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Quais são os motivadores do empreendedorismo em Moçambique?

Texto: Kátia Patricília Agostinho, economista*

É em tempos de crise que o empreendedorismo encontra a sua melhor fornalha. É nesses momentos que a procura acirrada por soluções é desencadeada e, normalmente, culmina em processo de criação de um negócio autónomo capaz de agregar valor e gerar algum rendimento.

Não existe definição acordada e única para o empreendedorismo, existem sim diferentes teorias para o definir e classificar. Por exemplo, Jean-Baptiste Say (1816) definiu o empreendedor como sendo aquele que combina recursos económicos (terra, trabalho, capital) de modo a gerar valor. Por outro lado, Bosma et al. (2012) definem-no como qualquer tentativa de criação de um novo negócio ou de uma nova iniciativa, tal como um emprego próprio, uma nova organização empresarial ou a expansão de um negócio existente, por um indivíduo, equipa de indivíduos, ou empresas já estabelecidas.

Em Moçambique, a maioria das micro e pequenas empresas são de negócios individuais ou familiares, muitas delas a operarem na informalidade. Com a pandemia da Covid-19, verificou-se um crescimento na utilização das plataformas digitais e surgimento de muitos negócios virtuais, online. Esta tendência dá-nos a ideia de que há cada vez mais pessoas que estão a criar novas ideias de negócio ou a trazer produtos e serviços novos e inovadores ao mercado. Este movimento foi uma resposta às limitações causadas pela Covid-19.

Este movimento tem-se intensificado nos últimos anos também para responder à lenta, mas crescente, taxa de desemprego. Para contrariar o desemprego, muitos cidadãos, principalmente jovens, recorrem ao empreendedorismo para gerar algum rendimento. Quando um negócio aparece e começa a ter mercado, o que se segue são várias pessoas a investirem nesse mesmo negócio, com ênfase para comércio e prestação de serviços diversos. A questão das áreas mais atacadas é importante, pois revela alguma fraqueza do empresariado nacional em investir em sectores mais complexos ou que requerem maior investimento. Portanto, temos um empreendedorismo oportunista, motivado pela procura da sobrevivência, não fomentado pelo anseio de trazer soluções aos problemas, mas sim pela necessidade de criar uma fonte de renda.

Sobre a motivação para empreender, a literatura também traz reflexões. Em resumo, teorias sugerem que podemos agrupar os factores que influenciam o comportamento empreendedor em três grupos: (1) factores individuais, que dizem respeito à personalidade e à experiência de vida, influenciando directamente na capacidade de inovação e tolerância ao risco do empreendedor; (2) factores interpessoais, que se associam à componente familiar – por exemplo, o empreendedor que herda um negócio familiar ou influência de pessoas próximas, como amigos, professores ou mentores que acabam criando essa cultura; e (3) factores institucionais, económicos e sociais, normalmente relacionados com o ambiente do país e como este favorece ou não a propagação do empreendedorismo, como, por exemplo, políticas governamentais de promoção do empreendedorismo ou linhas de apoio financeiro e capacitação técnica.

Portanto, além dos casos oportunistas e de sobrevivência, descritos acima, temos em Moçambique muitos casos de negócios familiares que têm prosperado sob a gestão de gerações de empreendedores dentro da família, embora possa haver uma e outra inovação, como novas linhas de produto ou novos processos. Por outro lado, temos a influência de diversos programas de desenvolvimento e apoio às iniciativas empreendedoras, tanto do Governo como de parceiros de cooperação e desenvolvimento, estes últimos tendo influenciado no surgimento de negócios inovadores e disjuntores, principalmente nos sectores da tecnologia, permitindo que muitos penetrem o mercado internacional e que também sejam reconhecidos a esse nível.

Em 2019, o índice global de empreendedorismo (IGE), que avalia como os países alocam recursos para promover o empreendedorismo, colocava Moçambique em 12,8, depois de ter estado em 24,3, em 2015. Estes dados remetem-nos a pensar em alguns factores que ainda constituem entrave para o desenvolvimento do empreendedorismo e do sector empresarial. Temos que reflectir e encarar com profundidade a questão da informalidade, como e por quê a maioria prefere operar na informalidade. Haverá uma forma de simplificar a legalização destes negócios e de mantê-los com incentivos apropriados, uma vez que isto também traz benefícios ao próprio Governo em termos de contribuição à economia? Verdade é que, ao que se nota, são procedimentos e medidas repulsivas que causam um efeito contrário àquele que se pretende com o empreendedorismo.

*Kátia Patricília Agostinho assina a coluna “Economicamente Falando”, do semanário Dossier Económico

 

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