de desperdiçar tempo em perseguições políticas à oposição, em vez de investigar casos com provas consistentes de corrupção.
Para Cortez, os dados já recolhidos deveriam ser suficientes para abrir uma investigação formal.
O dirigente considerou ainda “uma aberração” a decisão do próprio ministro da Agricultura de criar uma comissão interna para analisar o caso. “Não pode ser árbitro e jogador ao mesmo tempo. A comissão carece de credibilidade e transparência”, sublinhou, defendendo a intervenção da Inspecção-Geral das Finanças, do Ministério Público e do Tribunal Administrativo.
Ligações empresariais suspeitas
Segundo a investigadora do CIP, Milagrosa Calangue, há registo da constituição, em 2015, da empresa Dona África Investimentos, que envolvia o então ministro Roberto Mito Albino e sócios da actual empresa vencedora do concurso. “A lei da probidade pública é clara: existe conflito de interesses quando um servidor público tem relações de negócios com uma empresa que depende da sua decisão. A ligação societária permanece até hoje, mesmo que a empresa nunca tenha entrado em actividade”, explicou.
A investigadora apontou ainda várias irregularidades no concurso: a empresa vencedora tem apenas quatro meses de existência, capital social muito inferior ao exigido (1 milhão face a 130 milhões de meticais), ausência de experiência comprovada e apresentou a proposta financeira mais cara, mas ainda assim foi adjudicada.
Chamadas de atenção
Para o investigador Lázaro Mabunda, a própria avaliação documental deveria ter levado à exclusão da empresa. “Este caso mostra que a companhia foi criada especificamente para vencer o concurso”, afirmou. Já Baltazar Fael destacou que, para além das implicações jurídicas, o processo tem uma dimensão política imediata: “O governo dispõe de informação suficiente para agir. A inacção só reforçará a suspeição pública”.
O CIP concluiu apelando a uma investigação independente, transparente e com resultados divulgados publicamente, para restaurar a confiança nas instituições. “É preciso retirar a batata podre do saco antes que contamine todo o sistema”, advertiu Fael.




