O relógio da democracia determina que Moçambique deve realizar, no dia 09 de Outubro do presente ano, as eleições gerais, um pacote que engloba a escolha do Presidente da República, dos deputados da Assembleia da República e dos membros das Assembleias Provinciais. Isso é razão suficiente para que os principais actores do processo, nomeadamente organizadores e concorrentes se desdobrem na definição de estratégias para que corra tudo a contento.
Neste capítulo, todos parecem partir atrasados para o jogo. O árbitro – Comissão Nacional de Eleições (CNE) – ainda está a braços com défice de financiamento, enquanto as equipas – partidos políticos – ainda não têm definidos os jogadores com os quais vão atacar a partida. Fica a sensação de que ninguém mais leva à sério o ditado segundo o qual “a vitória prepara-se, a vitória organiza-se”, nem mesmo o seu autor, a Frelimo.
O relaxamento generalizado é mais do que evidente e, se no caso da Frelimo ainda se pode considerar compreensível, dado o facto de ter a “máquina” toda sob seu controlo, difícil é entender a apatia da Renamo. Mas até era bom, na perspectiva da Nação, que fosse esse o maior dos problemas da “perdiz”.
Ao invés de trabalhar de forma unida e coesa para vencer as eleições, como fazem quaisquer partidos decentes, a Renamo está mergulhada numa espécie de guerra civil que tem nos tribunais, redes sociais e imprensa os seus principais palcos. A rixa entre Venâncio Mondlane e Ossufo Momade está a impedir o partido de dar continuidade ao elã a que se assistiu nas sextas Eleições Autárquicas, em Outubro do ano passado.
Numa altura em que o processo de divórcio entre a população e a Frelimo parecia correr de forma acelerada, devido ao fracasso desta formação política na condução dos destinos da pátria, a Renamo é vista não propriamente como uma alternativa credível (não nos enganemos), mas como um mal menor.
O povo, e isso ficou demonstrado no ano passado, está claramente disposto a assumir os riscos e dar mais oportunidades à perdiz, mas esta, por sua vez, não se farta de emitir sinais de absoluta falta de interesse. Neste momento, a ideia que se vai cristalizando nas mentes do eleitorado, especialmente da juventude, é de que a Renamo é um partido desorganizado – e é, de facto, porque um partido organizado não abdica de realizar congresso sem fundamento nem tem seus membros envolvidos em actos de pugilato político em hasta pública.
Porque cremos que ninguém é ingénuo naquela casa, restam-nos, então, duas hipóteses: ou a Renamo está satisfeita com a sua condição de oposição ou alguém anda a ser pago para sabotar sistematicamente a organização, por forma a garantir que se mantém estagnada, mesmo quando há claro potencial para voos mais altos.
Mais preocupante ainda é que essa forma de estar não é de todo nova, pelo que não nos parece válida a ideia de que tal é resultado do desnorte após a morte de Afonso Dhlakama. Poderão ter piorado, mas os sinais de conformismo sempre estiveram lá.
Lembramo-nos todos do boicote às eleições autárquicas de 2011 (intercalares) e 2013. Ao tomar tal decisão, a Renamo, na altura do carismático Dhlakama, estendeu tapete vermelho para o partido dos vermelhos, num gesto que, se não é inédito, é raríssimo na história da democracia em todo o mundo.
Governar é difícil, porque é a quem governa que cabe a responsabilidade de pensar em soluções para os vários problemas e definir os melhores caminhos para o desenvolvimento. É sobre quem dirige que recai a pressão de apresentar resultados, sendo que, às vezes, a crítica sequer considera os condicionalismos, como os factores conjunturais, por exemplo.
Em contrapartida, estar na oposição é bem mais confortável. E num país como o nosso, onde a esmagadora maioria sequer tem a verdadeira noção do papel dos partidos da oposição, meros jogos retóricos com tendência a vilipendiar o Governo são suficientes para arrancar aplausos da plateia, enquanto se enche os bolsos. Neste quadro, os milhões oferecidos de bandeja ao líder do maior partido da oposição são, talvez, o maior investimento alguma vez realizado pela Frelimo no âmbito do seu projecto de manutenção do poder.
- Editorial extraído da edição 551 do Dossiers & Factos