O Governo moçambicano vai reforçar a disponibilidade de divisas no mercado nacional, através do aumento da taxa de conversão obrigatória das receitas de exportação de 30% para 50% e do repatriamento parcial das receitas dos grandes projectos. As medidas constam do Plano de Recuperação e Crescimento Económico (PRECE), recentemente divulgado pelo Ministério da Economia e Finanças, a que o Dossier Económico teve acesso.
Texto: Clara Mulima
A estratégia surge numa altura em que a escassez de moeda estrangeira pressiona o sector produtivo, encarece as importações e tem impacto directo na estabilidade dos preços e na inflação. O Executivo reconhece que o défice cambial se tornou um dos principais obstáculos ao crescimento económico e à recuperação pós-crise, afectando a competitividade das empresas nacionais e a capacidade do Estado de financiar importações essenciais.
Segundo o documento, o Governo pretende mobilizar cerca de 500 milhões de dólares adicionais por ano em divisas, resultado do novo regime cambial e do repatriamento de receitas. A medida visa estabilizar o mercado de câmbio, assegurar o fornecimento de bens essenciais — incluindo combustíveis, medicamentos e produtos alimentares — e criar espaço para o relançamento da actividade industrial.
No quadro do PRECE, o reforço cambial é apresentado como eixo prioritário do pilar dedicado ao quadro económico e financeiro do País. O plano prevê ainda a modernização dos mecanismos de registo e controlo de receitas locais, com integração gradual de pagamentos digitais e via banca móvel, para garantir maior rastreabilidade e eficiência na circulação de moeda.
Paralelamente, o Governo pretende reduzir a taxa de juro de referência, a Prime Rate, de 17,20% para 12,20%, com o objectivo de aliviar o custo de financiamento e dinamizar as micro, pequenas e médias empresas (MPMEs). Esta redução, associada à maior disponibilidade de divisas, deverá facilitar a importação de matériasprimas e bens intermédios, estimulando a produção nacional.
O Ministério da Economia e Finanças destaca que a escassez de divisas tem raízes estruturais, agravadas por factores externos como a redução das exportações tradicionais, o abrandamento do investimento directo estrangeiro e a elevada dependência de produtos importados. Por isso, a nova estratégia procura equilibrar o controlo cambial com incentivos à produção interna e à diversificação das exportações.
Entre as medidas complementares, o PRECE introduz auditorias de preços de transferência e alarga o uso da ferramenta e-Valuetor da Janela Única Electrónica, destinada à verificação de preços de exportação com base em referências internacionais. O objectivo é reduzir perdas fiscais e garantir que as receitas cambiais geradas pelas exportações regressem efectivamente ao País.
O documento refere ainda que as reformas estruturais serão acompanhadas pela criação de linhas de crédito bonificado, avaliadas em 85 milhões de dólares, com financiamento do Governo e do Banco Mundial, no âmbito do Fundo de Garantia Mutuária. Estes fundos destinam-se a apoiar empresas afectadas pela crise cambial e pela quebra da procura interna.
O Executivo espera que, com a implementação das medidas previstas, o País possa arrecadar até 1,45 mil milhões de dólares adicionais em receitas fiscais durante a vigência do plano, reforçando assim a sustentabilidade orçamental e a estabilidade macroeconómica.
O PRECE enquadra-se numa estratégia mais ampla de recuperação e crescimento, que visa enfrentar os efeitos dos choques externos e internos que marcaram a última década, desde a pandemia da COVID-19 até às crises de segurança e às variações dos preços internacionais.




