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Fundador da Wagner diz que luta contra o terrorismo é o principal objectivo da empresa em África

O fundador da empresa militar privada russa Wagner, Yevgeny Prigozhin, defendeu as actividades da sua empresa em África, dizendo que o seu envolvimento no continente é principalmente para derrotar o terrorismo e ajudar os países a libertar os seus territórios dos insurgentes.

A defenceWeb teve direito a uma entrevista exclusiva com Prigozhin em Moscovo, onde ele falou sobre uma série de tópicos. Prigozhin sublinhou que a Wagner não é financiada pelo governo russo e que todos os fundos para as suas operações provêm apenas dos negócios de Prigozhin. Acrescentou ainda que a Wagner só trabalha para governos legítimos e não está envolvida em quaisquer planos de golpe de Estado, nem na ajuda a terroristas que se instalem em qualquer país. O único conflito em que Wagner se envolveu que não estava do lado de um governo em funções foi no Donbass, no leste da Ucrânia, onde Wagner ajudou as milícias em Donetsk e Luhansk entre 2014 e 2015. Wagner também está actualmente a liderar as tentativas de captura da cidade de Bakhmut, no leste da Ucrânia. De acordo com Prigozhin, Wagner está “sempre do lado certo da justiça” quando decide que contratos aceitar e quais recusar.

Para explicar o papel da Wagner em África, Prigozhin disse que, inicialmente, o continente não era alvo de atenção, mas que a África entrou no radar quando Wagner estava a combater na Síria (a Rússia começou a apoiar Bashar al Assad em 2015) e a demonstrar “extrema eficiência” na destruição do ISIS. Com 1 500 a 3 000 homens, Wagner levou a cabo tarefas que ultrapassavam as forças dos 200 000 soldados do exército sírio e de milhares de tropas aliadas. Depois de Wagner ter dado nas vistas, Prigozhin começou a receber pedidos de ajuda de chefes de vários países para combater o terrorismo.

Entre eles, o Presidente Faustin-Archange Touadera, da República Centro-Africana (RCA), o Presidente Omar al-Bashir, do Sudão, o Presidente Filipe Nyusi, de Moçambique, e muitos outros. Prigozhin explicou que, como estes países não dispunham de recursos financeiros para montar campanhas eficazes de contra insurgência, ofereceram-se para pagar em minerais. No entanto, Prigozhin disse que, em muitos casos, esses recursos eram exagerados – por exemplo, os diamantes da República Centro-Africana não são muito lucrativos devido aos elevados custos dos factores de produção, mas “se prometeres, não te comprometas; e se deres a tua palavra, deves cumpri-la!” Ele explicou que entre 2016 e 2019, por exemplo, os lucros de algumas operações comerciais na República Centro-Africana foram absolutamente nulos.

A actividade da Wagner na RCA aumentou em Dezembro de 2020, quando os rebeldes atacaram e capturaram a quarta maior cidade da RCA, Bambari. Touadera pediu à Rússia e ao Ruanda que ajudassem a proteger o país, uma vez que os rebeldes estavam a tentar marchar em direcção à capital Bangui e, se não fossem impedidos, teriam chacinado mil homens, cortando-lhes literalmente a cabeça e arrancando-lhes os corações a bater, “para se banquetearem”. Em vez disso, explica Prigozhin, 200 instrutores Wagner conseguiram travar o ataque em Berengo, perto da capital. Depois de Touadera ter pedido ajuda, Wagner enviou um avião para Bangui de duas em duas horas com homens armados que aterravam e iam directamente para a selva. Todos estes custos foram suportados por Prigozhin, que não foi ajudado por ninguém e financiou ele próprio toda a operação.

Prigozhin acredita que, se não tivesse ajudado Touadera, teria sido preso com algumas centenas de apoiantes e morrido com eles. “Não podia ficar inactivo quando me pediam ajuda. Ele (Touadera) é apenas um bom homem que não fugiu para um estado vizinho, mas estava preparado para morrer, em vez de deixar os bandidos entrarem na capital”, disse Prigozhin à defenceWeb através de um tradutor.

