Durante uma palestra realizada na Universidade Eduardo Mondlane (UEM), em Maputo, o antigo Presidente da República, Armando Guebuza, abordou um dos temas mais debatidos no País: a distribuição equitativa das riquezas naturais. O evento, que decorreu no âmbito das celebrações do 25 de Setembro, Dia das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), reuniu académicos, estudantes e o antigo chefe de Estado para discutir os progressos e desafios do Moçambique contemporâneo.
Texto: Milton Zunguze
Questionado sobre a equidade na distribuição das riquezas geradas pelos recursos naturais, Guebuza foi directo ao afirmar que a questão “apanha os distraídos”. O antigo Presidente argumentou que Moçambique está ainda a iniciar a exploração de grande parte dos seus recursos, como o gás natural, e que é irrealista esperar uma distribuição imediata e justa das riquezas. “Qual é o País que vocês conhecem e tem uma distribuição de riqueza correcta?”, questionou Guebuza, sublinhando que este é um processo demorado e complexo. Segundo Guebuza, o tempo necessário para transformar as riquezas naturais em benefícios palpáveis para todos os moçambicanos é considerável. O ex-chefe de Estado referiu-se especialmente ao gás natural, que está a ser explorado há relativamente pouco tempo. “O gás ainda nem aparece, está lá fundo, mas já se julga Moçambique. Já se julgam os regimes na base disso”, acrescentou, em tom de alerta.
“Querem meter confusão entre nós”
Na visão de Guebuza, a pressão para uma distribuição rápida das riquezas é uma forma de criar divisões entre os moçambicanos. O antigo estadista sugeriu que a questão é usada por forças externas e internas para desestabilizar o País, apontando a situação de Cabo Delgado, a braços com o terrorismo, como exemplo de convulsão social que tem sido incentivada por disputas sobre os recursos naturais.
Para ele, a exploração do gás natural é um processo que exige tempo e paciência, e a expectativa de que as riquezas sejam distribuídas já, quando ainda nem se começaram a materializar, é um erro. “Querem que nós distribuamos correctamente as riquezas e nós não temos”, lamentou. Para Guebuza, a pressão para distribuir rapidamente as riquezas é contraproducente, especialmente num País que “acaba de ser independente” e que está a iniciar a exploração dos seus recursos naturais. Ele criticou a visão de que Moçambique deveria já estar a distribuir as riquezas, mesmo antes de estas estarem devidamente materializadas, destacando que o processo de exploração e transformação de recursos como o gás é moroso e exige décadas de trabalho.
Guebuza apelou à necessidade de o País focar-se nos seus próprios interesses e nos seus desafios internos, em vez de ceder às pressões externas que procuram ditar o ritmo de exploração e distribuição das riquezas. Segundo o ex-Presidente, a prioridade deve ser a protecção dos interesses nacionais e a gestão responsável dos recursos para garantir que, no futuro, todos os moçambicanos possam beneficiar dos ganhos económicos.
Crescente impacto dos recursos
Embora o País tenha iniciado relativamente há poucas décadas a exploração dos seus recursos, a verdade é que o impacto na economia nacional é crescente. No primeiro trimestre de 2024, por exemplo, as receitas de exportação registaram um aumento significativo. Só o gás natural gerou USD 102,1 milhões adicionais em exportações, enquanto a energia eléctrica e o carvão aumentaram as receitas em USD 17,6 milhões e USD 1,4 milhões, respectivamente, em comparação com o período homólogo de 2023.
Desde o início das exportações de Gás Natural Liquefeito (GNL) da bacia do Rovuma, em Novembro de 2022, através da plataforma flutuante FNLG, Moçambique tem-se afirmado como um fornecedor alternativo importante de gás natural para o mercado global. Até ao momento, foram realizados 71 carregamentos de GNL, correspondentes a 5,7 milhões de toneladas, uma cifra que demonstra a crescente relevância do País no sector energético internacional.
As perspectivas para o futuro são promissoras. As projecções indicam que as exportações de gás natural poderão atingir 5,8 mil milhões de meticais ao longo do ciclo de vida dos projectos em curso. As receitas anuais para o Estado moçambicano poderão alcançar um pico de 379,5 mil milhões de meticais na década de 2040, um valor que reflecte a importância estratégica do gás natural para o desenvolvimento económico do País.
Moçambique possui reservas comprovadas de gás avaliadas em 180 mil milhões de metros cúbicos, dos quais 172 mil milhões estão na bacia do Rovuma. Desses, 134 mil milhões de metros cúbicos são considerados recursos recuperáveis, o que reforça a posição do País como um dos actores mais promissores no sector energético global.
Refira-se que, para além do gás, Moçambique também exporta carvão, energia eléctrica, rubis e outros minerais, cujas receitas têm vindo a impactar positivamente a economia nacional, sendo certo que impacto na melhoria das condições de vida das populações é, ainda, mínimo