Estamos em constantes mudanças. Talvez pela globalização, ou pela rotina da vida. Mas uma coisa é certa, estamos aos poucos a entrar na época da nudez, onde olhar para um corpo pelado e transparente não será novidade, nem estranho.
Um dia, caminhava recentemente pelas artérias da Cidade de Lourenço Marques, naquelas caminhadas cosmopolitas, singradas pela razão da existência humana, quando o meu olhar foi roubado por um instante por uma paisagem que me fazia lembrar exactamente da época de Adão e Eva, naquele jardim sarcástico e pecador.
De umas colantes praticamente invisíveis e uma blusa que quase não escondia as duas laranjas internas, caminhava arfante uma “exibicionista” em minha frente, como quem diz “mesmo se tentares esquivar o teu olhar, não vais deixar de olhar para mim porque além de estar em promoção, quero mostrar-lhe como está a minha fisionomia”. Claro que eu sou forte. Não olhei. Hum…falando a verdade, olhei, mas não com uma intenção. Só queria mesmo confirmar se ela estava daquele jeito, não mais do que isso.
Isso não vem ao acaso agora. O que interessa mesmo é que ela, num passo de camaleão doentio e com pernas quebradas, fazia estilos metamórficos que eu até me perguntava qual era o real estilo dela. Não aguentei, lancei um sorriso. E acho que ela percebeu e, de imediato, parou um segundo. Para o meu espanto, vejo ela com uma nova forma de andar. Naquele instante, vi que ela estava a tentar-me. Mas, do meu lado, quis mostrá-la que sou mais forte. Estou a mentir. Estava a gostar de vê-la. Na verdade, queria assistir-lhe e nada mais.
Pelas suas posições e olhares, acho que ela me confundiu com alguém. Se não me tiver confundido, provavelmente não aguentou com o meu estilo rafeiro de um peregrino desinteressado pelas exibições. Faltavam dois passos para nos cruzarmos. De repente, passa um senhor pela minha frente e assobia para a miúda. Num tom de quem diz que “se não fosse pela idade, hoje mesmo te levaria comigo”. Mas, depois passou, e lá restei eu e a exibicionista que, aos poucos, tentava roubar a atenção dos que caminhavam naquela direcção.
Já perto, engoli o ar, decidi calar e mostrar que não podia ceder a tais brincadeiras (atrapalhadoras), que já estão a consumir aos poucos o bem-estar social. Passando aos poucos ao lado dela imaginei-me com uma venda nos olhos, feito a um ninja, só para não olhar a tanta exposição circulante que se esquecia da privacidade de seu corpo. Pode ter sido duro, mas passei sem falar nada. Talvez esperasse que eu lhe cumprimentasse. Mas, ironicamente, calei e segui o meu caminho, pensando que nada mais como aquilo poderia me aparecer pela frente. Até quando decidi subir num desses chapas que neste tempo de calor nos fazem ver histórias.
Ao meu lado estava a rapariga, coberta de roupas que aparentavam ser restos da fábrica. Enquanto eu sentava, ouvi logo que os senhores que estavam nos bancos de trás não queriam mais nada, senão educar aquela moça que, na verdade, sentia-se uma Miley Cyrus ou ainda uma Britney Spears, quando sobem nos palcos ou vão em sítios onde tentam mostrar que o seu corpo é melhor que o do outro.
Os “cotas” não calaram. Concentraram a miúda, tanto que ela decidiu defender-se, tirando palavras inesperadas: “Se não estão aguentar com o meu estilo, fala logo. Minha corpo é lindaço e não posso esconder. Deixem eu frescar a vontade víu”. Foram palavras dela, sem nenhuma mudança. O primeiro crime que notei foi a problemática na construção frásica. Em segundo, o nível de intelectualidade que reside nas mentes do mundo de cada cidadão.
Digo isto porque a formação da pessoa como um ser social e vivente não se pode cingir simplesmente àquilo que nós achamos que é o certo para nós, mas devemos também perguntar até que ponto isso pode afectar a sociedade. Daí, desse tipo de comportamentos, surge a problemática das alienações sociais. Não estou aqui a tentar definir a vestimenta da mulher. É obvio que não, mas não quero deixar cá de exclamar que a sociedade me prova a sua transformação. Não me ponho a dizer se é para o melhor ou para o pior.
Autor: Sergio dos Céus Nelson