Contou que, quando os primeiros aviões da Wagner aterraram e os rebeldes foram detidos a poucos quilómetros de Bangui, Touadera – “ao contrário de muitos palhaços que não fazem mais do que vestir roupas de leopardo” – vestiu o colete à prova de bala e foi directamente para a selva mostrar aos soldados do governo que não é um cobarde. “É isso que eu acho que todos os presidentes de todos os países em guerra devem fazer – devem vestir um colete à prova de bala e entrar em acção – porque é melhor morrer como um herói do que viver como um cobarde! Acabei em África porque não podia, em tempos de conflito, abandonar as pessoas que tinha prometido ajudar”, disse Prigozhin.

Embora Wagner não precise de estar envolvido em África, “estou certamente envolvido no continente”, declarou Prigozhin. “Estamos em África para proteger aqueles que nos pedem ajuda. Para proteger os civis africanos, para proteger os seus interesses nacionais de terroristas e bandidos, alguns dos quais nem sequer são de origem africana. Isto é feito exclusivamente com os fundos que ganho como empresário”.

Wagner tem sido acusado de causar a morte de civis, com a Human Rights Watch (HRW) a afirmar que os mercenários russos cometeram graves abusos, tanto na RCA como no Mali, incluindo tortura e assassinatos, mas, segundo Prigozhin, as histórias sobre o genocídio de civis são “cem por cento falsas”. Isto está a ser feito pelos franceses e pelos americanos, que não estão a conseguir destruir os militantes e os terroristas a nível mundial, porque são preguiçosos e, francamente, inúteis. Estão habituados a ficar sentados nas suas bases, apenas a protegerem-se, enquanto nós andamos a patrulhar a selva a destruir terroristas. As autoridades locais levaram a cabo investigações que desmentiram os boatos que foram feitos sobre alegada violência contra civis”. Prigozhin foi categórico ao afirmar que nunca uma única pessoa desarmada foi morta por Wagner em toda a história da empresa.

Não é um braço do Kremlin

Tem-se dito frequentemente que a Wagner é uma unidade de facto do Ministério da Defesa russo (MoD) ou da agência de informação militar russa, a GRU. Prigozhin refutou estas alegações, afirmando que não tem nada a ver com o GRU, o Ministério da Defesa russo, nem com o Kremlin. “Além disso, digo-vos que as histórias sobre o meu conhecimento do Presidente Putin são muito, muito exageradas. É certo que comuniquei com ele, mas os rumores sobre o nosso conhecimento não passam disso mesmo – rumores”.

Prigozhin afirmou que só se encontrou com Putin quando este era Presidente, embora o mais provável seja que tenha visitado os restaurantes de Prigozhin em São Petersburgo quando Putin era Vice-Presidente da Câmara e, nessa altura, “não tinha qualquer interesse em falar com ele”. Prigozhin não faz parte do círculo íntimo de Putin, disse, e “não tenho a oportunidade de o visitar sempre que quero, ou de lhe telefonar”.

No que diz respeito ao Ministério da Defesa russo, Prigozhin disse que Wagner tem, de facto, uma relação tempestuosa com este departamento governamental, uma vez que “sempre os critiquei e continuarei a criticá-los. Sou a favor de que o exército russo seja super eficiente. É certo que há alturas em que é preciso pôr alguém a trabalhar ou recorrer à ajuda de outrem, mas são casos extremamente raros. Posso dizer com toda a certeza que quando estava a treinar o exército no Sudão, a combater em Moçambique ou na África Central, não informei ninguém”.

“Não é segredo que um grande número de países recorre a nós, pois a nossa elevada eficiência é visível para todos. De facto, a Wagner não se dedica à protecção, mas sim à libertação dos Estados, à luta contra os terroristas e os invasores. É por isso que há tantos pedidos, incluindo de países líderes. Wagner é, no entanto, uma arma eficaz e potente.

“É claro que temos de ter em conta os interesses da Rússia na nossa cooperação com outros países. Afinal de contas, somos patriotas do nosso país. Infelizmente, dentro da própria Rússia, muitos decisores não querem saber do patriotismo e da protecção da nossa nação.

Texto de João de Barros e Sousa, Docente-investigador e analista de politica internacional

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